quarta-feira, maio 16, 2018

sem surpresas (miniconto)






por Rafael Belo

Uma ponte se forma no céu. Eu paro. Eu sempre paro quando algo surpreendente me atinge de repente. Um arco-íris faz as ligações celestes e fico pensando quem atende... Mas sigo em seguida com aquela bela imagem na mente. Chove em algum lugar enquanto outro lugar oposto, do avesso, só assiste, só passa vontade e calor. Falando assim eu pareço a mulher à favor ou a do contra. Não. Surpresas me apavoram. Eu ando pensando só em mim e é assim que vou me curar, passar a pensar no outro nos momentos certos e em mim full time. Neste tempo todo...

Passei a buscar o cotidiano. Passei a gostar do monótono... Mas, chegar ao fim do dia com este espetáculo não aplaudido, não reconhecido, dói... Por isso, prefiro não pensar e tento não sentir. Tento esquecer esta dor e a imagem do arco-íris simplesmente brota na minha mente como se ao invés de íris, meus olhos fossem estas cores originais. Também desejo chuva em mim e fico na imaginação. É quando começo a desintegrar em uma desassociarão total das partes do meu corpo. É o físico indo, a alma expandindo e a solidão chorando em arrepios.

Quando percebi já não sabia mais se perseguia a chuva ou o arco-íris ou vice-versa. Sei ter anoitecido e eu nem amanheci direito ainda. Estou andando em círculos e eu nunca fui de rodar. É muita felicidade ficar girando à toa e eu não sou exibida. Nem feliz a este ponto. Gosto de efemeridades. Coisas constantes me incomodam. É preciso acontecer e acabar entre dois pontos definidos ou nada feito, eu desapareço, mas neste momento me esqueço de quem sou e dirijo procurando a Beleza no céu.

Não quero me surpreender, mas ficar desatenta ao tráfego gera surpresas gerais e nada educadas. Recuso-me a estas diárias coisas surpreendentes ao meu redor. Queria ser deixada em paz, mas como negar a natureza? Como negar minha própria natureza? É uma explosão constante de tentativas intermináveis de me tirar da mediocridade, do comodismo, deste modismo de afirmar não ser comigo... Quero o fácil. Escolhi o fácil e todas as consequências podem vir, mas escolher ter amnésia, viver em um autismo opcional acaba em reações frustrantes... Negar a mim mesma é um conformismo cortante me desafiando a resistir! Preciso descobrir qual lado da resistência é para ceder ou manter... Ah, estou surpre... Nãooo!

Nenhum comentário: