sexta-feira, dezembro 07, 2012

Miniconto - Parte



Miniconto - Parte
por Rafael Belo

Simplesmente estava lá. Mas, se passaram dias para as pessoas notarem. Só ainda não sabiam se ele esteve o tempo todo naquele lugar ou se todo dia, pouco antes de olharem, ele chegava. A verdade é que nestes dias de surtos mais divulgados achamos ser mais frequente perder a cabeça e tememos entrar em contato com o “desconhecido”. O “desconhecido” no caso era um político. Ocupava o tempo ocioso das sessões para ler e incrivelmente não dormia com tanta monotonia. Nestas leituras, de terça à quinta, descobriu algo novo: a contemplação.

Já nem ia mais as sessões, mas sua ausência nem era notada, inclusive pelos próprios colegas. Tanto o era que na “lista de presença” ele constava presente. Enfim, por algum destes motivos que não cabe a nós reles humanos explicar, o nobre parlamentar começou a passar dia e noite atrás de qualquer autor e livro sobre contemplação. Encontrou um templo budista em Campo Grande onde um monge shaolin (um chinês que meditava dias a fio sem comer e beber e tinha o corpo e a mente de aço) vivia isolado. Aprendeu a se camuflar, a ser absorvido pela paisagem. Percebeu não servir para política por não fazer nada – mesmo que exista aquele aptos para o cargo de nada fazer.

Partiu para a escrita. Prometeu a si mesmo escrever para despertar os detalhes de observar nas pessoas. A contemplação iria triunfar e ele seria o instrumento. Para tanto iria fazer diversos testes. Como dito pelo chinês as pessoas não viam realmente o que estava lá. Cada manhã passava horas nos lugares até uma criança mal cuidada e inconveniente o revelar. Mesmo assim demorava para os adultos darem atenção. Quando davam ele saia na primeira distração. De longe observava mais um pouco e então partia para a próxima parada.

Chegou a Casa onde antes trabalhava. Chegou cedo. Ninguém o fazia. Ficou lá meses e meses. E um dia ouviu alguém tentar se lembrar dele ao conversar com outros funcionários e de repente alguém o viu, mas sem o identificar. Ele não comia e não bebia. Era improvável que em seu atual estado fosse reconhecido. No entanto, ainda queria ver até onde chegaria a multidão de funcionários a ser formar com os rostos, corpos e dedos apontados para ele. Eles entraram e decidiram que sumiriam com aquele louco dali. Viram as gravações das câmeras externas e se assustaram. Perguntavam-se quantos ele havia matado.

Quando ele os viu sair. Sorriu sem saber que seria linchado e humilhado quase até a morte por observar demais.

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