quarta-feira, fevereiro 26, 2014

Coloridos demais (miniconto)



Coloridos demais (miniconto)
por Rafael Belo

Um arco-íris geral. Por toda parte sorrisos duvidosos de diversas cores o abordavam.  Óculos de grau com todos os formatos coloridos o cercavam. Reparando bem, todos usavam óculos e aparelhos... Era tudo uma bizarra aquarela. Bem, menos ela. Sakura Suze. Em seus 30 anos nunca havia visto nada assim. Pensando com cuidado, sua mente era um branco total ou um blecaute. Só sabia seu nome, sua idade, sua cidade e o local onde estava morando. Mas sabia, aliás sentia estar tudo errado. Aquele mundo de fadas bêbadas não podia ser real, podia?

Só havia ela no prédio em que morava. Olhando do terraço via toda a cidade... Casas amontoadas. Algumas de tijolos, mas a maioria de restos de materiais, lona e até papelão. Forçando bem os olhos, não era bem uma cidade. Não para Suze. Era um mar revolto de destroços.  Não. Destroços, não. Pessoas sobrevivendo da melhor maneira possível e tentando morar da forma mais adequada, dentro de suas limitações. Ela não diria ser tudo favela. Alguns poderiam encarar como ofensa. Ela não queria ser encarada de jeito nenhum. Não mesmo.

Um novo apagão a fez querer ter sido tudo um sonho. Não era. Foi acordada com o prédio tremendo enquanto o rádio e a televisão noticiavam a ostentação do aparelho e dos óculos. Repetidamente. Depois insistiam que a felicidade era morar lá fora com pouco amparo e direitos básicos precários. Repetidamente. Ela se levantou e da sua janela via todos na rua. Ela sabia, aliás sentia... Todas as pessoas estavam nas ruas. Ninguém entendia, mas andavam juntos. Mesmo porque o espaço reduzido não permitia outra forma. De repente seu quarto estava lotado de fadas bêbadas de todos os sexos...

Por meses gritavam ao seu redor. Repetidamente. o rádio e a televisão noticiavam a ostentação do aparelho e dos óculos. Repetidamente. Depois insistiam que a felicidade era morar lá fora com pouco amparo e direitos básicos precários. Repetidamente. Além disso, continua a transitar entre o deu branco e o seu blecaute. Começou a sorrir abobadamente. Começou a olhar de um modo enviesado, doidivana...

Mãos se ocupavam de sua boca, seus dentes, seus olhos... Dia após dia. Até o dia do não. Neste dia não trocaram nem colocaram óculos ou fios em seus dentes. Angustiada e perdendo seu ar vazio, procurou e encontrou as cores de seu gosto. Saiu. Fugiu para o meio das outras fadas bêbadas. Tudo era ostentação e felicidade. Nunca mais sairia dali, não moraria em outro lugar jamais.

Um comentário:

José María Souza Costa disse...

Olá.

Passei aqui, para lhe desejar um bom tempo de Carnaval
Um abraço abraçado.