quarta-feira, outubro 31, 2012

Miniconto - Nunca antes...


Nunca antes...
por Rafael Belo
Ele olhava para o chuveiro na madrugada e deixava escorrer aquela água enfumaçada de tão quente mesmo com o botão no desligado. Com a água devedora do refrescar todo o período eleitoral ia pelo ralo e toda lembrança recente rodopiava junto. Aquele som de chuva encanada permitia o fluir das idéias e tudo havia acontecido com a descoberta política da internet como nunca antes na história deste país virtual... Mas aquele último banho de pensamentos seguiria de nada porque o amanhã já não existia. Agora ele havia terminado.

Mesmo sendo inodoro, o cheiro dos esgotos derreteram as telas de acesso à internet de dentro para fora. Se formos falar do início demoraria muitos livros para explicar os reveses a culminarem no baile de máscaras. Então, vamos editar. No Facebook chegou o convite para o evento e até as hastags do Twitter divulgavam a festa. Era uma reunião marcando extraordinariamente a mudança de local e data do fim do mundo. Nada de 21 de dezembro. Tudo aconteceria no dia 31 de outubro a partir do primeiro minuto na Gruta do Lago Azul em Bonito.

Havia gente de todo pedaço político do planeta escolhidos a dedo. As pessoas foram chegando e contaminando o ambiente. Cada degrau estava ocupado e a ocupação se estendia até em flutuação nas azuis águas. A maturidade ficara perdida em inscrições não vista na entrada da “caverna”. Nada conquistado, sentido, falado valia mais. Mas o mais estranho era o silêncio. Apenas sons, flashes e um tec tec tec. Todos haviam recebido os últimos Iphones criados e cada um tinha o contatos de todos ali selecionados. Lá fora havia choro, ranger de dentes e todo tipo de gritaria e sons incompreensíveis. Eram dos que propositalmente viram o convite, mas não foram selecionados.

Aquele autismo egoísta egocêntrico nunca antes havia estado em situação de coletivo. E lá fora, os excluídos também tinham smarthphones. Auxiliados por um “revoltado hacker” tiveram acesso ao selecionados. Mas nenhuma rede do mundo aguentaria tanta falsidade, tantas máscaras caídas, tanto desperdício de inteligência, tanto raciocínio montado, tanta ética em algum labirinto desconhecido, tanta falta de conteúdo, tanta moral na sarjeta das timelines quanto raciocínios ralos rareando... Então, antes do sol nascer ele abraçava os presentes, os ausentes e os excluídos. Nunca antes a rede mundial havia caído para não mais se conectar e o amanhã terminou por não conseguir se levantar.

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