segunda-feira, julho 30, 2018

Há muitas formas de ouvir






por Rafael Belo

Sempre chego à Orla Morena tentando ser imperceptível. Paro, olho, escuto... Observo cada um ali. Recentemente o número de fumantes de narguile aumentou muito. Então, há muita fumaça ao redor e no meio de quem está ali dançando... Nada agradável. Fora o desrespeito intencional ou não de outros sons altíssimos rolando ao redor. Enfim, nem sempre consigo chegar e não ser visto. Quase nunca, na verdade. Mas, no último domingo consegui ficar em silêncio. Forçado, mas silêncio. Fiquei afônico. Minha voz se foi e etc... Isso me permitiu dar uma atenção a mais.

A particularidade das pessoas dançando... Ah, sim para quem desconhece em Campo Grande existe um rolê de dança permanente aos domingos à noite chamado Zouk Na Orla... Voltando, é singular realmente. Não há padrões para dançar. Cada um se sente à vontade no próprio corpo e conecta a música a ele e a quem estiver dançando junto. É um relacionamento puro, sem distinção alguma. Quem assiste da arquibancada de um palco ao estilo mini Coliseu, vê diversão, sorrisos, alegria e estamos falando sem distinção de sexo, raça, classe social nem gênero.

Eu vejo desta forma um objetivo de qualquer tipo de relacionamento. Amizade, Amor, Família, trabalho, cotidiano... É clássico, é clichê, mas fato. Basta prestar um segundo de atenção ao redor e vai explodir no nosso rosto a quantidade de desencontros na vida. Enquanto uns relacionamentos começam outros terminam e cada um traz o que preferir destes ou aquilo que não conseguiram superar ou precisam se curar para prosseguir. Por isso, não acredito existir só um caminho para nós. São desafios diários e constantes onde precisamos parar de desencontrar com nós mesmos. Nós nos relacionamos primeiro com a gente mesmo e em seguida encontramos alguém ou alguém nos encontra... Não há regras além do respeito. Mas, fazemos ao contrário começando a achar que nos encontramos no outro, a nos relacionar com o outro sem sequer nos conhecermos ainda e tudo bem...

Sabe se lá quantas vezes vamos nos aprisionar para entender que ser livre não é ser sozinho, nem estar só, mas somar ao outro e preservar o espaço deste indivíduo. Claro, nós conseguimos ser solitários, ficarmos sós e é saudável e é possível, mas eu só cresço de verdade quando compartilho, quando falo, quando converso, quando estou com outras pessoas. Não importa a quantidade de livros convertidos em conhecimento pessoal, os diplomas colecionados, as línguas faladas, o emprego, a empresa, o veículo, o quanto me divirto, as posses, as quantidades, se nada acontecer daí... 

Por isso, tento zerar todos os dias, respirar fundo e ir. Simples. Olhar o outro, sorrir e não fugir das possibilidades. Nós ainda não chegamos a atingir nossa capacidade de Amar. Estamos aqui, pequenos, querendo algum tipo de controle em uma relação quando, como na dança só precisamos ouvir, dar a intenção, expressá-la de forma a ser entendível e deixar o outro livre para criarmos juntos “A” conexão, a relação, então aos poucos nossa pequenez se agiganta.

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