sexta-feira, janeiro 20, 2017

E então... (miniconto)




por Rafael Belo

Não era a primeira vez que Biane via aquele beija-flor. Só podia ser ele... Mesmas cores, mesmo jeito... E ela já o tinha observado tanto... Não tinha como se enganar... Sempre que ela estava se sentindo mal, ela o sentia. Primeiro era um sopro, uma brisa além de suave roçando na pele dela, depois ela sentia um enorme bem-estar e sabia estar sendo observada. De repente ele aparecia. Ela o chamava de esperança porque era assim o sentimento quando ele surgia e tudo parecia fantástico e tudo seria feliz, mas... Hoje foi diferente. Houve tempestade, tudo alagou, a energia foi interrompida, não havia conexão com nada, então, ela o viu. Estava debaixo do toldo e rodeado de galhos estranhamente o destacando tristonho no meio.

Não! Não! Vai embora! Por que estou pensando isso? Esperança parece um borrão... Não consigo focar minha visão nela... Tem algo muito errado! Ela não vai voltar mais. É uma despedida! Mas, por quê? Ela... ela... Nem voou ao meu redor! Ela treme! Esperança treme por isso não consigo vê-la direito. Está seca, não está? O milagre vai embora... Nunca me esqueço das vezes que chegava à casa ou saia e lá vinha ela me ver... ME VER! Que Alegria! Ainda mais quando deixei de ser adolescente, cheguei aos 40 e lá vinha ela...

Claro, você vai dizer ser impossível. Só porque a expectativa de vida de um beija-flor é de 12 anos? Pois é, deveria passar a chamá-la de Milagre, mas não podemos falar dos milagres... Eles parecem parar de existir no momento exato de verbalizar o ato... Bem, agora passei dos 99 há alguns anos e a Esperança me incentivava com a mínima presença dela. Pairando no ar, voando para frente e para trás, desafiando a vida, a normalidade, as regras e me dizendo ser possível eu também voar na contramão...


Parece ser um adeus guardado, amargurado, agoniado, trancafiado para não acontecer... Queria ver uma última vez estas assas batendo em até 80 vezes por segundo, o coraçãozinho estaria em até 1260 vezes por minuto, mas assim estranhamente parado, enquadrado deve estar a 480 batidas por minuto... O Meu já bate 70 vezes por minuto, mas agora... Olá, Esperança! Veio me ver ou me levar? Agora não consigo não sorrir, ela me olha e já não é mais um borrão! Vem em minha direção, a janela aberta.. e então...!

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