sábado, agosto 29, 2009

Gestação de pregnâncias

(uma pequena maravilha no meio da grama do lado de uma barragem tirei)

Impregnado lugar de ceifa
Ceifados olhares parados em plenos movimentos
através do olhado estagnado em um ponto não visto
revisto dos incontáveis déjà vu enfileirados
nas plumas pombas revoando as ideias repensadas

Pensamentos cheiram a sensação daquele lugar
deitado em um imenso espaço desproporcional, medido
não estou lá, pois, lá está aqui me impregnando
de acessos aos tempos mentais sem números
me referindo referências dos meus acúmulos, limpos de pó

deixe minha poeira me revelar
revelação de coisa alguma
a não ser de mim mesmo
como era ao nascer luz
sem posição fetal

toda as cores
dos mundos

todos os cheiros
dos infinitos partos.

Folha de Outono (Rafael Belo) às 12h52, 16 de agosto de 2009.

quinta-feira, agosto 27, 2009

Conversas com a Lua


(Um presente já entregue para uma aniversariante deste dia 28)
por Rafael Belo

Vestia um sorriso sobre suas vergonhas, uma ansiedade desproporcional, certa inquietação, muita emoção e claro dúvidas-dúvidas-dúvidas. JS16 não ia completar 17 e ainda está no fim dos 15. Contando os dias os via lentos, até arrastados. Dormia pouco ou demais, sem meio termo. Certo era sua conectividade. Queria alguém para ser seu, outra certeza. Fiel, amiga, mas vira e mexe a emoção tomava conta à “ajudando” a cometer os repetidos erros. O que nem sempre era ruim, mas dava aquela sensação de cachorro correndo atrás do próprio rabo. Subestimava-se.

Com seu mundo caindo e levantando quando menos esperava era uma das poucas adolescentes da raiz da palavra. Sua mentalidade extrapolava, às vezes, até as mais vividas. Meiga. Esta era a qualidade principal para a lua se interessar por ela. Conversando por troca de luares, assim que o sol se decompunha com horizonte. Momento esperado por ambas. Olho para a lua e sinto que ela me diz ser eu enluarada a brilhar luar sereno para ela, mas como seria possível?

Que inocência brilhante, pensava a Lua, a enxergar um sorriso puro despido e os desejos, de JS16. Esta de costas na cama sentia seus desejos realizados, sonhava. Minha liberdade eu quero – mal sabendo a poder conquistar mais e mais perante os pais e o mundo. “Chorona”, disse para o vazio do quarto com as luzes laranjadas das janelas do MSN. Chorar fácil era muito bom, mas desconhecia. Lágrimas eram fortalezas erguidas e não fraqueza demonstrada.

O quê virá? Interrogava perante sua delicadeza e educação. Sua simpatia, beleza e inteligência rogaram rubores. Errar é tão bom quanto acertar, iria pensar. Estava no Biquíni Cavadão: “ ...Quanto tempo será que demora, um mês pra passar?...”. Quero me sentir livre. A Lua se encheu. Cheia respondia: “Você e acha incompreendida e acaba se explicando demais, mas no fundo sabe não ser bem assim. Sabe que não consegue disfarçar seus pensamentos e sentimentos, a dominavam”. Descobrira ser bom, nada se controla de fato na vida e podemos nos preparar se ansiedade.

A Lua e o frio leve, a viram. A acompanharam. Descalça, de preto básico e jeans corria a noite pelo impulso. Gritou de alívio. Quantas não queriam ser impulsivas... Sorriu sua sorte e pairou seu luar e sereno.

segunda-feira, agosto 24, 2009

“De novo”


(Viagens sul-mato-grossenses o retorno, tirei co mvárias intenções)


não há bom dia – nem cumprimentos
qualquer aceno é censurável
um sorriso daqui
uma dúvida de lá
as ruas são antisociais

pessoas nuas, existem mais
estão
tão vestidas
revestidas dos seus próprios mandamentos
inseridas, em seu mau comportamento

se olham –fingem que não
se olhadas – quando não ofendidas- abrem um buraco no chão
possuem todos os dedos –ou nenhum
no meio termo podiam ser incomuns
mas há tantos a seguir – que em seguida são mais um.

Folha de Outono (Rafael Belo), às 13h49, 17 de julho de 2009.

sexta-feira, agosto 21, 2009

O Filho de Murphy


(quintal, era uns dos milhares da minha falecida vózinha)
Por Rafael Belo

Ele acordou, como costuma fazer depois de dormir, sempre irritado por ter de levantar, sair do quentinho e do breu gostoso do próprio quarto -ou de um quarto qualquer. Já que vive de aluguel e de favores. Sentia algo estranho e pensou não ser nada anormal. Ledo engano. Dário Impossível logo descobriria sons desconcertantes saindo da própria boca. Mas, por enquanto estava calado e com gosto amargo da fome. Ainda não abrira a boca sequer para bocejar o sono ainda trajado de amassos.

De repente o acúmulo de bocejos evidentes pelos olhos lacrimejados e de-o-quê-estou-fazendo-acordado foi mais forte e um forte múúúúúúu ressoou na cozinha vazia. Blam e caimcaimcaimcaimcaim seguidos de um longuíssimo e assustado méééééééé vieram do chão. Assim, aos sair do primeiro som, Impossível tomou o maior susto da vida antes de tomar o copo de leite, se jogando para trás e despencando de costas no chão de madeira. Eles emitia todos aqueles sons? Desde quando se tornara poliglota animal?

Sem resposta passou a língua nos lábios que silvou tssssssss e ele pulou do chão para a mesa que quebrou uma das pernas e o jogou no chão a emitir guturais uuuuuuuaaaaauuuuaaaaaa. Ele lembrou de Tarzan, mas ele não era rei de nada nem de bosta. Não era órfão ou Mogli. Não era viajado nem conhecido. Era um puta de um anônimo, mas não rodava bolsinha na esquina muito menos impedia que rodassem. Mas, seu cérebro Neandertal coçador de saco, impossivelmente processava alguma resolução. Não, processava mesmo era a causa de tudo. Pensou algo ao som da noite uuu uuu uuu. Corujão plena manhã.

Então, piou muito e soltou trrruuubrrruu e já que estava nessa relinchou. Pegou sua bolinha favorita de trinta anos e ficou jogando pra cima ronronando, rindo feito hiena da sua cômica tragédia.começou a rosnar e realmente teve vontade de morder o próprio rabo imbecil. E ficou rodando sobre o próprio eixo. Animal! Vivia como um animal auaauaua. Vivia agredindo verbalmente os outros com coices e patadas. Tirando vantagem das carcaças da vida, feito urubu reinando na falida procriação dos seus genes. Pensava voar alta feito a livre águia quiáquiáa, mas era mais para um roarrrrrr, um leão sem bando. Abandonado feito um gatinho indefeso de um circo malcriado, sem garras nem juba.

Após balir e uivar ao mesmo tempo. Pensou ser filho de Gérson, mas não, era filho de um bom macaco. E uiiii feito um porco aproveitou a lavagem e pensou bem ruminante: vou tirar vantagem de tudo isso. Em um quase coito saiu galopando para avisar alguém da sua vantagem animal. Quem convive com animais selvagensenfurecidos? Abandonado ele deveria ir para adoção – mas quem quereria? Ele não sabia ser na verdade filho de Murphy e de uma camisinha furada e daquelas mudanças que você sempre deixa e/ou esquece um cachorro pra trás. Só que ele era o cachorro.

quarta-feira, agosto 19, 2009

“Antes”


(mais uma que tirei do ex quintal)

pensava a afastar do coração
a tendo distante do pensamento
mas em nenhum momento, ela me deixou
não sei se era amizade ou amor

falta em mim, ela
está na minha mente, subconsciente
de sonho em sonho a me despertar
amanheço com ela
ela não está

vi seu ventre me acolher
acarinhar-me com ternura
era sempre, eu, a massagear lhe por inteiro
suas lágrimas me abraçavam
o coração pensava- o pensamento batia

a gente se conhecia
de tempos atrás
antes do conhecer.

Folha de Outono (Rafael Belo), às 13h36, 17 de julho de 2009.

segunda-feira, agosto 17, 2009

“Simples motivo”


(já subi nesta, mas esta foi dos primeiros dias de facul abaixo da antena torre, que já me transmitiu)

por Rafael Belo

Estava estranho. Me sentia recém parido. Das entranhas da luz. Mas, estava escuro fora do ventre. Era dia feito. Crescido com todo biotônico solar de uma preocupada infância. As vozes encorpadas nas rua, os insistentes latidos dos cachorros vizinhos, os carros sempre atrasados seguidos de buzinas e freadas impacientes, mas faltava alguma coisa.

Fiquei no escuro e no som dos instrumentos de músicas clássicas até o escuro se estender para as ruas ainda agitadas. Tinha certeza de algum mal-estar e me inibi de me movimentar. Nada de comida, nada de cochilo, nada de banheiro, nada das necessidades ao necessárias agora ao meu corpo. Meu castigo minhas chibatadas por não decodificar meu sentimento enrolado no pescoço.

Aquele piano frenético viria a me irritar. Muitas notas por segundo. O telefone chamou até cansar. Depois um celular e então o outro. Batiam palmas lá distantes na calçada. Batiam no portão. Bateram na porta. Chamaram meu nome. Meu nome foi gasto até acabar. O silêncio substituiu a insistência exceto pelos carros ainda velozes e cheios de buzinas no asfalto.

Do meu espaço pacífico e estanho vinha espaços de irritações contorções faciais a cada bagageira “incomodação. Seria necessário “o quê” para dize mais “não estou aqui.”Isto não bastava. Substituível feito tudo - menos o sentimento - e não há problema algum. Não existe insuficiência de presença, pois de alguma forma sempre estamos.

“Hoje era meu dia de sombra”. Repetia meu novo mantra. Mais ainda havia o estranhamento me mordendo. Mordia minha boca, minhas mãos, minhas pernas e meus pés até começar de novo e de novo... Ficavam marcas invisíveis a arder e queimar se espalhando pela minha corrente sanguínea para um, um grito enlouquecedor. Típico desabafo. A pergunta era: “O quê está abafado, afinal?”.

Ensaiava meu olhar vazio e o atuava pelos cômodos mais escuros e cheios de sombras, agora. Já me permitia sair do castigo, me movimentar livremente. “Por que então estava tão preso, tão pesado?”. Mudei a tática. Fui me esvaziando pele por pele, pensamento por pensamento, respiração por respiração... Senti um bom vazio me inflar no sopro de um ar quente imperceptível.

Estava estranho simplesmente pela primeira lembrança de estar de férias!

domingo, agosto 16, 2009

Balada minha


(tirei a bombordo de uma balsa)

Gaiola sempre aberta
do som do periquito
apitando os perigos da proximidade
de um verde amarelo avermelhado saboreando desconfiança
nas bagunças de uma casa de coisas

mãe e pai órfãos de lugar, perante a tevê
nada se vê, tudo se imagina
na cisma das imagens, captarem o medo
atiçarem, atos covardes
transmitidos na seriedade de uma visão

então, a ação e proteção
mesmo por uma ligação
maternidade e paternidade, terminam não
quem dirá filiação
a gaiola não tem grades

lá fora tem mais jeitinho de prisão.

Folha de Outono (Rafael Belo), às 19h18, 16 de julho de 2009.

sábado, agosto 15, 2009

A imagem da palavra


(tirei esta no quintal da ex-casa)

Não a via há dez anos
Não tinha meus números profanos que ninguém fez
Mesmo assim ligou
Feliz ou algo havia- contando coisas pelo nariz
Infortúnios da beleza

Havia destreza e intimidade
Porém, poucas palavras troquei com ela
Uma das mais belas daquela cidade sem importunidades

Olhei pro teto
Depois do sonhei

Era o sonhar da confiança
Aos meus íntimos
E aos outros
Recuperei minhas palavras viciadas
Palavras perdidas de um sonho.

Folha de Outono (Rafael Belo), às 18h58, 16 de julho de 2009.

quinta-feira, agosto 13, 2009

Pescador de atenção

(tirei nas margens do paraguai, só que este não mente só quer peixe)
por Rafael Belo

Às vezes -quando escuto histórias – atento meus ouvidos públicos e presto muita atenção. Quando a conversa é entre homens ou de um homem para uma mulher, lembro de Cazuza e sua menor “Menor Abandonado”: “Mentiras sinceras me interessam, me interessam”. Não pelo fato da mentira em si e seus artifícios de vantagem, mas pela sinceridade da forma contada. Por acreditarem na “contação” e no acreditar do ouvinte. É um pescador de atenção. Mas, não me peça para acreditar.

Tais mentiras desimportantes são conhecidas, pois nas histórias com finais morais quando esta pessoa diz a verdade, não há quem acredite. Mentiras inocentes viram vícios de alguns. Elegem muitos - mitos – e deixam de ser inocentes. Tomam proporções quase impossíveis de desmentir, uma vida de mentiras.

É como fingir de morto perante a vida e rolar – dizendo ser espasmos da morte. Detesto mentiras e me afasto de mentirosos. Funciona nas primeiras vezes e se acaba patológico ou meramente compulsivo dificilmente não se percebe é como uma Winona das palavras, um cleptomaníaco do palavreado.há um ditado sobre os ases da mentira: os poderes norte-americanos . Diz: “George Washington não conseguiria dizer uma mentira, Richard Nixon não conseguiria dizer uma verdade e Ronald Reagan não saberia diferenciá-las”.

Não diria faltar malícia para diferenciar ou sobrá-la para desconfiar de tudo. Nem haver inocência incapaz de identificar. Apenas acredito ser um vício. VOCÊ experimentou, te fez um mal – como me faz (não é uma confissão), você só volta a fazer se for um sádico ou sadomasoquista. Gostou do poder de dissuadir e enganar – Virou viciado. Manipular realidade e fantasia não me faz me sentir um mentiroso penso ser um entretenimento e um sabor coletivo. Mentir é uma fuga, um disfarce ou entretenimento pessoal com aquela palavrinha amarga: egoísta.

quarta-feira, agosto 12, 2009

Desnome

(tirei estas nas viagens sul-mato-grossenses)

Coisas ruins gostam de vir em sucessões
só se sucedem
para depois virem boas
boas coisas, são apenas mais um ponto de vista
como, unicamente, penas
não serem a razão de voar

mas muitos voam, imprudentes
dentes pra fora e ausentes
iniciantes e experientes
esperando a ruindade passar
sem, às vezes, nem pensar

em agir diferente
bondosamente ou por bondade
fica a vontade de escolher a semântica
pois coisas são algo qualquer – que não queremos nomear.

Folha de Outono (Rafael Belo), às 18h43, 16 de julho de 2009.

terça-feira, agosto 11, 2009

Sentidos

(não sei onde tirei esta -risos- da torre antena)


Quando alguém está escondido
nem adianta procurar
provavelmente nem saber estar
encolhido em algum palco em si
desaparecido de qualquer outro lugar

atuando uma imagem favorecida
conforme com quem conversar
em algum lugar esqueci
sinceramente ser
um banquinho e o escuro

você pode me dizer quem é
aquele diz quem sou

misturo o segredar liquidificador, junto com uma dor
bebida insana da saliva
escondida na plateia.

Folha de Outono (Rafael Belo), às 18h29, 16 de julho de 2009.

sexta-feira, agosto 07, 2009

Merecimento

(tirei lá naquele reduto)

por Rafael Belo

“Os que merecem ser atendidos”. Ouvi de uma médica. Há algum cúmulo maior!? E o desespero e autoisolamento de quem está “infectado” com a gripe suína. A H1N1. Morreram algumas dezenas e a vacina só será produzida no Brasil no próximo ano. Claro, se ela pode esperar até o início das aulas por que não mais um ano! E como a Déia disse é “gripe escolar...” Porque de resto ela é antisocial. Milhares de casos registrados. Foi rápida a saída de uma epidemia para uma pandemia, gerando pandemônios. Há relatos do não atendimento de suspeito da influenza. O digníssimo secretário de Ciências, Tecnologia e Insumos estratégicos do Ministério da Saúde, Reinaldo Guimarães, diz estar preparando parar “combater uma ‘eventual segunda onda’ da pandemia do Brasil, prevista pelo ministério para o próximo inverno, relata ainda a pesaridade deste problema grave, mas a vacina não servirá agora.”

Certo mesmo é tudo isso ter cara de endemia. Por quê a lentidão da vacina, vamos esperar um ano e quantas mortes mais? Espero nenhuma... Com tantas más abordagens como ficamos!? Desespero nunca adianta. Não há vacina contra a ignorância e conhecimento demais se saturado. Merecimento!? Chocante!?Qual o critério de “merecer” ser atendindo?! É um absurdo! “Isto é uma vergonha”, esbraveja enraivecido Boris Casoy. Se você estiver com febre-dor-de-cabeça será atendido depois – e olhe lá- de quem estive com febre-dor-de-cabeça-vomitos.Passe bem!(?).

quinta-feira, agosto 06, 2009

Tonicidade


(subindo as escadarias, tirei na torre dos sinos)

As coisas se moviam pelo ar
diante de atônitos olhos inquietos
nenhuma o acertou, boquiaberto

mas, ela os atirava em revolta
sem mira. Só objetos e palavras

veio de uma volta corriqueira

até com o gato preto que voava
cada qual se espatifava

feita a supertição da promessa quebrada
Quando foi – porque disse que ia.
Mas voltava – porque não aguentava

ele se movia pelo ar
nas coisas que o aquecia

não queria ser mai um par
mas um par queria

ambos olhares se encharcaram

o mover era atônito e inquieto.

Folha de Outono (Rafael Belo), às 17h08, 16 de julho de 2009.

quarta-feira, agosto 05, 2009

A existência


(O reflexo da cidade no meu olhar, tirei na torre dos sinos)

Com um beijo partiu da vida
Desta para jamais
voltar àquela idade

sonhava ser seu sonho
nã queria ser mais criança, não era

foi fuga ferida
só com atitude romântica, infantil

depois dos lábios molhados
colado a outra boca
não era mais do mesmo

da mesmice rstava o olhar,
mas mais apaixonado

tarde dormiu ao gosto do sabor do beijo
cedo cedeu seu novo eu

ao provar único sentimento
procurado por toda existência

Um beijo em essência.

Folha de Outono (Rafael Belo), às 16h42, 16 de julho de 2009.

terça-feira, agosto 04, 2009

Um nó


(Pelas ruas de CG, tirei perto da casa da minha vó)

Há dentro de nós certa mentira
a dizer nossa falta de se envolver
Mais ao fundo, há certa verdade em nós
sempre nos envolvendo

Somos um nó de questionamentos

Desatar em entrega,
é um arrepio inconsequente no abismo do estômago

Então, há aquela canção trilhando momentos como este
nos levando ao longe, distante desembaraçar

no nosso desembaraço sorrimos
do nosso ridículo particular

Rimos por não nos atrever, atrevidos
a querer equilibrar as coisas


rimar apenas por versos de felizes finais iguais

Quero desequilibrar hoje
Cair, quebrar, não procurar nem ceder explicação

Chega de nós.


Folha de Outono (Rafael Belo), às 19h19, 13 de julho de 2009.

domingo, agosto 02, 2009

Procissão da madrugada

(Tirei esta ainda na facul-testando a máquina)

Por Rafael Belo

Não havia nada de especial neste dia, como há muito não havia na minha vida. Com o péssimo hábito gostoso de caminhar durante, um pouco antes, da quarta parte do dia: a madrugada. Estava eu chutando estrelas quando senti a umidade no ar e o frio (estávamos em uma época incrivelmente seca). Há alguns passos de mim a chuva mansamente me espreitava. Olhei devagar na direção contrária das gotas. Estava vazio feito uma casa abandonada às pressas. E toda aquela água me fazendo charco e um rio vertical, me preenchia enquanto a noite se transformava em madrugada.

Foi um tempo interminável me fazendo ajoelhar. Me sentia uma nascente. Uma divisa solitária do nada ao tudo. Aquela chuva. Aquela chuva era o retorno da minha alma perdida? Não mais! Desde minha mais senil lembrança me fadei ao fracasso, desistindo e não terminando nenhuma das atividades iniciadas. Não me esforçava! Era um corpo sem força. Nasci, adulto, no meio de barracos, remendando casas, orfão. Era filho do mundo. As pessoas não me enxergavam. Nenhum pertence -jamais. Só estes pés no chão e esta roupa, antiquada, doada.

Ouvi meu nome várias vezes, mas como era possível entender?”... Paudro... Paudro... Paudro...” Uma voz ecoada tão arrastada, como deveria ser a da morte. Tão nitidamente com a chuva escorrendo dos meus ouvidos e desabando, como? Meu corpo pesado era uma multidão enfurecida para minhas pernas fortes, acostumadas a inclinações e declives absurdos. Mais forte era o chamado sombrio do dobrar da esquina. Caminhei de joelhos até ela. Ao chegar e enxergar o cruzamento, subia uma neblina do chão, mas conseguia ver claramente incontáveis costas. Meus olhos ficaram quentes e contrastavam quentura no rosto, em sincronia com o arrepiar da pele e de todos os pêlos molhados.

Só então comecei a tremer. Era tanto tremor que eu parecia secar em meio a tempestade inclemente. Queria correr. Não gostava de encontrar ninguém! A estas horas desgostava intensamente. Por isso saía do buraco da ponte -onde me escondia- apenas à noite. Mas, o meu maior temor nao era este encontro, era eu me sentir parte daquele acúmulo. Do quê? Pessoas? Não me pareciam ter vida...! “Venha!” O chamado -agora entendia- vinha direto a minha cabeça!

No primeiro passo, daquelas incontáveis costas, preenchendo todo o espaço visível, estava em pé. Caminhava convicto atrás daquela procissão –que me esperava. Pareço ter fugido ao nascer, mas nunca vivi de fato.