sexta-feira, abril 19, 2013

Miniconto – Altos voos


Miniconto – Altos voos
Por Rafael Belo

Quando lhe chamaram de alienado ele logo pensou que concordavam com ele. – Não sou mesmo deste planeta. Sou um alienígena completo, tirando as antenas e a pele verde. Não concordo com quase nada e sou... Qual o nome mesmo...? Desinformado. Não só porque estou fugindo pelas sarjetas para não sumirem comigo. Sou um novo morador de rua itinerante. Mas esta acusação, alienado, veio antes desta situação. Sou formado na vida, por mais que tenha... Não tenha concluído nenhum dos cursos com a minha cara e coragem, ninguém tem o direito de me chamar de desinformado. E daí que não tenho diploma de verdade, passei pelas formações básicas (claro sem pensar e criticar muito) como todo mundo: decorando...

Ele sempre trabalhou de sol a sol, como um capacho particular. Tinha habilidades próprias e se desenvolvia com facilidade, mas nunca mostrava nada novo nem queria novidades em nenhuma parte, principalmente na política. Era detentor do clichê rouba, mas faz e também do típico melhor o certo que o duvidoso. Sempre se limitou a não correr riscos, a seguir a corrente. Dizia a si mesmo: para quê quebrar a corrente e nadar contra a maré?É tudo moda e bestice e de si para si concordava e seguia sem esforço algum, sem gastar um neurônio sequer. Mas até então, anos e anos a fio a sugar as rebarbas sobras da sociedade e de seus patrões, continuava (por incrível que pareça) o mesmo, sem deixar estas regalias farrísticas, como dizem por aí, lhe subirem a cabeça.

Porém, sabe bem a sabedoria interiorana que quem muito espera continua esperando. Começaram a encaramiolar as ideias claras do preto no branco e uma confusão começou a doer-lhe a cabeça. Pouco depois veio o surto já incendiando o mordedor no incêndio da fogueira das vaidades. Se achando no direito inalienável da arrogância decidiu fazer o impensável no país do funk, futebol, das verdades únicas e do Jornal Nacional: cobrou, cobrou e cobrou. Boicotou as eleições e sumiu na época pós-leitoral. Os agentes do politicamentecorreto o encontraram na Capital mais interiorana tupiniquim e cobraram suas justificativas. Não as tinha. Mas, armou as palavras mais usadas depois do deboche do eu te amo e as atirou Eu tenho meus direitos. Não pôde mais votar limpo, exercer nenhum de seus cargos fantamas ou funções públicas inexistentes, muito menos aprimorar seus conhecimentos em um, finalmente, terceiro grau.

Desrespeitado. Descartável. Foragido. Não posso exercer minha função oficial de capacho e sou obrigado a raciocinar sobre cada coisa. Nem mais a sarjeta é livre. Alguns dias aqui e outros acolá e lá vêm os assistentes sociais tentarem me mandar de volta como se eu não fosse da Morena. Quando foi que me tornei descartável mesmo... Ah, sim... Na hora da arrogância... Por que quis sair daquele escurinho consolador de tantos anos...? Não quis... É, não quis. Posso ver o exato momento da poda das minhas asas e do esquecimento da existência delas. Mesmo voando tão baixo sem sentir sequer o vento... Me confundi ao chão, virei chão, fiquei confuso... Só aos pulinhos bicando as mesmas velhas migalhas e aquelas ideias de cobrar meus direitos... Preciso encarar tudo agora, até olhos nos olhos, de frente olhar. Só não sei se um dia saberei voar alto...

Um comentário:

Anônimo disse...

É incrível a nossa aceitação de tantas coisas erradas...não é comigo....uma hora as coisas vão se assentar....que nada não posso fazer nada....manda quem pode ...obedece... somos molas coniventes com tantos desmandos...somos também omissos aceitando todos os desmandos...até quando?

Belo texto..