quarta-feira, março 19, 2014

Espera agitada (miniconto)


Espera agitada (miniconto)
por Rafael Belo

Ela andava de um lado para o outro.  Às vezes um brilho intenso iluminava seus olhos e de repente se apagava. Sentia-se em um corredor estreito repleto de lembranças, mas ao mesmo tempo era branco. Um branco impecável. Tão branco de doer os olhos. Então, Elena parava. Para ela, tudo escurecia. Era como fios desencapados soltos se tocando até tudo ser fogo e consumição.  Nada fazia sentido. Quando alguém a lembrava disto, Elena gritava de dor. Seu corredor era de dor. Mas sofria por algo distante... Algo não feito. Até, por fim, se perder e sorrir sem perceber.

Sem saber por onde caminhava... Seu corredor tinha fim se olhasse bem, mas se vacilasse o olhar ficava interminável. Tinham momentos de confusão. Suas lembranças se misturavam e o corredor oscilava, vivo. De estreito e solitário se transformava em largo e em uma multidão. Em instantes eram conhecidos no segundo seguinte desconhecidos apavorantes. Quando isso acontecia, Elena revelava uma mania. Ela tinha a mania de passar ambas as mãos pela cabeça. Adorava ouvir tão perto aquele som de roçar no mato fechado. Não entedia o motivo, mas tinha algo a ver com carinho e segurança.

Seu corredor na verdade eram corredores doloridos, escondendo sofrimentos. No fundo sem fim de algum deles, estava o conhecimento mais dolorido. Elena estava doente e sabia. Mas escondia tão bem, mas tão bem, mas tão bem... Sua força de vontade falsificava sorrisos e força. Ela estava fraca e tentava se distrair de todos os sinais do corpo, de todas as manobras da mente. Tanto esforço para não lembrar, a fazia esquecer de tantas coisas... Criava colapsos na mente, porém, ainda assim sentia. Havia um peso desproporcional, uma energia vital sugada...


Enferma. Sufocava com seus esconderijos, seus artifícios para não contar. Quando decidiu respirar, começou a falar sem parar. Mas tudo era sua imaginação. Não passava de auto-conto-de-fadas, da mesma forma os gestos da sequência. Gestos expansivos e veementes, cheios de vírgulas, reticências e outras pontuações. Ela estava morrendo. Um pouco a cada dia. Morria nos últimos cento e 15 anos. Vivia da mesma forma. Todos eram assim e ainda são. Mas, poucos serão centenários. Se levarmos em conta como cuidam da saúde ou como a exageram. Aliás, Elena está na espera. Espera o próximo centenário tomar o seu lugar.

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