sexta-feira, setembro 07, 2018

as cartas que eu deixo (miniconto)






por Rafael Belo

Apesar das notícias antigas, você sabe que eu vejo novidades. Você vem quando brilham meus olhos. Você os vê brilhando e finge não ser nada. Por isso, sigo indo embora e deixando novidades escritas à mão. As cartas que eu deixo é para você ter certeza. Eu sei que está atrás de mim. Mas, você só vai me alcançar quando eu cansar. Azar o seu se eu canso das pessoas e dos lugares antes de você chegar.

Você tornou tudo mais difícil quando divulgou minhas cartas como novidade. Mas só por um tempo. Logo eu fui copiada de todas as formas. Agora é tão comum e chato. Todos fazem o mesmo enquanto curtidas, comentários e compartilhamentos estiverem acontecendo depois é o próximo. Eu sei. Sei de cada uma das tuas tentativas. Não vai funcionar de novo. Somos espíritos antigos em corpos que não envelhecem…

Não contamos o tempo da mesma forma. Eu tento dormir só para me misturar. Tento reclamar para ninguém desconfiar. Tento estar na maioria dos rolês para ninguém ficar falando. Tento fingir embriaguez não importa quantas misturas de bebidas nem sequer fazerem efeito… Tento até me relacionar, mas talvez realmente eu não tenha coração como você me acusou certa vez. Você tem certeza que não o devorou pouco depois de despedaçá-lo?

Eu tento esquecer das coisas, dos nomes, dos lugares, das pessoas, mas eu esqueço mesmo é das possíveis dores… Ainda não descobri o motivo de armazenar tantas informações se a seleção natural deixou de ser eficaz e é assaltada, burlada, ignorada, assassinada pelos contatos, pelas relações e minha balança jaz enferrujada ao som de algum esquecido jazz… A única coisa que ainda me faz procurar é eu ter dado minha Palavra existir boa poesia por aí. E como nosso tempo é outro, eu vou seguir deixando minhas cartas e você, único capaz de ler, segue tentando provar minha existência.

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