sábado, novembro 30, 2013

Detalhes na frente (miniconto)



Detalhes na frente (miniconto)
por Rafael Belo

Depois de todas aquelas palavras bonitas, inspiradas, incentivando o caminho, ela caminhou. Cada letra proferida parecia ter cores únicas, vida própria e ela imaginou uma a uma em um desfile a homenageando. Aquele exercício mental se tornava realidade para ela. Não foi difícil convencê-la. Mesmo se não fosse um discurso bem elaborado, ela já estava disposta a ser enganada. Ela queria acreditar e acreditou. Foi e não precisou de muito tempo para perceber o engano e, pior, a idiotice de querer ser enganada, mas ela não pensou ser bem assim. Nunca é.

Era ironia pura. Sabe, aquela coisa de ser cheio e no fim ser vazio. Pelo menos ela imaginou... Enfeitou o pavão, se disfarçou de pavão e virou nitroglicerina. Uma bem ruinzinha. Contrabandeada. Pirata. Estourou na primeira oportunidade. Logo no primeiro passo correto, se viu em um paradoxo e, talvez, somente talvez, ela mesma fosse este paradoxo. Parecia uma auto ofensa. Uma zombaria ou, como a moda dita, bullying. Não era mais ironia. Era sarcasmo. O mais puro dele. Começava a doer. Ainda mais naquele lugar. O caminho que a preencheu e no caminhar era vazio.

Se for olhar pelos passos dela, o caminhar não era importante. Era frustrante e dolorido. Não adiantava dizer ser esta a importância, este o crescimento. Não era assim que se sentia e ponto. Estava solitária, silenciosa, desiludida. O caminho era uma coisa sua imaginação era outra. Não havia exercício mental, discurso elaborado, diálogos sem nexo, nenhum convencimento. Só engano e pequenas mortes. Ela morria um pouco de cada vez. Seu maior desespero era o silêncio. Não poder gritar. Não conseguir elabora um pensamento inteiro antes deste se desfazer sem nenhum som imaginado sequer...

Seu caminho enganado por vontade, seu caminhar enganando agora contrariado. Seu paradoxo naquela única via indo em todas as direções. Porém, uma imensidão de nada. De não sentimento. Sem movimento. Tão pesada que a gravidade parecia outra. Suas palavras não articulavam nem ao menos grunhiam som algo. Era mais tarde do que ela poderia imaginar, “se” pudesse imaginar, pensar, se punir, se convencer, enxergar mais neste caminho, tantas sombras e esbarrões, era o silêncio seu sofrimento porque não sabia o significado.


Para ela era tudo um ledo engano, mas até começar a perceber como entender algo de novo, como sentir sem se enganar com cada coisa ou como absorver o seu redor, era um grande resumo de sofrer. Só faltava saber o sentido das palavras e do próprio sentido. Ela não era ela mesma. Era outra coisa. Sempre foi.

quinta-feira, novembro 28, 2013

Mais tarde



Mais tarde

No disparar das palavras sobrou um ponto, faltou uma vírgula

ambas entaladas, na calada da garganta, no enrolar da língua



uma concluída a outra perdida no entendimento,

nas reticências do vazio argumento, era engano, uma íngua



fala toda camuflava na leveza do propano,



esperando para explodir na primeira faísca das provocações,



dispostas nas públicas exposições, alguma farsa, debaixo do pano,

onde a falácia disfarça e cheia de graça



forja um conteúdo, insere umas aspas, promove a hierarquia

para ter de explicar se era verdade, tarde, o marasmo do sarcasmo ou ironia.

(às 12h14, Rafael Belo, quarta-feira, 27 de novembro de 2013)

terça-feira, novembro 26, 2013

Ledo engano

Ledo engano
por Rafael Belo

Conversar. Trocar ideias. Manter um diálogo. Interagir... Está aí! A interação, mesmo que virtual, carece de argumentos e de entendimento. Aliás, do medo de não ser entendido e da falta de argumentação. Tanto a ponto de hoje ironia e sarcasmo terem um acréscimo que podemos chamar de por via das dúvidas. Um hashtag explicando o tão badalado e nunca antes da história mundial visto nesta proporção #sqn (só que não). Explicar a diferença entre ironia e sarcasmo então requer sutileza e eis outra em descrédito. Há um descontrole latente e corrosivo nos espaços que separam as pessoas e uma imensa confusão entre falar e calar.

O ser humano sempre teve um imenso medo de ser incompreendido, injustiçado... E a falta de diálogo, junto com as interpretações corretas, está em desuso pelo menos da forma usual. Há mais uma batalha vazia e desesperada em busca de ser ouvido e absorvido. Um nadar de costas no oceano revolto e repleto de todos os monstros mitológicos e infantis para convencer as pessoas do seu ponto de vista ser o melhor. Uma disputa pela razão sem razão alguma. Provocações para quem não possui paciência e o conhecimento de não possuí-la e mesmo assim aceitá-las partindo para a exposição pública.

Gosto tanto de trocar ideias, de manter diálogos (do grego diálogos que resumidamente significa entendimento através da palavra entre duas ou mais pessoas), esta passagem, este movimento, esta boa vontade de compreensão recíproca, principalmente quando são pontos de vistas diferentes, contraditórios, aumenta a dimensão do que se é falado, o respeito. Anima minha alma ouvir e falar sobre qualquer assunto que se desenvolva em muitos argumentos de caminhos trilhados e possíveis de se trilhar. Esta possibilidade de se colocar no lugar do outro, de olhar nos olhos, de rir e testar o calor humano.

Porém, o que vemos é um constante tribunal armado em tendas onde o constante julgado/júri/juiz é o detentor da fala e o restante seus ouvintes. Não importa a incoerência, os erros, o contexto, a pontuação e, às vezes, nem o assunto. Então a retória é enorme, mas seu conteúdo ínfimo e quase inexistente acabando em falácia. Uma parte desta é paralogismo, (aquela sem intenção de enganar), mas a maioria é sofismo (produzidas para confundir dentro de uma discussão). Aliás, falácia é um raciocínio errado que parece verdadeiro, mas não tem fundamento nem argumento ou validade, portanto não prova de maneira eficaz o que alega. A palavra vem do latim fallere e significa – adivinha só - enganar. Pode-se concluir, então, que não dialogamos, nos enganamos ou fingimos ser enganados.

sábado, novembro 23, 2013

O Sol sempre está lá (miniconto)



O Sol sempre está lá (miniconto)
por Rafael Belo

Ela estava aprisionada. Não que lembrasse o motivo, mas desde que descobriu sua consciência, sempre se sentiu assim. Nunca conseguiu abrir os olhos, ou eles estavam semiabertos ou fechados em casa. Nem por isso deixaria de passar seu lápis preto e sua sombra azul céu, não que importasse, mas importava. Mesmo estando presa, assim, na política das pessoas, à toas sem saber. Até sem querer. Sempre sentiu grades por toda parte, a direcionando e espionando da mesma forma que sabia, que mesmo escuro e nublado seu céu de mais de duas décadas – era o que admitia pelos menos na última década -, o sol sempre está lá.

Por toda parte ela enxergava tendas. Não qualquer uma. As circenses. Da mesma forma que Cole Sear (Haley Joel Osment) via gente morta no filme O Sexto Sentido, daquele jeito, o tempo todo. Mas, às vezes, se sentia mais Malcom Crowe (Bruce Willis), o psicólogo infantil. De vez em quando por não saber seguir, simplesmente por desconhecer ter de dar este passo. E outras... Era por tratar com crianças de todas as idades, principalmente com mais de 20 e 30, até com mais frequência que via os circos. As atrações quando não eram superficiais, não eram entendidas, mas estavam constantemente pedindo comida.

No entanto, ela permanecia em silêncio. Se conhecia a tal paciência nunca confessaria, nem sob as piores torturas. Já ficava empertigada pelos falsos argumentos, aqueles sem argumento algum. Se irritava, mas permanecia do seu jeito e em seu lugar. De olhos semiabertos ou fechados em casa. Gostava de se manter no direito de não comentar. Tinha certeza que se comentasse teria os mais preguiçosos que diriam pensar/sentir exatamente o que foi escrito por ela. Como se fosse possível... Enfim, discussões para ela eram “perda total”.  Porque a República não é, afinal, fruto de atos egoístas, atropelados e de distorções filosóficas?


Não. Nada de Ditadura, Comunismo, Anarquismo, Fascismo, Religiosismo, Monarquia... O que quer que fosse ou seja, tinha de partir da maioria. O Brasil? Nem se formatassem, reiniciassem e incluíssem um HD externo de 1 tera. Então, veio a primeira chuva no meio daqueles prisioneiros, os pensamentos silenciosos, os sentimentos em braile que não se expressavam aos olhos, só para quem tocasse. Ela se molhou muito antes de perceber estar chovendo e ela encharcada.

Então, no alcance do horizonte um arroxear escapou do escuro cinza. Logo estava cercado de várias tonalidades de seu roxo e um dourado divino, precioso, encantador e envolta um azul clarinho. Tudo fazendo de árvores sombras iguais a pessoas. Um espetáculo do sol, sempre lá. Absorvida ela parecia estar mudando a ideia sobre o Brasil, enquanto feito uma gigante acordada por mais de duas décadas – ou a verdadeira idade dela – adormecia, anestesiada pela paisagem pela primeira vez. 

quinta-feira, novembro 21, 2013

Que dia é hoje?





Que dia é hoje?


Acordado, mas em estado anestesiado,
em uma prisão de gente, política sem querer,
estar com um gigante devorado
por uma faminta fome de ser

além de bonecos inanimados do poder

brincando de ser e não ser, em qualquer adaptação
na simulação do pão e circo onde a questão é onde estes estão

maníacas vitimas nas manias de julgadores e o avesso tão

olhado como os molhados que não queriam se molhar na chuva

com os olhos semiabertos e as grades caseiras, o povo pouco muda, o país então...
segue amarrado nas mordaças desta liberdade de prisão.

(Rafael Belo, quarta-feira, 20 de novembro de 2013)