sexta-feira, novembro 23, 2012

Coma



Coma
por Rafael Belo


Ela despertou de repente. Não era ela. Mas no fundo dos olhos se enxergava. Nenhuma de suas lembranças tinha vínculo com este corpo. Quantos anos tinha?! Não era 20?! Porque este corpo de 30?! Quando se esforçava para lembrar sua última lembrança, apenas vinha a palavra como uma ordem. Hummm... Nãooooooo! Como uma su- ges-tão. Uma repetição cansativa e exaustiva coma coma coma... Depois a imagem de suas mão selecionando diversos tipos de alimento e em seguida a lengua-lengua alucinante: coma coma coma...

Sua cabeça doía muito e sua visão turvava. Depois ficava tão tonta, mas tão tonta a ponto de acordar muito tempo depois com hematomas e prometer não tentar se lembrar. Por todos os indicativos lembranças doíam. Mas, como todo ser humano ela precisava lembrar, nem se fosse para esquecer. Sua curiosidade sobre si mesma diante de toda aquela ala branca vazia e sem energia a estava deixando realmente fora de si. Onde estavam todos? Por que tanto silêncio? Afinal onde estava? Um calor abrasante a fazia encharcar seja lá o que fosse o que a cobria...

Pensou em fazer o básico. Aliás, atender as necessidades básicas do corpo. Ao se despir para tomar banho se retraiu de imediato com o reflexo do pedaço quebrado de espelho. Ela estava cheia de cicatrizes. Estavam em fase de assimilação, ou seja, estavam sumindo, mas lá estavam... Decidiu fazer uma cosia de cada vez e se preocuparia com isso depois. Abriu umas gavetas até encontrar uma toalha limpa. Abriu o chuveiro e esperou. Depois de muito barulho uma água vermelho-marrom começou a jorrar. Meia-hora depois a água clareou e ficou com sabor de água, ou seja, nenhum...

Bebeu e se lavou. Ouviu um som próximo, se assustou, escorregou, bateu a cabeça e apagou. Como se a água a levasse às suas lembranças adormecidas ela mais uma vez despertou, mas com milhares de imagens e milhões de sons. Levantou-se atônita e voltou para seu leito. Sim ela estava em uma ala psiquiátrica. Sentou e viu o avanço tecnológico daquele lugar que. Havia um estoque de alimento líquido e o conhecido soro, trocado automaticamente... Afinal ela precisava ouvir uma voz e resolveu falar em voz alta suas lembranças. Comi algo que atacou minha saúde e me induziu ao coma por dez anos. Ouvi vozes e mudei sem viver de verdade. Fui mantida viva... Por quê? Doía sua cabeça seu estômago seus olhos, ela iria desacordar novamente...!

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