quarta-feira, agosto 22, 2018

A única (miniconto)






por Rafael Belo

Eu estou sendo perseguida. Ninguém está por perto. Não há ninguém nas ruas. Não sei nem como me sentir… Fui abordada sem motivo ou melhor por motivo inventado. Ainda estou com medo, como não estar? Quantas mulheres desaparecem por dia? Quantas são mortas por minuto? Quantas sobrevivem na fronteira? Mas isso cabe a todos os seres humanos. A violência direciona nossas vida. É ela quem diz como vamos viver e morrer…

Estou morta de medo. Não entendo a violência. Não. Eles não encostaram em mim. Não me revistaram. Fizeram perguntas sem sentido. Não eram policiais de trânsito. Não fecharam meu carro nem emparelharam, apenas ligaram timidamente o giroflex e permaneceram atrás sem passar… Dei espaço. Aí minha amiga disse para eu parar. Parei um instante e no seguinte estacionei. Não queria bloquear o trânsito…

Comecei a pensar e percebi eu ser a única negra que vi durante toda a semana estranha que passamos na Fronteira e antes de eu ser abordada não tinha visto isso acontecer também… o
O que isso significa? Fui firme nas respostas. Não tremi nem hesitei, mas eles tremiam e hesitavam… Alguma coisa estava muito errada. Eles pegaram meus documentos e eu ouvi falarem com a Interpol …

Eu ouvi em resposta frases misturadas entre português e alguma língua que eu não identificava. Foi quando quem conversava comigo sacou a arma… Eu joguei minha amiga junto comigo dentro do carro. O barulho ensurdecedor de tiros me fez chorar de raiva. Minha amiga estava desesperada, mas ela… Ela… Eu… Eu rastejei por baixo dela e sai do carro assim até a esquina quando tive certeza da possibilidade de levantar… Corri e ainda corro em silêncio. Não sei se vou poder parar um dia.

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