sexta-feira, setembro 25, 2020

Canção Íntima (miniconto)

 










por Rafael Belo


Aos gritos parei o trânsito na manhã. O fluxo de buzinas esperado não aconteceu. Não me xingaram. Não me cantaram. Desviavam apenas… Eu não falava após os gritos. Só olhava para as galerias fluviais abaixo de nós. Aquelas águas fluindo esquecidas debaixo da cidade. Apesar de toda a poluição sonora, eu ouvia e ainda ouço aquela correnteza.


Ela me chamava. As águas me chamavam. Só de olhar eu corria com ela. Só de olhar eu estava totalmente imersa nas águas correntes. Minhas correntes foram arrebentadas. Saí do estado hipnótico da rotina cansativa de acordar se matar de trabalhar dormir e entre isso pagar contas, arrumar uma forma de esquecer, usar sujar lavar roupas e repetir, repetir, repetir…


Quando percebi a leveza da gratidão, voei e neste instante sigo mergulhada nas galerias das águas que me limpam e me lavam até a alma. Aqui, imersa, me sinto imensidão porque se dizer imensa começo uma dieta no instante seguinte… Enfim me sinto O Todo e me espalho sem parar. Não há palavras para ouvidos absorverem, todo o diálogo vem do coração com a alma. Ninguém pergunta nada.


Em alto e bom som o silêncio despolui a cidade, despolui as pessoas... Eu sou instrumento deste Som do Coração. Uma Canção Íntima particular de cada um. Única. Nesta constante imersão sou um convite vivo. Todos são quando sãos ou na consciência da loucura constatada pela ciência por acreditar no que olhos sem fé, sem Amor derivado do Philautia (por nós mesmos), além do Pragma (dedicação ao bem maior), diferente do Ludus (por diversão, por prazer), superado do Eros (romance, paixão e desejo), consegue ser maior que Philia (por irmãos e amigos) e avançado do Storge (incondicional para pais e filhos). É o Ágape (incondicional para todos os seres vivos com conexão com a natureza, a humanidade e Deus) manifestado em nós, testemunhas de Renascimentos.

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