Por Rafael Belo
Quantas dores há no mundo? Começando de nós mesmos, vejo muitas. A dor da fome, da ignorância, da desilusão... Mas, a mais dolorida é a da perda. É desta dor a se falar. Viva e deixe morrer... Viva e deixe viver... Quando alguém próximo - e muito próximo – morre, não é como acabar um relacionamento, mudar de cidade ou manter um segredo devastador (às vezes é)... Toda aquela rotina onde a pessoa (agora morta) se infiltrara está vazia dela. Perder pessoas é um termo forte demais, não se perde ninguém. As pessoas não nos pertencem, nem nós nos pertencemos. Há algumas semanas, a revista eletrônica dominical daquela rede sinônimo de planeta, mostrou a dor de quem ficou após a calamidade “natural” de Santa Catarina. A alguns deles, vestidos de dor, me pareceu a própria morte mais fácil, a agüentar a morte de um filho, ou de um ente amado. Orfandade de diversas maneiras na televisão.
É triste, de diversas maneiras, assistir sem poder assistir a dor alheia jogada da tela para informar (?) e entreter (?). Infelizmente eu tinha esquecido a proporção das chuvas catarinenses. Não, bem esquecido, mas me desligado do efeito em longo prazo. Casas e famílias afogadas. Os sobreviventes mostrando claramente uma dor aguda na televisão. Qual a necessidade de contar a cicatriz aberta de novo e de novo. Foi bom e foi ruim, digo. Não precisava mostrar tanto a dramaticidade, de um drama tão triste. Os “sobreviventes” poderiam ser poupados de reviver os dias de chuva e os de desolação conseqüentes. Quantas dores custa uma informação? É dor, medo e violência nas cores iluminando da velha caixa, no escuro da sala a receber exclamações indignadas e de cautela das famílias diante da tela. Dias de chuva são preocupação para o país de uma maneira mais dolorosa, agora.
Terminei de ler um livro onde guardião de memórias (título do livro de Kim Edwards) ficou sinônimo de segredo imenso e devastador. Lugar onde uma floresta densa e impenetrável cresce no centro do coração e ninguém entra de fato. O livro prendedor conecta-se diretamente com as dores de Santa Catarina pela dor causada pelo silêncio e o vazio posterior. A dor de um pai, uma mãe, um filho, uma diversidade genética, decisões, desastres naturais onde a culpa envolve todos e aponta caminhos longos e tortuosos caminhados sozinho. Algumas pessoas vestem a dor com um número a menos, pensando ser apropriado o aperto. Deixam a vestimenta apropriada por pouco tempo ser inapropriada por tempo demais e as dores próprias do mundo não são tidas como aprendizado, mas como castigo supérfluo a ensinar apenas quem regeu o castigo. O que sei de dor, afinal?
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