sábado, outubro 19, 2013

Chuva de insetos (miniconto)



Chuva de insetos (miniconto)
por Rafael Belo

Como uma metamorfose ambulante, pouco antes de Raul Seixas, aquela de Franz Kafka, ela se arrastava. Não era sua preferência nem havia se metamorfoseado em um inseto do tamanho de um dinossauro pequeno. Nada tão absurdo, mas quase. Este detalhe a afastava por milímetros praticamente invisíveis aos olhos nus. Como os olhares estavam vestidos, porém em alto e bom sono... Nada viram. Ela tinha sua particular chuva. Se isso só já não bastasse não era uma qualquer, era uma chuva de insetos.

Ela vagava exausta sem conseguir enxergar qualquer claridade. Aqueles insetos choviam em sua cabeça, rosto, pescoço, tronco, braços e pernas sem piedade. Ela estava de olhos fechados há tanto tempo que chegou a duvidar se um dia enxergou. Sentia-se cega e aquela tortura realmente sem motivo só podia ser o renascimento de uma das pragas do Egito, só que esta nunca foi relatada. Ela preferia ter uma nuvem negra como o azarado Uruca dos Flintstones... Tantos milhares de insetos só poderiam provocar aquele zumbido ensurdecedor que ela nunca mais teria fora de sua cabeça.

O som só aumentava como a escuridão. Uma escuridão que se movia e a perseguia por todos os lados, em cima e em baixo. Ela passou toda sua vida sem graça e as sempre perguntas insistentes de onde vem esta luz irradiando de você?!... Chamavam-na de Vaga-Lume Completo, o porquê vocês já sabem... Aqueles insetos choviam tanto e pareciam querer invadi-la. Demorou a se dar conta que estava tudo escuro lá fora, longe de seus olhos fechados e sua nuvem de insetos chuvosos. Porque não bastava devorar zumbidamente a luz de fora... Como gafanhotos em vistosas plantações. Mas eles não eram gafanhotos... Era todo tipo de insetos.

Por um instante ele pensou ouvir vozes em meio à infinita multidão de zumbidos... Ao abrir os olhos pode jurar que era minipessoas cascudas, alongadas, espremidas, achatadas e foi esse seu erro. Por outro instante tudo parou. Dois focos de luz atravessaram aquela escuridão e chegaram aos extremos do horizonte e, então, o primeiro inseto entrou no olho direito e o seguinte mais abaixo na narina direita ao mesmo tempo em que dois invadiam os ouvidos e um quinto já descia no engasgo da garganta... Seguidos de milhares. Impossível emitir qualquer som. Em poucos segundos só restavam à escuridão e os silêncios. Incontável escuridão e muitos ecos dos silêncios.

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