sexta-feira, agosto 24, 2012

Miniconto - Sétimo dia



por Rafael Belo
Morto e enterrado. Para as pessoas e a medicina, Jazco Silva jazia há uma semana. Exatamente sete dias haviam se passado quando o falso falecido fez seu corpo presente no meio de sua própria missa de sétimo dia. Não há dúvidas da correria, do pensamento de brincadeira mórbida. Mas, o ex-morto, estava realmente vivo. Sujo, faminto, desnorteado, praticamente um zumbi. Por isso, o fato da igreja ficar acima do jazigo da família explicava o motivo de Jaczo estar ali tentando raciocinar porque tantas imagens dele e porque todos os familiares, amigos e conhecidos estavam ali.

Coração parado. Estas foram as últimas palavras ouvidas por Jazco. Depois tudo foi silêncio. Nenhuma voz de fora. Quando acordou tinha certeza de ter conversado muito, mas se falar. Estava se esforçando para lembrar palavra por palavra, enquanto os mais saudosos e corajosos se aproximavam, tocavam, perguntavam... E Jazco olhava olho por olho ao mesmo tempo lembrando a história de cada presente com ele. Até então, tudo estava escuro e rastejante, mas aos poucos uma ponte iluminada surgiu em sua mente.

Veio a Luz. Como se sua alma voltasse apenas neste momento. Jazco sorriu e todos pararam, tudo silenciou e quem se encheu de ruídos e de todo o claro som do mundo foi Jazco. Iluminado começou a falar, foi até o altar e feito o principal elemento para quem a missa era dedicada, inverteu os papéis. “Uma voz me tranquilizou este tempo efêmero no qual estive enterrado. Meu coração estava parado. Mas tive nova chance... Não sabia... Meu coração parado, já vinha sem bater há muito... E este ato físico acontecido, há de acontecer com todos se não ressuscitarem seus corações”.

O dito acelerou tanto os corações presentes a ponto de esquentar em um grau de espasmos. Corpos e almas se mantinham embevecidos e a pele arrepiada, porém, as mentes medrosas ferviam por outro motivo. Não era algo racional, nada a produzir um raciocínio aceitável, então, continuaram a ignorar os sentidos do corpo, da alma, as batidas dos corações parados e, pelo anunciado, estavam prestes a somatizarem para um funeral coletivo de proporções tão imensas a quebrarem as tradições dos caixões tailandeses... Vários Jazcos estavam acontecendo por toda parte.

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