por Rafael Belo
Minha face era desconhecida até para mim mesma. Parecia delicada, confiante, uma perfeita máscara social, mas por trás desta adaptação sintética há algo mais pesado. É como olhar para frente e para cima, mas na verdade ter dor na nuca porque meu rosto vive voltado para o chão com o peso de tantas câmaras misturadas às camadas de quem não sou. São tantos cadeados nas fechaduras desta máscara de ferro que já nem lembro mais quais os códigos da libertação.
Cada número está na minha frente. Eu os vejo, mas não os entendo. Fico presa em um desconhecimento e em mim, desconhecida. Mas sou figura conhecida que muitos julgam serem amigos, conhecer… Eu rio de nervosa, chego a perder o controle dos músculos e tremo. Depois procuro os motivos dentro do vazio dentro de mim só para me cansar. Eles fogem. Como demônios me possuindo, se negam a dizer o nome e eu sigo no desconhecimento ao não pertencimento.
Enquanto pensam eu ser muralha, estrutura, firme bloco, eu desmorono. Vivo desmoronada como se insistisse em viver nas áreas de risco da cidade e todo ano as chuvas levassem tudo que tenho. Sempre um pouco mais que nada. Como dizer: eu não sei quem sou e não sou quem você diz eu ser? É tanta gente dependendo destas minhas máscaras que qualquer coisa fora do roteiro que eu faça vem direto para as minhas decepções e fobias secretas.
Hoje eu acordei no meio de vocês sem vocês saberem quem são. Vocês perderam a memória e não sei julgar se é egoísmo eu fingir também não saber quem são vocês porque, para mim, parece ser a primeira vez que vocês estão no meu lugar. Eu admiti não saber quem sou, ontem assim que terminei de descaracterizar minha personalidade quando todos esperavam que eu cantasse. Talvez tenham tido todas as dúvidas entre realidade, interpretação e ironia. Mas agora que liberei o monstro que sinto ser ainda não tive coragem de abrir o último cadeado. Parece que enquanto eu dormia soube finalmente decifrar todos os códigos dos meus cadeados.
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