quinta-feira, outubro 31, 2013

Algemado a própria



Algemado a própria

Fico pensando nas palavras se formando imagens no pensamento,
virando um filme ao vivo, mas não um reality show
não tem nada programado no pensamento que se propagou, às vezes ele é concreto e todas as outras abstrato
o trato é não se acorrentar ao futuro arrastando as prisões do passado, pois por este tempo, é fato, o presente não existe
assiste, estagnado, os animais dominando os atos, na revolução dos fetiches
meu palpite... É que pensamos tanto, falamos todos, mas agimos aos poucos
com o descaso no qual o mundo nos digere, pois a ele somos indiferentes igual
sei lá qual for o carro que dirige, o que o aflige é por tudo aquilo não passado
pois de qualquer maneira, está algemado a sua própria pasmaceira.

(às 11h55, Rafael Belo, quarta-feira, 30 de outubro de 2013).

terça-feira, outubro 29, 2013

Fico Pensando...


Fico Pensando...

por Rafael Belo


Fico pensando em como é possível se contentar com a estagnação, a paradeira. Trabalhar sem a possibilidade de evoluir, sem a perspectiva de melhorar... Viver sem contribuir de forma alguma com a vida. Está aí algo que me irrita. Uma rotina onde é tudo redondinho e igual dia após dia. Como não absorver, compartilhar, transformar...? É como se contássemos mentiras diárias para nós e cada mentira adiasse ser quem somos. Gradualmente a irritação aumenta, se transforma em raiva, ódio, fúria e toda a ira nos curva pendendo nosso corpo para o chão.

Ainda fico então pensando se importa o tamanho da corrupção. Maior ou menor, não muda. Porque é claro que nos corrompemos. Vamos nos corrompendo aos pouco. Mais uma vez fingimos não ver e sentir na nossa maniqueísta versão de o que os olhos não veem o coração não sente. Falar e ouvir continua sendo um arremedo da nossa verdade. Falamos muito e mais besteira ainda. Ouvimos pouco e quase ensurdecemos. Aí falamos de carreira e salário para no fim preferirmos a suposta imagem da profissão.

Toda esta paradeira e mesmice fica martelando enquanto fico pensando no tempo desperdiçado para agradar, para continuar ao invés de seguir. Porque continuar é ficar girando em círculos, embaralhar todos os pensamentos e misturar qualquer decisão que poderia ser tomada. Seguir é usar outra pontuação da nossa Língua Portuguesa. Substituir as reticências, deslocar as vírgulas e utilizar os pontos finais. Ah, há tantos finais. Cada um disfarçado de prolongamentos como aqueles filmes considerados bons que pelo sucesso do primeira emendam uma continuação péssima.

Portanto, não adianta ficar no fico pensando... Ficar. Pensar. É bom, mas é uma etapa. Uma prévia para ir e agir. Protelar, adiar, cria uma ilusão de agrilhoamento, várias correntes cheias de bolas de metais, com a vestimenta obrigatória das listras intercaladas em preto e branco nos aprisionando na nossa própria covardia de arriscar. Com isso a morte vem todo dia de uma maneira mais pavorosa. O medo de provar sua inutilidade faz a tecla ser tão batida que já não tem nada a identificá-la. A pasmaceira toma conta e se não quisermos apodrecer devemos podar partes de nós mesmo para novas flores nascerem e deixarem nosso perfume.

sábado, outubro 26, 2013

Pequeno córrego (miniconto)


Pequeno córrego (miniconto)

por Rafael Belo

Todos que podiam ver paravam alguns instantes para olhar. Depois esfregavam os olhos, balançavam a cabeça e, se tivessem tomando algum remédio, certamente estavam pensando se exageraram na dose ou se esqueceram de tomá-lo. Seguiam olhando para trás várias vezes e, então, decidiam ser tudo uma alucinação, um delírio por causa de tantos sóis particulares. Como está calor! Justamente por estar tão quente ele derretia. Não metaforicamente. Sua pele..., Melhor dizendo, suas peles escorriam e formavam um pequeno córrego onde antes era apenas chão.

Nenhum pensamento se mantinha na mente dele. Era como se ele tivesse mil olhos e se visse impotente se desfazendo. Assim, era difícil formar qualquer tipo de raciocínio. Ele via o predador sendo presa a presa sendo predador e sentia sua sanidade escorrer também. Ele era ambos o tempo todo. Construía com uma mão enquanto a outra derramava todo líquido inflamável disponível e de repente ateava fogo. Deixava toda luz entrar pelo seu teto de vidro e simultaneamente arremessava pedras.

Tanta destruição provocava o tsunami do efeito dominó. Quem se aproximava caia desde sempre. Pelo menos nas lembranças carcomidas desta mente sem recordações. Um brilho eterno eclodia por instantes e depois era o vazio. A ânsia de conquistar, destacar, ter e lá vinha uma nova pele... Claro que com seu impossível derretimento, todas as lembranças que acendia apagavam na mesma velocidade. E ele já não sabia se quem caia, caiu, cairia ou estava caindo... Então, a torneira pareceu engasgar e cuspiu uma gota d’água. O suficiente para trazê-lo de volta e se assombrar com um reflexo no espelho do banheiro. O próprio.

Fosse qual fosse o jogo ele se concentrou em suas mãos. Primeiro na esquerda depois na direita. Parou de frente consigo mesmo. Olhou para um olho depois para o outro. Quase se assustou com o primeiro pensamento. Pareceu em voz alta. Um olho meu acumula identidades, o outro condensa personalidades. Chorou personalidades e identidades até desidratar. Não melhorou. Ao invés disso, misturou fúria assassina, temor covarde e inclinou a cabeça para se encarar.

Ao olhar no espelho não estava mais lá. Não estava mais lá a imagem que sempre reconheceu como sua. Podia ver e ouvir um lobo feroz, porém suas palavra eram um som oposto a imagem. Ele balia e tilintava um sino estridente.

quinta-feira, outubro 24, 2013

Espelhos jogados



Espelhos jogados

Tantas peles suando no mesmo corpo
um ato louco de se adaptar construindo a fogueira
antes de, na esgueira, inflamar líquidos no atear do fogo, contrário de pouco

jogo do cordeiro e do lobo

lodo destruindo a identidade do lobo se devorando de qualquer maneira
confundindo sua identidade com a das ovelhas

entre rosnar e balir, agem os truques das mãos
ilusões criadas com antecipação enquanto se alimentam de nada

aonde a jornada, é um círculo pequeno, se prendendo
se perdendo na própria falsidade e no fim, nenhuma pele é de verdade.

(Rafael Belo, às 09h04, quarta-feira, 23 de outubro de 2013).

terça-feira, outubro 22, 2013

Construindo as dificuldades



Construindo as dificuldades
por Rafael Belo
As próprias mãos constroem e destroem com uma dificuldade contraditória. Enquanto a construção é árdua e demorada, a destruição só pede um pouco de líquido inflamável e fogo ou uma simples pedrada. Destruir, normalmente está ligado a um sentimento mal redirecionado que acaba por criar um efeito dominó incendiário aonde muitos perdem por causa de um só. Mais uma vez o egoísmo chacoalha todas as árvores para colher todos os frutos que murcharam e perderam sua sustância inevitavelmente.

Olhando bem, também podemos associar a construção de imagem, principalmente daqueles acompanhados bem de perto. São tantas peles, personalidades e lobos devorando ovelhas a ponto de uma descrença latejar dentro de nós. Aquela situação onde a prática não passa da teoria dos ouvidos agradados. Enquanto isso, os ventos fortes fazem a sonoplastia do mormaço e do imenso calor lá fora. Assim, as ovelhas se vestem de lobos e deixam de ser ovelhas querendo pastorear a falsos rosnados seu balir inconfundível.

No fim da história vestir outras peles caminha pela destruição, o que não constrói nada nem hoje nem amanhã. Enquanto as responsabilidades são delegadas ou maquiadas de feitas, um imenso véu cobre os olhos de quem quer acreditar nas boas intenções e na aparência. Agradar a todos e se posicionar conforme o interesse ou não se posicionar é no mínimo suspeito, mas nesta segunda-feira – quando esta crônica foi escrita - as teorias da conspiração nunca estiveram tão em alta com o Facebook cheio de falhas sem curtir, compartilhar, comentar, postar... Como “censura”? E o Youtube não rodando... ?

Resumindo tudo em 140 caracteres, pois o Twitter está funcionando, o que está acontecendo com a teoria de sermos espionados agora estar confirmada, mas não só pelos Estados Unidos, mas também pelo Canadá? Quem é ovelha e quem é lobo nesta constante destruição das imagens que criamos? Difícil saber no meio de tanta destruição quem são as pessoas realmente. Mas a dificuldade diminui se construirmos relações verdadeiras e profundas, não de imagens e interesses, utilizando não só as mãos, mas principalmente os olhos e os ouvidos.

sábado, outubro 19, 2013

Chuva de insetos (miniconto)



Chuva de insetos (miniconto)
por Rafael Belo

Como uma metamorfose ambulante, pouco antes de Raul Seixas, aquela de Franz Kafka, ela se arrastava. Não era sua preferência nem havia se metamorfoseado em um inseto do tamanho de um dinossauro pequeno. Nada tão absurdo, mas quase. Este detalhe a afastava por milímetros praticamente invisíveis aos olhos nus. Como os olhares estavam vestidos, porém em alto e bom sono... Nada viram. Ela tinha sua particular chuva. Se isso só já não bastasse não era uma qualquer, era uma chuva de insetos.

Ela vagava exausta sem conseguir enxergar qualquer claridade. Aqueles insetos choviam em sua cabeça, rosto, pescoço, tronco, braços e pernas sem piedade. Ela estava de olhos fechados há tanto tempo que chegou a duvidar se um dia enxergou. Sentia-se cega e aquela tortura realmente sem motivo só podia ser o renascimento de uma das pragas do Egito, só que esta nunca foi relatada. Ela preferia ter uma nuvem negra como o azarado Uruca dos Flintstones... Tantos milhares de insetos só poderiam provocar aquele zumbido ensurdecedor que ela nunca mais teria fora de sua cabeça.

O som só aumentava como a escuridão. Uma escuridão que se movia e a perseguia por todos os lados, em cima e em baixo. Ela passou toda sua vida sem graça e as sempre perguntas insistentes de onde vem esta luz irradiando de você?!... Chamavam-na de Vaga-Lume Completo, o porquê vocês já sabem... Aqueles insetos choviam tanto e pareciam querer invadi-la. Demorou a se dar conta que estava tudo escuro lá fora, longe de seus olhos fechados e sua nuvem de insetos chuvosos. Porque não bastava devorar zumbidamente a luz de fora... Como gafanhotos em vistosas plantações. Mas eles não eram gafanhotos... Era todo tipo de insetos.

Por um instante ele pensou ouvir vozes em meio à infinita multidão de zumbidos... Ao abrir os olhos pode jurar que era minipessoas cascudas, alongadas, espremidas, achatadas e foi esse seu erro. Por outro instante tudo parou. Dois focos de luz atravessaram aquela escuridão e chegaram aos extremos do horizonte e, então, o primeiro inseto entrou no olho direito e o seguinte mais abaixo na narina direita ao mesmo tempo em que dois invadiam os ouvidos e um quinto já descia no engasgo da garganta... Seguidos de milhares. Impossível emitir qualquer som. Em poucos segundos só restavam à escuridão e os silêncios. Incontável escuridão e muitos ecos dos silêncios.

quinta-feira, outubro 17, 2013

impreciso



impreciso
 
Lá para o céu, todos olhavam
ritmados pelo zumbido sem fim
não havia nada naquele branco papel, mas buscavam

era incômodo aquele barulho reunido de tantos insetos
brilhavam todos os olhos, iluminando o teto

tudo mais era escuro, uma noite desaluada, desestrelada,

sem horas, só aquela chuva suicida, daqueles pequenos nadas
enquanto os nada grandes, se apequenavam de impotência

apagaram os olhos e ficou só o som
não sabiam se era sinal ou ruído, nem se era preciso dizer se era mau ou bom.

(às 09h08, Rafael Belo, quarta-feira, 10 de outubro de 2013).