domingo, maio 31, 2015
sábado, maio 30, 2015
sexta-feira, maio 29, 2015
Caráteres e caracteres
por
Rafael Belo
“A síndrome de
vira-lata sofre de esquizofrenia e oscila por várias raças caninas até a síndrome
de Mastim Tibetano, ou seja, varia de valor nenhum a 1,5 milhões de reais. De pobreza
brasileira a status social na China...” é interrompido o pensamento de mais um
anônimo por uma gritaria familiar a qual só pode ser identificado: “Nunca nada
é bom o suficiente para você”, esbraveja Leozinho desrespeitoso para a mãe.
Esta superprotetora
escolhendo e proibindo lugares e amigos de Leozinho, o cobrando o tempo o tempo
todo resultados do investimento feito durante longos e briguentos 17 anos. Não teve
carinho, atenção, presença, exemplo... Então, em quais esconderijos estavam a
vida escolhida dela naquele filho bonzinho em dívida dos “pedidos” diários de
sucesso?
Recolhendo as máscaras
do chão eles se atacaram. Filho único contra mãe abandonada. Deu choradeira e
rebeldia nas possíveis etiquetas na nunca. Rostos dos mais variados na mesma
pessoa representavam uma paralisia social diante dos pensamentos sobre casais
do mesmo sexo, moradores de rua, cidadãos sem cidadania forçados a viver em paupérrimas
periferias, igualdade entre homem e mulher, respeito ao próximo... A paralisia
transitava entre o sorriso e o ódio eterno nos lábios de Monalisa.
Escorregava da generosidade
e simpatia para a antipatia e a proibida palavra preconceito. Uma fila de
intermináveis 45 minutos de expressões para disfarçar a quantidade de
julgamentos recheados das mais variadas camadas sociais. Leozinho desculpado
pela adolescência e pelo “resultado” da criação, a mãe desculpada pelo duro
trabalho de fazer tudo sozinha. Mas, a linha tênue sempre arrebenta e faz as
cicatrizes maquiadas aparecerem.
O choro borra tudo e
turva a visão insegura nas fissuras dos caráteres misturados com os caracteres
e no fim um é o outro no desabafo revelador. O anônimo divagador volta a pensar
e pensa na falta de caráter de alguns mundos, olhando a interminável cena...
Não há caráter nem em mãe nem em filho, quem dirá... Onde Leozinho (neste
momento todos sabem o nome do adolescente) moldaria seu caráter, seus valores
(não, não... nada de cifras).
quinta-feira, maio 28, 2015
enrustida
nó
no novelo navalha língua
sangra
palavras escorrega suinga
carimba
testas soladas tratadas
periga
toda verdade ser revelada
velada
na escrita secreta
lida
sincera no encostar da vela
sela
sujeito por sujeito o jeito de cada preconceito enrustido
revestido
de panos quentes bonzinhos
sozinhos
na particular maneira de disfarçar o nascer do sol com a mão
ação
de atar a vida no burburinho de julgar a lua pelas fases a passar escuridão.
quarta-feira, maio 27, 2015
Mais um dia de trabalho
por Rafael Belo
Neuróticos
histéricos anônimos se reuniam diariamente, afinal tinham apenas uns aos outros
exatamente pelos nervos à flor da pele e a histeria completa. A desordem generalizada
não interfere nos pensamentos deles. Irritados com tudo, mas pensando
racionalmente. Agitados, passíveis, intranquilos, porém há a paralisia, a
cegueira, a surdez, a mudez, enfim a nudez.
Todos
os moldes e regras sociais saem anonimamente pela língua destravada como um
vírus transmitido pelo ar contaminando o mundo exalando suas neuroses e
histerias. Tornam-se anônimos inconscientes difamadores. Na alvorada, ao invés
de debandar, os pássaros silenciam como cada som surgindo manhã após manhã
agradecendo mais uma oportunidade de recomeços. Apenas Luna Luanda desperta ao pisar
em um rosto caído...
Solta
um grito longo e capaz de estilhaçar taças de cristais legítimos, mas comum e
entediante para neuróticos histéricos. Trombando e sendo coberta de indizíveis impropérios
ainda não registrados por aqueles que ainda podiam falar. Desequilibrada corta
cada vez mais as solas dos pés. Há rostos espalhados por todos os lugares...
Não
há grama, terra, asfalto só faces etiquetadas com preços sobre preços cada vez
mais altos, marcados com apelidos pejorativos, preconceitos linguísticos, classicistas,
literais, visuais, capilares, gestuais, vestuários, comportamentais... Depois
de um tempo sendo esculhambada os ainda falantes perderam este sentido. A paralisia
afetou o último estágio e a língua parou....
terça-feira, maio 26, 2015
olhar noturno
clara lua vejo através de você
por meio do meu olhar cansado
repousado no seu brilho na noite a permanecer
solitária alma brilhante reflexo solidário
tentando todos os dias flertar com o sol se pondo
alva amante prateada
assombrando todos os espíritos da estrada
quem dera uma escada a fizesse descer
forçando a maré ser alta enquanto você cheia
carrega todo julgamento em canto de sereia
para areias onde nenhum ser humano consegue pisar
para as profundezas do preconceito aonde ninguém
ousa localizar.
(às 16h52, segunda-feira, Rafael
Belo, 25 de maio de 2015).
segunda-feira, maio 25, 2015
Onde está nossa alma?
por Rafael Belo
Todos
os tipos se misturam invisíveis nas multidões da cidade... Bem tipos não, né?! Personalidades,
indivíduos, pessoas, cada um possui características únicas mesmo se forem
cópias de outros sujeitos. É impossível soar e pensar exatamente como outro ser
humano e separar um por um em religião, política e futebol... Gestos e gostos
são tão individualizados a ponto de não identificarmos qualquer origem.
Mesmo
assim, há estereótipos espalhados por todos nós nos identificando etiquetas. Não
de marcas, pelos menos não exatamente,
mas não é nosso nome de batismo diria
Drummond. Aliás, Carlos Drummond de Andrade terminaria nos falando eu sou a coisa, coisamente. Vendemos imagens
gratuitamente, ostentando nomes nos pés, roupas íntimas, calças, camisetas, celulares,
selfies... Tudo enfim...
Da
mesma forma julgamos separando pessoas por sexo, idade, jeito, gesto, erros...
Preconceito? Com certeza. A hesitação, a dúvida, a indiferença, a superatenção,
o pensar superior, o fazer mais correto, o dizer melhor, a maneira mais certa
de se comportar, o adequado, o inadequado, estas nossas palavras afiadas
atiradas jazendo tão enferrujadas nos pensamentos, na língua envenenada...
Talvez
na lua desfocada na noite... Morremos e matamos com vírgulas e certezas
inexistentes diariamente. Temos frases prontas sobre os diferentes sexos, outras
orientações sexuais, as inúmeras origens, as diversas religiões e não somos
todos seres humanos? Por incrível que pareça somos. Apesar
das atrocidades, genocídios, das guerras por ganância, religião...
Não faz
tanto tempo um povo escravizava (??) o outro e nem conhecíamos a existência de
um país vizinho, mas em seguida juramos por Deus que os nascidos e descendentes
da África não tinham alma... Então, onde está nossa alma?
domingo, maio 24, 2015
Cozinhando a rã (resenha)
por
Rafael Belo
Só sons significam
algo para quem não vê, mas apesar da cegueira generalizada mundial e do tatear
das mãos para formar imagens na cabeça, as tonalidades e nuances elaboradas
pela voz trazem os detalhes entre uma vogal e consoantes ao meio de uma palavra
e outra completadas pela visão do que o corpo diz. Trazer estas minúcias em
palavras é de uma riqueza rara a nos levar para onde for.
Ler Toda Luz Que Não Podemos Ver é fazer
parte do lançamento de um clássico com frases tão bem pensadas e relacionadas
trazendo a certeza de que amanhã será parte dos diálogos cotidianos das
pessoas. Anthony Doerr presenteia o mundo com esta obra-prima tratando um tema
tão exaurido de uma forma inédita e em uma leveza condutora de uma cabeação
condutora da mais leve a mais alta voltagem.
São 526 páginas com
aquele sabor de 100, de quero mais. O capítulo A Rã Cozinha traduz toda a essência do livro em um trecho final
onde Madame Manec nos oferece uma retórica: “Sabe o que acontece quando se
coloca uma rã em uma panela de água fervente? Ela pula para fora. Mas sabe o
que acontece quando você coloca a rã em uma panela fria e então lentamente põe
a água para ferver? Sabe o que acontece? – A rã cozinha.
Um bom livro nos
oferta tanta sabedoria que não esquecemos, ele nos ilumina, nos ensina a
valorizar novamente e mais uma vez faz a imagem do que poderíamos ser e não há
como terminar esta resenha sem citar algo novamente parafraseando Doerr: quando
homens em situação limite aceleram o coração, caramujos na mesma situação o
deixam mais lento. Marie-Laure foi limitada até os seis anos quando apenas via
o mundo, depois ficou cega e passou a enxergar... Werner nunca deixou de aprender, ser curioso e sonhar... Se há algo que vale a pena
ler é Toda Luz Que Não Podemos Ver.
TODA
LUZ QUE NÃO PODEMOS VER
1ª
edição Março de 2015
526
páginas
Autor
Anthony Doerr
Editora
Intrínseca
Tradutora
Maria Carmelita Dias
Copyright
2014
Título
original
ALL the Light We Cannot See
sábado, maio 23, 2015
sexta-feira, maio 22, 2015
No outro dia
por Rafael Belo
Em menos de três minutos
seis “perdeu, perdeu”, o equivalente a três assaltos. Crimes pequenos à mão
armada, porém se comparado a quantidade de pessoas mortas em consequência da
ganância de João Honesto, não era nada. Aliás, João Honesto era político de
carreira, eleito e reeleito... Há 20 anos... Acompanhou o crescimento da
criminalidade fruto daquilo que tirou da educação, reurbanização e saúde... Mas
Honesto não imaginava ser roubado, reconhecido e, então, sequestrado.
Nos três minutos
criminosos, Honesto viu uma moto estacionar, o motoqueiro descer com uma .38 em
punho deixando o veículo ligado, entrando e saindo com um saco de dinheiro. Entre
uma coisa e outra roubaram esta moto novinha dele. Ele xingava e reclamava da
criminalidade na região. Quando se deu por si havia uma .45 encostada na
própria cabeça e lá ia seu roubo suado e sua arma.
Viu uma viatura em
ronda bem na hora de sempre. Foi até lá e denunciou o roubo da moto roubada na
noite anterior por ele. Não satisfeito queria registrar ocorrência da arma com
numeração raspada e do dinheiro assaltado. O policial, solícito, anotava tudo
quando o dono da padaria indignado pelo quadragésimo assalto e pela situação
política avançou com sua espingarda para o espectador João Honesto.
O malandro criminoso
ao ver a espingarda se jogou na parte traseira da viatura e bateu a porta. O dono
da padaria arremessou o político do outro lado batendo a porta e encostou a
arma na têmpora direita do policial o mandando ligar rápido e acelerar. Treinado,
o policial enrolou e já havia deixado o rádio comunicador aberto para toda a
polícia ouvir a ocorrência em andamento. Em poucos segundo esta chegou.
Assustado, o dono da
padaria acidentalmente atirou e uma saraivada de balas surgiu em resposta. Não houve
sobreviventes... No dia seguinte a notícia estampava todos os jornais: “Emboscada
à Honesto termina com quatro mortos”.
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quinta-feira, maio 21, 2015
produção seriada
de
repente todos doentes tossem
inflamações
ranger dos dentes
vermelhos
olhos dizendo pare
repare
a exaustão separe o cansaço
ampare
o laço da retina vendando as retinas enfeitando pescoços no espaço
não
há cortinas só esforço nem a evasiva privacidade
a
insegurança é a violência do apodrecimento da verdade
o
cotidiano automatizou o humano
corrompeu
seus planos e os disfarçou de disfarçado otimismo
somos
todos ostras do ostracismo na fascinação
sem
reparar nas pérolas em alto escala de reprodução.
(Rafael
Belo, às 07h47, quarta-feira, 20 de maio de 2015).
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quarta-feira, maio 20, 2015
Quem disse?!
por Rafael Belo
Ele senta concentrado
cercado de barulho de aviões, vozes dialogando, discutindo trabalho, falam
sozinhas ao telefone... De repente silêncio, só risos sumindo e o toc-toc se
distanciando de saltos, indo até a surdez provisória. Ricardo Gotas cochilou e
tudo ficou mudo até os segundos se passarem e ele perceber onde estava: mais
uma reunião. Os sons voltam e um telefone começa a tocar insistentemente.
Há tempos ele
aperfeiçoou a bizarra técnica de dormir de olhos abertos, mas desta vez o
cansaço veio tão pesado... A cabeça foi pra frente freada e pendeu no balanço
do corpo... Acordou perigosamente a milímetros de bater a cabeça na mesa de
madeira de lei. Teria morrido? pensou
ou apenas ganharia uma concussão leve?...
E então se quietava seus pensamentos até o susto dos olhos fechados. Fechei os olhos?
Ricardo Gotas não
tinha nenhuma habilidade, treinamento, disposição ou vontade. Estava sentado
ali ameaçadoramente sem ninguém ousar olhá-lo ou comentar a dormida pela “manipulação
de conhecimento”. O pai dele, este sim trabalhador, estava reunindo o máximo de
desvios possíveis para denunciar cada pessoa ao redor do filho no momento por
peculato.
A corrupção era tanta
a ponto dele só imaginar gordas mesadas para polícia, Judiciário, Executivo,
Legislativo e faltava exatamente esta conexão para provar a lama podre de
corrupção dali, mas por falta de qualquer coisa saudável teve um fulminante
infarto aos 45 anos e o acomodado filho de 20 estava corrompido corrompendo os
corruptores por status, poder e, claro, 50 % de todos os envolvidos.
Como corrupção gera
violência em poucos meses não sobrariam nem amigos, nem família a Ricardo
Gotas. Ele pressionou tanto quem não estava acostumado a ponto dele virar
cinzas. Apenas a arcada dentada dele e parte de um braço ficaram milagrosamente
intactos com indícios de overdose, mas o incêndio garantiu sua morte e se
espalhou indelével por toda a cidade. Quem disse que a corrupção não aprende!?
terça-feira, maio 19, 2015
diários
rompem
as sustentações caindo sem chegar ao chão
corrompem
ilusões com ilusão para acabar com o inevitável
da
noção perdida se perdendo na encenação
na
queda da tentação do mais provável
contagem
regressiva para autodestruição
três
dois um implosão conspiração domesticável
corcunda
da impostura da rejeição inviolável
volátil
explosão pedras no lago
fogo
fátuo no saco na cabeça cotidiana manutenção...
...mais
diárias dos olhares da aproximação agressões de fatos.
(às11h25,
Rafael Belo, segunda-feira, 18 de maio de 2015).
segunda-feira, maio 18, 2015
Autoagressão
por Rafael Belo
Atrás dos contornos da
terra o sol mais uma vez é posto. Límpido e extremamente difícil de olhar
diretamente tamanha sua luz e beleza. Sempre disposto, incansável, diário... Nós,
depostos, o olhamos sem perceber ser um espelho, mas diferente dele nós vamos
nos corrompendo e toda corrupção causa violência. Corrompidos nos violentamos
antes de propagar esta destruição intrínseca.
O famoso efeito
borboleta misturado com o efeito doppler... Sabe algo entre o bater de asas no Japão
causar furacões por aqui e jogar sem parar pedras em um lago durante um dia sem
vento... Não queremos ter noção do impacto de nossas ações. Procurando vantagens,
tirando vantagens, agindo “enquanto ninguém está vendo”, ficando com o troco
errado, com o dinheiro achado, ignorando as consequências...
É como se nosso sol
parasse de nascer de repente e todo o planeta fosse Antártida, mas ao invés de
seis meses de noite estamos há mais de meio milênio na escuridão trocando bugigangas por
ouro, vidas por dinheiro e poder. Mas, a guerra está na mente há muito mais
tempo que a existência do Brasil sempre na tríade ganância, dinheiro e poder
Ao mesmo tempo somos a
pedra no lago e o bater das asas aplaudindo nossas saídas às ruas nos
manifestando, paralisando distante daqueles que nos representam fazendo leis,
berrando palavras de ordem afetando apenas as superfícies, na hipocrisia em crise
de risos de todos... Todo o sistema está corrompido. O dinheiro desviado lá,
desvia a educação aqui, desestrutura a segurança mais adiante e a violência é
autoagressão e um agredir incessante.
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domingo, maio 17, 2015
Reino (Kingdom)
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sábado, maio 16, 2015
convulsivos
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sexta-feira, maio 15, 2015
Resmungos
Por Rafael Belo
Mais uma sexta-feira
cansada se levanta cheia de esperança (que
o fim de semana seja bom e longo?), mas no dia de rodízio de seu carro o
ônibus é obrigatório por questões práticas. Olivia Oito se incomodava com os cutucões,
puxões, empurrões, pisadas e ficava fora de si e raivosa com as encoxadas. Bolinada
intencionalmente ou não, não importava, ela tinha aversão ao toque e, ingrata
como todos, xingava pela falta de gentileza e gratidão.
Olhava muitos ali,
atrasados como ela, mas totalmente despreocupados. Os poucos acordados avisavam
por whatts do atraso enquanto se isolavam nos fones de ouvido, mas sempre tinha
os chatos falando ao celular tudo que os outros não querem escutar e todo o
ônibus escutava. Olivia observava com uma mistura de tédio e ferocidade
assassina constrangendo impiedosamente quem quer que fosse.
Quando era tocada se
contorcia como uma borboleta voltando a ser lagarta no óleo fervente. Segurava-se
para não gritar cada xingamento repassado repetidas vezes na mente. Mas, os
roncos a enlouqueciam fervorosamente mais... Como era possível dormir desta forma?!!!... pensava Olivia da forma
mais indignada. Ela estava em pé e encarava compulsivamente quem dormia
largado. Se alguém se atentasse ao rosto dela imaginaria uma dor lancinante a
torturando.
À direita dela uma
cabeça pendia quase encostando nas costas e à esquerda era um queixo colado no
peito babando. Altos roncos de estudantes bem
jovenzinhos. Muitas paradas depois, conseguiu bufante e mal-encarada sentar
resmungando a meia altura... Dormiu quase de imediato roncando alto como um
chaleira e balançando em toda sua antipatia rumo ao ponto final. Obviamente ela
não iria trabalhar naquele dia, mas estava tranquila sonhando com um mundo onde todos a agradeciam pela liberdade de não agradecer nada, apesar da gentileza.
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quinta-feira, maio 14, 2015
Imperceptível indiferença
a
garoa impede o clarear
chumba
em chumbo o trafegar
não
há movimento no engarrafamento
também
parece parada a garoa
há
uma sacada vazia inexistente zombando de qualquer pressa antes das 7h
ingratas
marionetes do poder
corrompidas
pelas cores cinzentas fingindo magentas
pensando
colorir corresponder ao seu dever
se
molha e nem percebe...
A
graça e gratuidade de ser água a faltar.
(às
07h34, Rafael Belo, quarta-feira, 13 de maio de 2015).
quarta-feira, maio 13, 2015
Irreconhecível
por Rafael Belo
Desabou o homem em uma queda seca e catatônica. Um baque surdo-mudo levando ao susto todos os presentes. Chico se debatia em seu silêncio e roubava o silenciar dos outros. Doía reconhecer sua ingratidão e desgraça. Então, insone, era o monstro da noite, os ruídos do prédio, o tédio do sonâmbulo culpado demais para dormir.
Arrastava sua corrente, rangia os dentes, batia portas e insatisfeito gritava. A noite não era de ninguém e silenciosa como um abismo ecoava seu som animal encurralado e ferido pelos sonhos terríveis dos outros moradores. Era impossível saber a origem dos sons e Chico sabia estar ruminando suas escondidas emoções.
Saiu no frio sem roupas depois de uma semana sem comer. Era pura água e náuseas estomacais. Toda vez Chico sabia da sua inaptidão para o amor. Falava coisas belas e as cantava, até aconselhava bem, mas como muitos, fingia não precisar dos próprios conselhos e sua forma de castigo era se privar das suas vontades...
Traído por si mesmo chorou como uma garotinha abandonada pela mãe por desamor. Fez-se oceanos de insônia com suas lágrimas doloridas e sinceras e se esvaziando voltou a se preencher, mas nas ruas paulistanas tão “pedindo pelo pior” não voltou para casa e toda sua família acreditou que Chico cumprira finalmente sua promessa de sumir... Enquanto isso, os meses devorariam os vermes conhecedores íntimos da aparência irreconhecível dele.
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terça-feira, maio 12, 2015
Assopro
veleja
no ar o pulsar das velas
tremulantes
eras dos navegantes
apaga-se
esta chama com a lama da chuva
não
há mais velas acesas apenas nós em cera...
enverga-se
o corpo rangendo até o chão [curva-se]
enxergar
com a mão se perdeu no vento
turva
visão enxergando outro movimento
não
passa tempo nem volta
reviravolta-se
a volta não dada
debate-se
a graça e toda gratuidade nos devassa em sopro...
aonde
vai a liberdade em sua revoada
se
tudo a fazer com nossa passarada é cortar as asas gratas em pleno ar?
(às
14h20, Rafael Belo, segunda-feira, 11 de maio de 2015).
segunda-feira, maio 11, 2015
Graça e gratuidade
por Rafael Belo
Para manter a seda pura
e no ponto o bicho-da-seda perde a vida para nos vestir. A vida tem o mesmo
significado quando humana, vegetal e animal e por que não pensamos assim? Agimos
como cegos e ignorantes ao recebermos os sacrifícios a nos permitir termos os
nossos confortos, alimentos e cotidiano. Cada pequenez a usufruirmos custa
algo. Não há gratuidade na vida a não ser a Amizade e o Amor e o quanto somos
gratos a tudo isso?
Agradecimento parece
viver do outro lado de uma imensa muralha a qual não nos dispomos a passar, ao
invés disso nos emaranhamos a gestos e expressões parecidos com àqueles usados
quando precisamos admitir nossos erros. Somos imperfeitos, esta é a perfeição e
devemos ser gratos a isto também, mas por que temos tanta dificuldade de dizer
obrigados sonoros e verdadeiros mesmo se o outro nem sequer deseja ouvir?
Temos medo de parecer
fracos, pequenos e nos envergonhamos de nos sentirmos, assim, mesquinhos. Pensamos
que nos expor é ruim... Bem desde que não seja nas mídias digitais e com
intenção de ferir o outro, nos torna mais leves de corpo e alma, consequentemente,
ficamos mais gratos pelos presentes diários da vida. A todo momento esta
gratuidade de oportunidades deveria nos engrandecer.
Graça e gratuidade por
podermos todos os dias fazer nosso melhor, de respirar sentindo o ar
vagarosamente preencher nossos pulmões e oxigenar cada parte do nosso corpo,
mesmo que não entendamos (por enquanto) o motivo de estarmos passando por
qualquer dor e sofrimento a nos afligir, até quando nos perguntamos “por quê?!”
os significados serão preparatórios e de fortalecimento para evoluirmos da
correria... Para a mansidão.
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domingo, maio 10, 2015
sábado, maio 09, 2015
sexta-feira, maio 08, 2015
Partindo adeus
Por Rafael Belo
Então
é aqui que os cães se escondem quando fogem de casa? Viram cachorros de rua e,
naturalmente, se tornam amigos dos mendigos... Pensou
o pequeno Luís incrivelmente coerente no português. Mas Luisinho era destes geniozinhos
que mal tinha entrado na pré-adolescência e não demonstrava nem a inteligência
nem seu ódio pelos diminutivos fofinhos.
Saiu aquela manhã silenciosamente
escondido em suas certezas de sexta-feira. Como se fosse para a escola, mas
contrariado com sua passividade, como todo gênio, estava prestes a libertar
suas vontades e eus mais obscuros. Já esfregava as mãos de ansiedade, a tensão
no rosto já relaxava com um tenso sorriso assustador repelindo as pessoas como
um ímã opositor.
Luisinho era todo
satisfação e finalmente parou de se conter gargalhando furiosamente a ponto do
motorista do ônibus o fazer descer sob nenhum protesto. Não suportava ver a
alegria dos moradores de ruas com seus cachorros foragidos, então foi passando
a mão em cada cão, incrivelmente sem nenhum protesto dos mendigos acostumados a
perder, mas ninguém reclamava porque algo exalava daquele olhar e daquele
sorriso...
Quem vive sem um local
para dormir sob um teto acolhedor sabe exatamente o significado exalando de
Luisinho: eram os limites quebrados da loucura. Certa insanidade apontando a
capacidade imediata de matar ou morrer rascunhados no olhar e no sorriso. Ele se
chamava ironicamente de “o” Injustiçado. Logo ele (logo eu) tão inteligente, podendo adquirir tudo e agora livre, mas
com tamanha capacidade de raciocínio ele sabia necessitar de uma paz mais
elevada e, por isto, partia. Apenas um cachorro o seguia para o isolamento onde
nada chocaria com sua órbita colidida.
quinta-feira, maio 07, 2015
forçada comoção
injustiçados
deitam na própria grandeza
tão
pequenos dormem no chão
bêbados
de tantas filas de certezas
certeira
certa verdadeira ilusão
não
se chocam as órbitas
correm
na mesma ilógica direção
colisão
de inventadas memórias atraídas por outra atração
mãos
se espalmam para cima não estendidas
sempre
desentendida gravidade puxando tudo para baixo da consignação
crueldade
total da característica da pureza
na
tão úmida crueza que chove
gotas
do oceano da imensidão no grão de areia rude da gentileza
sem
pensar especificamente em nada erosão da clareza [se autocomove].
(às
06h44, Rafael Belo, quarta-feira, 06 de maio de 2015).
요,
quarta-feira, maio 06, 2015
As primeiras horas de quarta-feira
Por
Rafael Belo
Carolina
Silva estava sentada na margem direita do canto invisível do próprio olhar. Sua
expressão era algo entre pensativa e triste, mas quem pode confirmar se nem ao
menos ela o sabe dizer. Uma coisa é certa Carol, aliás Karol S.
(norte-americanizado mesmo como ela gosta de ser chamada) se sentia
injustiçada.
Antes
se sentia diferente e por isso, se achava no direito de ter mais direitos e
tudo mais rápido se fosse possível se comparar aos outros. Todos os dias Karol
chegava neste seu mundo com a mesma incerta expressão. Indefinida como ela
mesma não gostava de admitir, porque era mais, era diferente mesmo, mas não
tinha consciência de todos serem diferentes...
Igualdade
apenas perante a lei e as condutas perante a sociedade.... ou algo assim... Da pele para os órgãos e aquela confusão de
sentimentos e imateriais pensamentos tão pesados a ponto de confundir a
materialidade não havia mesmo nada igual... Bem a questão do sentimento de
injustiça, de perseguição se acumulavam como dunas no deserto pessoal de cada
um.
Porém,
neste exato momento não se passava nem vento na cabeça de Karol. Era o clichê
dia de fúria da menina aos seus longos 18 anos em seu primeiro emprego forçado,
pegou a faca de pão na cozinha e no impulso de castigar a sociedade machista
que a criou tão bem para servir vestiu um cínico meio-sorriso de satisfação no
canto esquerdo da boca e deu seu grito de guerra ao se atirar ao chefe este pensando
ainda em “outras satisfações” nas primeiras horas de quarta-feira...
terça-feira, maio 05, 2015
adestramento
acima da dor dormente alheia nossas feridas
além de qualquer problema nossa justa reclamação parida
apressados justificando a pressa primeira passageira
das órbitas atingidas
colidem explodem [olhos saudáveis sem ver]
a pior cegueira sem gravidade grave a correr
caindo atrás de si mesma a permanecer
buzina onipresente
não se ouve, não sente
de onde vem vai recente enrijecer
grito inexistente
ainda está lá reticente
ninguém confirmou latente escutou?
gente impotente [nós no espelho]
trezentos e sessenta graus girando de repente
conselho circular ciclo inconsequente
acaba na nossa cauda
abana enrola balança
senta
rola cumprimenta
bate palmas despede segue morto
todos tortos truques
tramando tentar
o absurdo de não escutar o outro.
(às 21h18, Rafael Belo, segunda-feira, 04 de maio de 2015)
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segunda-feira, maio 04, 2015
Órbitas em colisão
por
Rafael Belo
Os fogos estouram lá
fora como a ilusão da alegria de domingo de jogo, os cães se acuam com medo
mortal das explosões antes que a segunda-feira chegue decretando o fim do
feriadão e o início de mais uma semana de trabalho. Bom, é segunda-feira na
expectativa de novas manifestações, novos congestionamentos e mais deseducação espalhadas
no círculo viciante da vida.
Viciosa maneira canina
de tentarmos morder nossa própria cauda e girarmos, girarmos em rotação e translação
seguindo um sistema geográfico de posicionamento fora de órbita na lógica sem
argumento, sem profundidade e mesmo assim nos tornando uma areia movediça de
palavras erradas e gestos repetidos em um enlouquecedor déjà vu.
Provavelmente já vimos
e fazemos e o faremos de novo, mas seguimos nos movimentando desesperadamente e
afundando para uma morte medíocre. Não paramos para prestar atenção no outro e
ajudamos a empurrá-lo mais para baixo enquanto há quem o empurre em nossa
direção. Baste ver o ônibus nos horários de pico, trens e metrôs em dias de
manifestação...
Mesmo sabendo que as portas
não fecham enquanto alguém estiver nelas, há empurra-empurra desnecessário e
uma total descortesia. Falta gentileza nas pessoas, sobra medo e estamos
empanturrados de egoísmos. Achamos nossa dor ser maior, nossa reclamação ser
mais justa, nossa pressa ter justificativa e se todos, ou a maioria, pensamos
(pensa) assim, sabemos porque as órbitas só vivem em colisão.
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domingo, maio 03, 2015
Grão de areia na gota do oceano (resenha)
por Rafael Belo
A tristeza é a maré necessária para nos impulsionar
além da praia, para nos tornar quem precisamos ser. As alegrias são as ondas indo
e vindo conforme os ventos soprarem e nós somos os grãos de areia, às vezes as
gotas do oceano. Não há como sermos se não passarmos por alegrias e tristezas. Sãos
os caminhos que escolhemos por nossa única conta e risco que irá florescer ou
matar nosso jardim.
Amber Appleton é Quase uma Rockstar mesmo. Como
Matthew Quick intitula essa forte e emocionante história tratando a religião e
a relação com Deus, a vida e as pessoas de uma forma prática e informal sem amarras
e incapaz de deixar algo de lado. É leitura indispensável da mesma forma de O
Lado Bom da Vida.
Voltei a infância e a adolescência lentamente sem
sequer perceber sendo envolvido pelo estilo leve e direto de Quick. Levou-me
aos meus medos e leituras de clássicos infanto-juvenis no ambiente ideal
àqueles que se veem e se deixam a margem dos clichês estudantis, da segmentação
social já elaborada nas panelinhas escolares.
Os Cinco, JC, SJ, PC, os velhinhos, As Divas
Coreanas, Donna, Rick, Franks, Triplo B e as fatalidades cotidianas não nos
permitem nos afastar desta leitura marcante nos levando ao riso e ao choro na
mesma proporção. Leia com atenção, pois há mais nas palavras do que elas dizem
até chegar a um belo final onde nos vemos um grão de areia em uma gota no
oceano.
##
Desde
que o namorado da mãe as expulsou de casa, Amber Appleton, a mãe e o cachorro
moram em um ônibus escolar. Aos dezessete anos e no segundo ano do ensino
médio, Amber se autoproclama princesa da esperança e é dona de um otimismo
incansável, mas quando uma tragédia faz seu mundo desabar por completo, ela não
consegue mais enxergar a vida com os mesmos olhos. Será que no meio de tanta
tristeza e sofrimento Amber vai recuperar a fé na vida? Com personagens
cativantes e uma protagonista apaixonante, Matthew Quick constrói de forma
encantadora um universo de risadas, lealdade e esperança conquistada a duras
penas.
Editora : Intrínseca
Páginas: 256
Ano: 2015
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