sábado, junho 29, 2013

(Miniconto) Donos das ruas#



(Miniconto) Donos das ruas#
por Rafael Belo

Recebeu o chamado e contorceu os olhos e o rosto. Mas não queria ficar distante dos amigos e de tudo que estava acontecendo. Não iria perder o futebolzinho sagrado. Iria depois. Assim o fez. Nas ruas, os jovens de todas as idades pareciam um vazamento sério do encanamento principal da cidade ou, pior, o mar, sem aviso prévio, já tomava conta dos litorais e agora chegava ao centro do Brasil... 

Seu olhar de espanto não era o único. Em cima dos próprio carros, motoristas eram engolidos pelo oceano de pessoas em revolta harmoniosa. Tomados não tinham o que fazer. Paralisados quase totalmente, batiam palmas. Da face de espanto, um pranto escorria para somar aquele novo mar.

Ele não conseguiu ficar indiferente. Toda a ideia preguiçosa e descrente de "não adianta" agora eram lágrimas. Como tolo apaixonado via o reflexo de sorrisos "sem quê nem porquê" invadindo sua boca. Logo sorria como se contemplasse a história sendo escrita, acontecendo. E não era isso mesmo? Sei coração disparava, sua pele arrepiava. Já não era mais o mesmo. Girava em 360 graus sem parar. Cada giro mais brilho no olhar. As ruas tomadas.eram os donos das ruas.

Estou fazendo história. Fui contagiado. Fiquei tanto tempo engolindo este silêncio espinhoso e vermelho... Vim aqui para rir e acabei chorando... Talvez os outros também tenham feito como eu. Como tanta apatia, preguiça, bundamolismo se transformou nesta... Nesta... NESTA coisa linda. É uma energia imensa. É! Esteve tudo guardado na espreita, a espera deste momento. Pensando bem, estava tudo guardado aqui neste peito antes curvado. AS RUAS SÃO MINHAS, AS RUAS SÃO NOSSAS, #VEMPRARUA #VEMPRARUA #VEMPRARUA!

Quase não vim para ficar criticando de casa... Ah, não vou encontrar ninguém no meio destas milhares de pessoas. Vamos gritar. Vamos convocar nossos empregados: vereadores, deputados, prefeitos, governadores, ministros, presidente e cada servidor público... VOCÊ AÍ PARADO É O MAIS EXPLORADO. Opa canetas, cartolinas... Ora de me armar... Vocês vão ver que o jovem descrente voltou a se indignar todos os dias. Eu vou ver! E garantir que assim seja.

quinta-feira, junho 27, 2013

Falso Gigante


Falso Gigante



As máscaras ficam no caminho do passo da multidão
abaixo do grito da imensidão do furor aclamado
rostos encharcados de clamor

o agito emocionado encarna a emoção
não existem anônimos que resistam a história
da sensação dos caras-de-pau sendo lascados na trajetória

do cumprimento do dever do Poder, pelo povo dado

pode revirar o olhar não há lado, onde não está um representante temendo

ser cobrado, porque o gigante é falso e representa a má gestão de três poderes

o Brasil é o Golias de funda e pedra e vai julgando quem segrega retomando cada um dos seus alqueires.

(Rafael Belo, às 19h40, quarta-feira, 26 de junho de 2013)

terça-feira, junho 25, 2013

Sai o grito da garganta ainda em progresso



Sai o grito da garganta ainda em progresso
por Rafael Belo
Finalmente as ruas foram retomadas pelos gritos e pela emoção. O furor e os arrepios percorrem todas as vias do mundo onde as veias brasileiras passam, pulsam e contagiam. É lindo participar da democracia. Vestir a pátria escolhida. Enxergar a acomodação sendo repisada por uma multidão inimaginável que se libertou e desmitificou as mídias sociais. Como não marejar os olhos e sorrir sem se conter diante das manifestações brasileiras? Não! Não é sem foco. Pode ser que haja desorganização de gritos, mas a voz das multidões é uma só como assim se afunilam as reivindicações: mudança! Como está não dá mais!

A alegria de ver os peitos libertos, mas ainda estufados, abertos pelo orgulho de clamar pela mudança. Chama a prestar contas quais sãos os aproximadamente 63 impostos que pagamos e para onde vai tanto dinheiro nosso. O sistema se recolheu, se encolheu e até tentou ser oportunista, aproveitador, usar discursos e diálogos unilaterais que até há poucos dias funcionava ou assim se achava pelo silêncio. Cumprir o óbvio, o já prometido. Dizer mentiras tão difamadas que chegam a serem divulgadas na tentativa de mentiras compartilhadas, fraudadas em notícias, copiadas, coladas milhares de vezes se tornar uma verdade... A canseira é tanta que a energia acumulada por tantos anos de apatia e conformismo se inconformou se indignou e parece não parar mais até invadir seus direitos.

Não há como concordar com a depredação, o vandalismo, furtos e a violência - até porque quem paga por isso somos nós, cidadãos de classe média e baixa, durante cinco meses por ano, só depois nossos salários contados "ficam" para nós - mas até a invasão dos símbolos públicos dos Poderes é significativa. Não é vazia. Pelo contrário. É repleta. Cheia de simbologia. Histórica. Porém de forma algum incentivada e incitada... Como a Queda da Bastilha ou a representação de Guy Fawkes (ou John Guido) com a máscara do V for Vendetta (V de Vingança). Este personagem britânico histórico, em 1605 durante a Conspiração da Pólvora, era um dos que pretendia assassinar o Rei Jaime I, por atrocidades, repressões aos direitos políticos dos católicos e para restaurar o poder temporário do Catolicismo.

Guy guardava os barris de pólvora que iriam explodir o Parlamento do Reino Unido durante a sessão. A Conspiração foi desarmada, Guy foi preso, interrogado, torturado e enforcado. Desde então a Bonfire Night (Noite das Fogueiras) é celebrada todo dia 5 de novembro. Sem fogueiras (na maioria dos protestos), estamos fazendo nossa história todas as noites. Nosso manifesto é por mudança e queima a flâmula da nossa pátria escolhida em progresso.
Mudança para melhor, por isso, pode até não serem consideradas legítimas as tentativas de ocupar prédios públicos, mas por falta de símbolos melhores do poder, como o da França comemorado até hoje com a Fête de la Fédération (Festa da Federação) no quatorze juillet (14 de julho), a Tomada da Bastilha (Queda), símbolo central da Revolução Francesa, vão mesmo as Assembleias Legislativas, Câmaras Municipais, Prefeituras, prédios históricos e demais objetos que hospedam aqueles que deveriam nos representar. 

É histórica a retomada do povo pelo que é seu, pelo que o deveria o representar e o deixou de fazê-lo. Por isso, a imagem partidária de qualquer um eleito pelo povo é rejeitada, pois está associada ao sistema atual de governo, ao partido que por vezes representa mais do que quem realmente deveria representar. É muito nos compararmos com a Revolução Francesa, mas assim como ela estamos provocando reações em outros países, o Paraguai se manifesta com o grito Paraguai Despertou.  Nós despertamos e demonstramos o despertar, mas só deitaremos em berço esplêndido quando tivermos o falatório em ação, conclusão, ordem e ouvirem nosso Grito do Ipiranga.

sábado, junho 22, 2013

(miniconto) Por toda parte

(miniconto)Por toda parte
por Rafael Belo
Parecia ainda que viviam no século 18. Todo aquele planeta descolorido. Todo quadro preto ou branco. De cada janela quebrada não saia nada nem entrava. Apenas vento e luz. Além das luzes permanecerem acesas - a maior diferença de três séculos. Apenas uma janela permanecia às escuras. Nem sombras era possível enxergar caso alguém alguma vez tivesse olhado além do próprio horizonte. Acontece que isto estava prestes a acontecer. Distraída ela tropeçou. Tentando e conseguindo se equilibrar jogou o corpo para trás. Nisso seus óculos de aros verdes claros decolaram. E ela olhou para o alto.

Foi como se uma cirurgia complexa, demorada, mas muito eficiente acontecesse naquele instante. O branco/preto foi ficando amarelado. Nem reparou o local da queda do precioso óculos. Estava próxima o suficiente para reparar. – Engraçado - pensou consigo mesma – nunca havia reparado neste contraste. Nem em muitas outras coisas diga-se de passagem. Vagarosamente deslocou a cabeça para a direita. Janela por janela. Todas jorrando luz artificial, afinal era noite. Todas quebradas. Do lado esquerdo também. Entre as luzes a janela intacta e apagada. Mas parecia emitir uma claridade latente. Girou 360° e aquela era a única. Um detalhe...

Vou entrar e subir até aquele andar. Ah, meus óculos. Tem algo estranho nisto tudo. Nunca tinha visto esta tonalidade. Toc Toc? Oláaa? Alguém em casa? Nada... Assombrosa. Detesto portas rangentes. Dá-me arrepios. Mas vamos lá garota: co-ra-gem!  Que sobrado colorido é este! Deve ser impressão. Onde está o interruptor... PRONTO. UAU. Incrível. Que lugar mais lindo. Está limpinho, mas parece abandonado há séculos...

A janela. Melhor me apressar... Vai quê... Nada de interruptor aqui. Humm... Vidro blindado e o restante azul clarinho. Confortável. Ooh quantos desenhos espalhados e bloquinhos e anotações e fotos e... e... NOSSA! Esta é a minha cidade. Dá pra ver todinha e quantas cores. I-na-cre-di-tá-vel. Dá uma alegria. Uma inspiração...


Todos as noites desvincilhava-se de todos e acabava por lá. Diziam as más línguas que andava de namorado e tal. Aí já sabe...Logo logo aparece barriguda... Aí quero ver ficar sorrindo assim... Não se sabe porque tornou- se uma pessoa melhor, mais atenciosa. Diziam até que conseguia ler as pessoas. Mas, vai saber, há tanta fofoca por toda parte...!

quinta-feira, junho 20, 2013

Instantes janelas

Instantes janelas

Neste momento faltam cores no quadro,
o geral está descolorindo e os detalhes passaram

agora está tudo muito vago,
o real sobra em inibição indo adiante onde pararam

ausentes da contabilização do saldo,
o presente está doente, o imobilizaram

nas janelas semicerradas há o desperdício do vício no palco
introvertido nas vistas cerradas, cercadas mobilizadas do que passarão
para ser cada instante além de luz e ar,
ser tudo perspectivas dos agoras de ângulos e fundos
a verdadeira janela aberta do mundo.

(às 18h56, Rafael Belo, quarta-feira, 19 de junho de 2013)


terça-feira, junho 18, 2013

Ausente do agora

Ausente do agora
por Rafael Belo

Os detalhes sempre fazem a diferença. Ontem de manhã, antes das 8h, cheguei ao estacionamento do meu emprego e fiquei surpreso. Primeiro um sabiá fêmea pousou na janela do passageiro. Ficou lá entre a janela e o retrovisor. Saltitante. Esvoaçante. Então, o sabiá macho chegou ao parabrisa do lado do passageiro. Ambos pareciam me olhar. Ficaram lá longos minutos mudando as diagonais da cabeça. Pra lá. Pra cá. Não ousei me mexer, temendo assustá-los e perder o encanto.

Ela era marrom-casca-de-árvore. Ele marrom com amarelo. Foram dois sorrisos que o dia me deu. Até alguém chegar distraído. Introvertido na sua manhã. Bem próximo do carro e pronto. Quebrou-se o encanto. Eles voaram. Ainda fiquei parado um minuto. Então desci. Olhando para todos os lados, afinal não é todo local de trabalho que é visitado por todo tipo de pássaros e quatis, além de outros animais. Não é toda janela que serve como tela do mundo. A maioria serve apenas para deixar a luz e o ar entrarem e circularem.

Um desperdício de janela se considerarmos nossos olhos também. Quanto da vida está nós detalhes? Sem eles não entendemos o quadro geral. Fica tudo preto e branco. A vida é cor. São as cores a vida. Se não usarmos muito nossos olhos e nossos ouvidos, vamos reclamar que tudo é sem cor, sem som... Um filme mudo com enredo fraco e desinteressante. O geral fica adormecido, fica igual e as cores se perdem se misturam. Basta um pássaro para fazer a segunda-feira sorrir.

Se você não está sorrindo, olhe ao redor como se nunca tivesse visto. Há vida até no concreto frio e duro. A vida sorri para você mesmo se você não sorrir de volta. A Natureza é paciente e nossa impaciência nos impede de ver, ouvir e sentir o que está ao redor, principalmente porque queremos ver o que ainda nem está no seu tempo. Queremos nosso futuro. Queremos o seguinte e o agora só fica fadado ao imediatismo com resultados impacientemente instantâneos. Por isso, fica a pergunta: onde estamos neste momento?

sábado, junho 15, 2013

(Miniconto) Invasores

(Miniconto) Invasores
por Rafael Belo

Estava tudo vazio e destruído. Vestígios de uma guerra declarada. Haviam algumas brasas espalhadas por diversos pontos e uma leve brisa começou as espalhar as cinzas. Distantes daquelas ruínas modernas dois grupos falavam de terras, propriedades, um de frente para o outro. Se um viajante do passado ou do futuro surgisse certamente duvidaria ter se deslocado pelo tempo. Poderia muito bem estar há 500, mil ou três mil anos ou então ter avançado para daqui a 600, 1,2 mil ou cinco mil anos.

Aos poucos o vento imperceptivelmente aumentava e o fogo falso morto se atiçou. As brasas já eram um incontrolável incêndio. Os gritos dos grupos eram tão fortes a ponto de abafar aquele consumo desenfreado do fogo. Aquele conflito sem fim entre os eternos colonizadores e colonizados não permitiu ninguém perceber o cerco do perigo. Quando o ar se esvaiu e as tosses dominaram os grupos. O fogo mandava, habitava e terminava de destruir aquelas terras.

Em poucos minutos todos pareciam iguais. Suor e cinzas eram a cor da pele, o tipo de cabelo e a cor dos olhos. Respirar era necessário, mas queimava como se o ar fosse fogo. A pele ardia como se o suor fosse álcool. De súbito todos começaram a se mover lentamente. Tiraram as camisas, aqueles que as usavam. Tiraram as calças e sincronicamente chegaram até um antigo poço ao lado de um depósito de pedras feito à mão. Não tinham muito tempo.

Silenciosamente se molharam, molharam os panos que rasgavam e enrolavam na cabeça deixando apenas os olhos de fora. Enquanto outro grupo pegava a ferramenta que encontrava e sulcava o chão sentindo os pêlos expostos queimarem. Durante horas de desmaios e chacolejos para despertar, água e terra eram atiradas ao fogo que lutou muito, mas não resistiu.


Feito o trabalho, cada um tentou "desmisturar" do outro grupo. Estavam exaustos. Não conseguiram a proeza. Ao invés disso, foram cedendo ao cansaço e caíram como estavam. Acordaram com gritos de ordem e papéis de ordem judicial de desocupação. Não se sabe aonde arrumaram tantos camburões. Mas, couberam todos. Todos misturados, sem documentos e sem argumentos de que não eram invasores. Eram só suor e cinza. Eram apenas invasores e estavam encarcerados.

quinta-feira, junho 13, 2013

Plural

Plural


Sem asas a terra voa de mão em mão
como se a imaginação lenvantasse e o sonho se alimentasse um pouquinho
como se o umbigo mudasse para um lugar tão diferente e pertinho

ninho de quem chegar e plantar a força
na terra-moça até então

antiga paixão pela interminável extensão do conflito
grito de poeira acumulada por toda a estrada do caminho

cheio de olhos, provisórios senhores do destino percorrido

sentados na beira, improvisado meio da limitação
pintando de guerra com carinho a situação de quem quer mais do que estar sozinho.


Às 17h50, Rafael Belo, quarta-feira, 12 de junho de 2013.

terça-feira, junho 11, 2013

O Mártir Indígena

O Mártir Indígena
por Rafael Belo
Mártires sempre foram as formas mais fáceis de promover uma causa e a morte do índio Terena Oziel Gabriel, o guerreiro, deixou isso mais evidente. Desde Corpus Christi, ou seja, há 12 dias (13 se contarmos a data do falecimento e sem referências partidárias...) os termos conflito, demarcação de terra, índio, Terena e Mato Grosso do Sul estão abrindo as chamadas dos telejornais do Brasil. Para “melhorar” o primo de Oziel, Josiel Gabriel, um ano mais novo com 34 anos, foi baleado nas costas. Ficou paralítico. Confusão generalizada. Primo morto e primo debilitado. Confundidos desde a cobertura local, quem dirá nacional sem nem falar da internacional. Mas é uma complicação simples de entender (por serem palavras quase homófonas).

Hoje são suítes (um retorno a origem do tema – invasão da Fazenda Buriti, morte na tentativa de desocupação, mais invasões, até o presente e futuro), mas novos fatos surgem diariamente com estopim motivador: pelo guerreiro morto, pelo índio debilitado. É sempre depois da morte que alguma ação mais contundente começa a se desencadear. Passados sete dias da morte – contado com o dia fatal – o ministro bem mandado voador da Justiça, José Eduardo Cardozo, chegou. Seja por desconversa com os indígenas ou pela chegada da tropa da Força Nacional, ou pelo vale-não vale, obedece-não obedece a ordem judicial, a Fazenda que foi a pólvora da explosão reocupada Buriti, amanheceu vazia. Mas ainda segue a diáspora do gado da região...

A tropa da Força Nacional assustou inicialmente e depois conversou, ponderou, permanece mesmo como garantia e "reconhecendo o território". E o que ficou vazio voltou a se preencher... As justificativas são as primeiras a surgirem com o mea culpa longe de acontecer, afinal foi um conflito da velha tragédia anunciada entre índios bem armados, capacitados e policiais estaduais, especiais e federais desarmados e desprotegidos. Até a cega Justiça já sabia do sonho premonitório do Mártir Indígena... Reintegração de posse (posso?) ou demarcação de terra? Em início de corrida eleitoral, ninguém quer se manifestar definitivamente sobre a ferida pré-Américo Vespúcio, que mesmo chegando depois de Colombo teve seu nome batizado na nossa América, era um grande mentiroso... Ou politicamente falando, exagerado.

Todos procuram uma solução que não afete ou se atrele a sua imagem aí em 2014. O ano eleitoral onde Oziel Gabriel, o guerreiro, será tão citado diante do palco tão montado e divulgado do conflito entre polícia e índios. Só que o palco é entre proprietários de terra e os tutelados da União. Claro, que proprietários pode ser lido como políticos ou vinculados com. O guerreiro morto exaltado, teve sua finalidade de unir a massa mais manobrada desde sempre. As palavras do cacique da aldeia Córrego do Meio, Antônio Aparecido Jorge, foram as mais pontuais e que junto ao mártir entrará para a história: “Para desenrolar um processo levam décadas, mas para surrar indígenas é questão de segundos. Mataram o corpo, mas não mataram nosso pensamento.

O problema é saber qual é esse pensamento. Depois de quatro dias de espera para o enterro, o corpo se foi, a idade ficou parada naquele corpo de 35 anos, mas esse pensamento desconhecido segue e o morto vive junto às justificativas das novas invasões e ao “confundido” primo paralítico. As manifestações apenas começaram e vem em caminhada acumulando outras vozes alteradas. Mas, a ingenuidade de quem está no poder é ensaiada com a nossa que pensamos: “finalmente a União agirá”. Fingindo não saber que a reunião só aconteceu depois da invasão indígena à sede do PT no Paraná. Foi totalmente sem pressão.


Vamos voltar ao pensamento coletivo que deduzimos ser respeito, o mínimo de condição de viver e o direito à terra como todos nós o temos, mas não somos todos tutelados... Os Terena recebem agora apoio de todos os índios que tiveram conhecimento de seu mais novo mártir, - além do Movimento Sem Terra (MST) e dos que assumiram ser indígenas e dos indignados e ... - ele uniu as tantas tribos desunidas. O índio percebeu a força que tem,rasgou o desafio da Justiça em forma de mandado e o transformou em um grito de guerra. O medo do colonizador voltou depois de mais de 500 anos e ainda não se sabe quem veio primeiro: a terra ou o índio...!? (Deve ter sido a política...!).

sábado, junho 08, 2013

(Miniconto) Bola do mundo


(Miniconto) Bola do mundo
por Rafael Belo

De um dia para o outro o mundo mudou. A bola que já mandava no mundo virou a bola do mundo. Os pés descalços foram calçados de chuteiras. Todos as vestiam. A pátria de chuteiras era literal. A bola era o mundo. A conclusão era lógica. Se o futebol movimentava mais de R$16 bilhões por ano só no Brasil e apenas em ano de Copa mais de R$ 183 bilhões, com o restante do planeta somavam mais de trilhões e trilhões, então decidiram pegar os dirigentes e agentes do time e jogadores da equipe mais rica do mundo e, bem, o mundo mudou.

Toda instituição tinha seus técnicos profissionais e faziam peneiras para campeonatos menores que valiam vagas para médios, que por sua vez premiava os melhores com lugares garantidos nas maiores competições. O ano todo e todos os dias eram jogos. Só a programação esportiva tinha espaço e ninguém lembrava mais como tudo havia começado e qual era a origem daquela votação contínua nos mesmos dirigentes do mundo.

Os leilões eram acompanhados desde o ventre. Quando nascia o garoto ou garota já recebia todo o uniforme que só aumentaria de tamanho ao longo dos anos. As pequenas, grande e médias almas eram vendidas quando bem seus agentes/empresários/pais quisessem e para quem desce o maior lance a qualquer momento durante qualquer competição. Desfalcavam times que desfalcavam times que desfalcavam times... Pessoas desapareciam como bola chutada para o mato...


Mas, como nenhuma bola é uma esfera perfeita. A bola murcha começou a ameaçar acontecer. Um belo dia a bola do mundo realmente murchou. A bola que era o mundo não entraria mais em campo (nem em quadra). Uma bola bomba inicial começou a explodir diversas bolas bombas por toda parte. A maior bomba bola ficava na parte central da sede dos dirigentes. Todo o mundo deixou de ser redondo e se fragmentou em diversos octágonos. A bola fria foi para o octógono. Era o fim da era do mundo da bola.

quinta-feira, junho 06, 2013

Água dobrada

Água dobrada



Pés descalços raspam o asfalto
chutam o vento e o futuro falso
no encalço das chuteiras distantes
chupam pedras nas favelas de onde não as há,

antes de brincar, diante da educação que insiste em ser má,

leiloa a fé para quem lhe der um pouco mais que pão,
clama atenção durante a tensão sincera de ser favela mesmo com mais de milhão,

mas erra quem pensa a favela ser social, é a situação desigual de ser formatado
sem olhar para qualquer lado, em direção ao dinheiro superestimado, dilatado nos olhos dos cegos que veem.


(às 20h29, Rafael Belo, quarta-feira, 5 de junho de 2013).

terça-feira, junho 04, 2013

Chuteiras milionárias e pés descalços

Chuteiras milionárias e pés descalços
por Rafael Belo

Gosto de futebol como a maioria do mundo. Gosto. Não sou fanático. Divirto-me. Torço. Pronto. Ponto. Acho “louvável” o investimento em escolas de futebol responsáveis por futuros "craques" padrões. Estas ajudam a desenvolver outras habilidades em nossa juventude para futuramente importarmos para outros clubes e exportamos para outros países. O velho novo sonho americano...

A maior movimentação monetária de exportação brasileira. Segundo a Fundação Getúlio Vargas, o Brasil "fatura" mais de R$ 16 bilhões por ano com o futebol. A exportação dos futebolistas no século XXI já  passou dos 440 milhões de dólares, tendo 30 milhões de praticantes, 800 clubes profissionais, 13 mil times e 11 mil jogadores federados. É a indústria do futebol e os craques vivendo da bola.

Que país é esse?! Começo a lembrar desta música principalmente, depois dos últimos filmes sobre Renato Russo e sua Legião Urbana, dos últimos versosquando vendermos todas as almas dos nossos índios em um leilão... Enquanto isso, os conflitos de demarcações de terra seguem e Mato Grosso do Sul está há uma semana nos noticiários sem ser confundido... Sem ninguém precisar jogar mapas e gritar Do SUL... Os leilões seguem e quem pagar mais tem mais razões e os direitos vendidos ou comprados. Quem dá mais?


É o negócio da vida é a vida dos negócios. E o amor por time de jogador acaba de (re)nascer desde criancinha junto com toda a família... Bom seria se cada chuteira milionária vestisse tantos pés descalços, investisse na própria educação - a validade da idade aumentou, mas ainda termina aos 40 - e depois na educação casada com as incontáveis escolinhas de futebol. Então a pátria poderá continuar de chuteiras, mas terá um lugar para viver e um diploma para começar a prosperar.

sábado, junho 01, 2013

(Miniconto) Borboletas mortas


(Miniconto) Borboletas mortas

por Rafael Belo
O corpo inteiro coçava e ele se sentia preso, ali naquele nó na voz. Aquele nó na garganta. Aquela ânsia aprisionada e tudo coçava. Sentia que vomitaria palavras e imagens guardadas na mente. Sua pele toda pinicava como se ao invés do ar o cercando e o afogando fosse um gramado com formigas nervosas e “picantes”. Suas energia e paciência esgotaram-se naquele nó. Lá.

Sua mente não estava lá. Ele só percebeu ao estacionar o carro. Era como se tivesse passado por todos os fusos do planeta e não só se adaptasse a cada um, mas os trouxesse dentro de si. Pegou sua maleta. Ligou o alarme, 200 metros depois ouviu o disparo. Não era um disparo qualquer. Era o primeiro disparo. Não daquele dia, mas desde que o havia instalado. Ressoou insistente. Voltou. Desligou. Olhou. Nada viu. No segundo já estava a mais de 700 metros. Deu a volta toda no carro. Abriu a porta. Tirou o som e o guardou no porta-luvas. Fechou a porta. Ligou o alarme. Esperou. Foi.

Durante o escândalo do terceiro disparo já estava do outro lado do estacionamento. Voltou. Examinou tudo. Portas. Bagageiro. Fiação... Satisfeito, fechou, ligou mais uma vez. Esperou mais. Foi-se. No meio do caminho retornou. Não houve nem pressentimento de disparo. Abriu a porta do carro novamente, levantou o banco do motorista e pegou seu principal instrumento de trabalho. Não se surpreendeu quando chegou ao andar de seu serviço e o viu destruído. Nada disse. Ficou em silêncio. ERA dia de silêncio.

De volta para casa, pensava no caminho sobre o tempo. Ainda ventava como há dias. Estava assim: muito forte. Não era só vento de poeira e chacoalhar das árvores... – Há mais. Eu sinto. É um aviso...!

 Algo sem proporções está por aí. Que vento faz oscilar as luzes, desertifica as ruas, chacoalha as árvores e esvazia as mentes. Distração... Uma chuva de vento, sem chuva, uma chuva de sons, sem chuva... Este vento está vivo... Estes sinais... Eu sinto algo inexplicável e é tão forte que eu sei.


As ruas estavam com um som estranho, levemente crocante. Misturado a um vazio apocalíptico. Olhando com atenção percebeu que não era asfalto por onde o carro trafegava... Eram incontáveis borboletas mortas. Nunca esteve tão distraído e com olhar fixado. Mesmo assim fez novo retorno – mas desta vez com o carro e os únicos avisos brilhavam dentro dos seus olhos. Acelerou ao máximo. Pesou o pé até doer.

Precisava encontrar sua esposa. O mundo não estava mudando. Estava mudado. Não era mais possível contar até dez e respirar. Só ele sabia... E as borboletas mortas.