sexta-feira, setembro 30, 2016

O desconhecido espera no final (miniconto)



Rafael Belo

Sombra invadida pela luz, sombra, luz sombra luz a dança daqueles que se complementam, mas são inteiros sozinhos. O espaço vazio é preenchido. Um começa onde o outro termina. É o ritmo do respeito é física pura. Dois corpos não ocupam o mesmo espaço. Podem ser continuação, reflexo, espelho, faíscas, química incendiando o compasso sem permitir ausências. Não há lugar desocupado. O corpo só oferece o que tem. É a mente “quem” derruba os limites. É o coração “quem” alimenta os sonhos. É a alma a dançarina de Polka Merengue. Com fôlego de sobra ela corre alucinante e o desconhecido corre mais. Ela não faz ideia do que é capaz.

Se tivesse uma música eu seria mais rápida. Mas será mesmo? Tenho medo de voltar a dançar... O som dos meus passos treme por baixo da minha pele formando este arrepio, esta vontade, esta parte da intensidade que sou... É minha identidade... É quem sou quando dançante sopro de vida. Ah, dançar tem um gosto peculiar. Um sabor de alma, uma infinidade de coração e toda a extensão da pele passando por outra pele, um arrepio trocando energia... Um suspiro profundo me deixando toda na pele e além. Mas o frio na barriga e estes calafrios...

São âncoras... Uma em cada pé. Vejo Luz no meu caminho e mesmo assim me escondo nas sombras. Aqui é tão frio. A sensação é exatamente esta: correr no meio da noite. ME sinto pequena... Eu confundo se sou o inseto que poliniza ou a flor precisando ser polinizada. Talvez seja ambos...! Eu precisava me libertar. Havia tanta raiva me deixando toda tensa, toda dura, só a dança me deixa segura. Eu vou alcançar este desconhecido vulgar, atrevido... Por que ele me chamou para dançar? Se a respiração fica mais lenta, o coração acelerado e os passos ecoam por todos os lados... Existe o... Não!

Sim...! Ele me tirou para dançar. Não posso parar. Tenho que alcançá-lo. Vou acelerar o compasso. Tantos ritmos estou dançando agora com as mesmas batidas, sopros e instrumentos. Está tudo aqui dentro... Vou tocar no ombro dele... Como ele é rápido. Sempre um passo à frente. Este desconhecido está dançando comigo pelas ruas escuras desta cidade. Nunca dancei assim antes... Agora conheço as coreografias e posso enxergar a sombra e a luz nos passos... Espera! Será que conheço alguma coisa mesmo? Cadê os cinza, o chumbo, o sereno... Coloriu tudo de repente. É primavera? Onde estive nas outras estações? Clareou... Ele parou? Nossa!! quase o atropelei...!!! Ei!Ei! EIII! EI!! EI EI EI Ei ei! Eu... Eu... Eu conheço este rosto...!