por
Rafael Belo
Mais
um acidente a atrasando. Outro no cruzamento da Antônio Maria Coelho com a
Bahia. Já sempre atrasada sem motivo, ela estava mais uma vez impaciente.
Buzinava como se adiantasse, acelerava como se resolvesse, enviava mensagens
reclamando e ligava tentando se explicar. Amaldiçoava os motoristas
irresponsáveis que a prendiam no trânsito. Decidiu descer e caminhar quase mil
metros para tirar satisfações. Borbulhava como se nunca tivesse tomado uma
antirábica e tivesse dormido em festa com todos os morcegos da cidade.
Eles vão ter que me pagar em dinheiro
cada minuto de atraso. Onde já se viu parar o fluxo desta forma?! Por que não
saíram mais cedo...? Estão me atrapalhando... Devem ter furado o sinal. Mas
também onde estão os fiscais? Detran, Agetran, Ciptran... Com aquelas roupas
ridículas...? O mesmo blablablá... Coloque o cinto, dê seta, não avance o
sinal, seja gentil mo trânsito, dê vez aos pedestres.... O quê vocês estão
olhando se nem sabem se vestir bem? Ah, aposto que queriam ter minha coragem de
ir até lá e... Será que tranquei o carro?
Mal
se deu conta que já estava sobre o acidente. Uma batida fatal que acabara de
acontecer entre duas caminhonetes. Infelizmente eram duas mães com suas filhas.
As meninas estavam feridas... Quando parou de olhar adiante e viu o que se
passava começou a tremer. Era a primeira a chegar. Sentiu um cheiro queimando
seu nariz. Olhou para o sangue misturado com gasolina... Então, enxergou alguns
rapazes carregando cuidadosamente as duas meninas sobreviventes. Tudo muito
rápido. Forçou a vista para ver se as mães se mexiam. Olhou de um carro para o outro
incrédula. Uma estava misturada com as ferragens e vestígios de celular como
extensão da mão. A outra, incrivelmente, estava com um cigarro ainda aceso e...
Buuummm.... ! Tudo foi pelos ares...
O
quê é isso?! Mas... Obrigada! Muito obrigada. Ah, me desculpe o abraço. Você me
salvou e mais uma das meninas, certo? Que situação terrível! Estou chocada...
Estou... Sangrando?! Quê cena de guerra é essa...
Não
quis saber de socorro. Assim que a distração tomou conta, correu de volta para
seu carro. Estava batido dos lados e atrás, até na frente havia amassados. -
Mas o quê aconteceu afinal...?, se perguntava. Estava meia hora atrasada e
correu como uma excelente piloto de Fórmula-1, só que infelizmente não há pilotos
mulheres na categoria e ela não era nenhuma motorista de fuga nem conhecia tão
bem aquela região da periferia.
Desta vez ela bateu. Perdeu tudo que havia no carro. O
veículo explodiu e queimou incompreensivelmente até restarem apenas cinzas atrás
daquele barranco. Ela sobreviveu porque foi arremessada sobre um depósito de
colchões. Mas, apesar das leves escoriações e da dor de cabeça conseguiu ligar
para um amigo taxista. Chegou ao serviço a tempo de ser demitida por não avisar
o patrão.
Um comentário:
Retrata nosso dia a dia..Bela reflexão! Mamys
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