quarta-feira, dezembro 14, 2016

Os atraídos (miniconto)




por Rafael Belo

Zumbem os insetos e emitem todas as onomatopeias próprias deles. Até pararem para escutar, mas não se aproximam enquanto as pessoas se aglomeram. Há um respeitoso silêncio entre elas envolvidas pela música tocada. A flauta de Hamelin está pendurada no meio do ambiente, ninguém ousa tocar, ninguém ousa falar, ninguém ousa cantar, mas todos querem. Ratos e crianças desaparecem neste instante e o prometido não é pago. Os instrumentos do lugar também hipnotizam com os músicos elevando as almas para os dedos, os pés e vozes.

Há amplificadores por toda parte e a cidade não emite nada. Cessou o vento, nada mecânico funciona nem elétrico ou tecnológico, exceto no bar para onde estão todos indo silenciosamente. Quem tocava era a última banda já ouvida neste país com violão, guitarra, baixo, bateria, percussão, sax, trompete, flauta, tuba, violino, violoncelo, piano, contrabaixo, viola, sanfona, triangulo e zabumba. Todos também eram voz, mas a verdade é que 1% das pessoas estava chegando, o restante não conseguia sair de casa. Zumbiam e emitam todas as onomatopeias próprias delas.

Zombem se quiserem... Vocês já perceberam a ausência de alguém? Aquele alguém na contramão do cotidiano? Já sim! Pode confirmar! Elas são como lâmpadas sem apagar jamais. Luzes no caminho iluminando os passos. Sóis nos despertando, nos amanhecendo novos e exultantes. Atraem a todos e os fazem crescer emocionalmente, espiritualmente, mas só crescem mesmo com seus iguais. Sem saberem simular era O instrumento no momento. A Banda atraia no momento artistas que são a famosa Alma dos lugares, das famílias, dos amigos e da cidade.

Os atraídos tinham lido A Revolta de Atlas (Who is John Galt?) e sentiam que algo assim aconteceria. O tal do “algo me dizia...”, mas nenhum deles era filósofo nem gostava de ser rotulado como homem de razão. Eles preferiam serem tachados de loucos e taxados por isso, enquanto os verdadeiros donos da loucura permaneciam achando serem donos de algo. Está quase amanhecendo e os atraídos seguiram A Banda até o estádio encantados pela música que queriam cantar, mas não cantavam. Não se sabe ao certo quantos são, mas está tudo realmente vazio agora. Ao amanhecer só havia desaparecimento e coletivos de silêncios.

Nenhum comentário: