quarta-feira, junho 13, 2018

Eu sou a testemunha (miniconto)






Por Rafael Belo

Fui substituída pela terceira vez este mês. Eles querem que eu peça demissão? Não conhecem as novas leis? Estou realmente enlouquecendo... Não há como ter noção de tempo aqui. Esta prisão úmida e antiga deveria ser destruída. Eu não matei nenhuma das mulheres que dividiram os mínimos metros quadrados comigo. Não sou assassina. Nunca serei... Há algo aqui envolto a histórias e mitos.  Eu nunca acreditaria. Mas, eu sinto uma carência tão grande quando está para acontecer que um abismo de ventos nasce no meu peito. Eu fico tão gelada que penso estar morta desta vez...

Desde que... Fui aprisionada, surgiu um desespero dentro de mim. Isto e a necessidade de ... As outras detentas parecem estar fazendo de tudo para socializar e mostrar uma boa imagem. Parece tudo sincero. Elas querem sair daqui o mais rápido possível. Todos querem... Mas há uma urgência desesperadora nesta atitude. Há uma real mudança de comportamento. Todas aqui tem diploma... Isto nunca as definiu. É estranho admirar criminosas...  Me tornei uma, não é?! Claro! Estou aqui julgada por uma sociedade criminosa, um governo criminoso, policiais criminosos, juízes criminosos... Exceções não fazem estatísticas. Eu estou dentro de todas aquelas negativas para as mulheres, mas pelo menos (ainda) não entrei nas fatais...

Eu senti tudo isso mais uma vez... Eles não me venceram... Há algo aqui nestas tubulações, mas será só envenenamento, entorpecimento e morte? Eu sou a testemunha. Eles não conseguem me matar. Se eles não devem entender o motivo, eu também não entendo... Há motivos... Só lembro de desmotivação ao redor. Os incentivos são por competição e dinheiro... Distribuir moradias para quem precisa não deveria importar para eles. Não importa, importa? Importa é terem tirado algo deles, este tal perder...! Estou tonta... Eita! quanto tempo de ausência... Pergunta estúpida... Veja! Há uma expressão de extrema satisfação no rosto delas...

Sinto esta satisfação comigo mesma... Agora entendo o porquê! De onde veio esta paz e ...! Droga! Ainda quero razões, explicações... Talvez isto seja o sonho da fuga. Não sei se quero sair desta prisão para voltar para a do mundo exterior... É sempre no final que lamentamos não ter com quem compartilhar algo e... Estranho como tudo isso que sinto não pesa mais. Inferno! Eu não quero me sentir leve. De nada me vale a leveza neste momento. Estou perdendo os sentidos, estou sem sentir nada, eu vou ficar inconsciente e não sei se isso será a morte ou se acordarei em outra ausência como testemunha ou se serei a milésima insubstituível substituta. 

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