sexta-feira, abril 28, 2017

Um novo eu (miniconto)




por Rafael Belo

Vejo as coisas pela metade não tenho idade para sair pela cidade. Minha sanidade não tem lugar. Minha mentalidade ninguém pode alcançar. Há uma insanidade apontada nas ruas e eu vejo da lua o quanto as pessoas estão nuas. Da lua também vejo as ruas... Estou em mais de um lugar. Não são minhas ideias ou suas. São duas ao mesmo tempo. São do livramento. Um conflito sem entendimento. Personalidades opostas na dualidade interna de mim mesmo. Sinto-me um nevoeiro cobrindo o mundo. Não há superfície nem fundo e vou a um mergulho em um submundo tão particular a ponto de me faltar ar.

Tenho água por todas as partes, não vejo como chegar a minha superfície. Sou estandartes dos seres do mar. Sou imensa uma baleia azul encalhada em mim mesma. Não tenho nome, não tenho fome, mas há um sobrenome insistindo em me levar pelas ondas deste meu mar. Talvez eu seja a anaconda da lenda engolindo tudo, mas me sinto mesmo uma serpente qualquer querendo trocar de pele, trocar quem me adere, mas quem me fere mais sou eu... Preciso me trocar somente e qual a melhor forma de ser diferente, adstringente, inconsequente, resiliente, independente?

Renascer. Querer ser novo. Sentir outra dor e ser outro eu... Não! Um novo eu! Não preciso sair do meu corpo, arrancar meu cérebro, me matar... Quero saber lidar... Com esta dor de ser! Não vou deixar me manipular. Está ouvindo? Não vou!!! Minha vida pode não ser nada, mas não vou me suicidar... Não vou por esta saída inacabada. Preciso focar, encontrar outra estrada e construir minha própria jornada. Preciso desabafar! Ouça-me! Dê-me atenção por um minuto. Saia desta sua bolha de ilusão acústica, se livre desta tua mentalidade rústica da facilidade da vida. Nestas idas e vindas já deveria saber sobre a diversidade dos ângulos desta tal verdade...


Mas será vaidade achar: vai me escutar? Quero viver! Entrosar e desentrosar quando quiser. Não venha me questionar, mas pode conversar, perguntar, quem sabe acredite se importar? Genuinidade pode parecer ingenuidade, mas as aparências ainda seguem sem ser realidade. É tudo tua mentalidade distorcida pela singularidade da sua vida, pelas suas escolhas oferecidas, às vezes a frieza é bem-vinda, necessária, porém, prefiro coisas aquecidas ou entretidas para se aquecer. Lá vem o amanhecer destes dias frios. Deixe- me enlouquecer mais uma vez. Vou nua nestas geladas águas para despertar esta minha vontade de não fazer nada, de ser mais uma escrava da fonte desativada... Vou ativar o céu avistado em mim mesmo estando nublado.

quinta-feira, abril 27, 2017

desativada fonte



minha única necessidade é o teu silêncio
eu falo eu penso eu desafio você
mando a morte companheira retirar a caveira para te ver
uma luz vermelha no fim do túnel para confundir o amanhecer

prendo seus pulsos amarro suas pernas te ato em meu mundo
o seu é meu submundo comandado para eu exercer o poder
manter meus dedos em movimento atento aos estímulos no ser

ceder ao mergulho sem ar no fundo do mar ficar na rede sem se soltar
encalhar na areia azul baleia envenenar tuas veias levar tua aparência a se matar

 você vai jogar suicídio na fonte desativada do litígio com minha água da ilusão.


+ às 11h40, Rafael Belo, quinta-feira, 27 de abril de 2017 +

quarta-feira, abril 26, 2017

Suicídio diário (miniconto)




por Rafael Belo

Todo dia me mato aos poucos. Em você me suicido quando te permito me matar para eu sentir esta falsa aceitação, este falso carinho, esta falsa segurança, este falso amor... Tua atenção tendenciosa muda me cala. Tudo está claro e, claro, eu só podia ser Clara. Tenho medo de perder este tão pouco de você, então meu suicídio é também minha permissão de você cometer homicídio em mim. Morro de qualquer jeito e ainda assim você não estende a mão. Só se aproveita para depois me ocultar, excluir, bloquear, julgar... A vida me chateia e estou alheia a todo acontecimento. Tento entender aqui dentro, sabe? Esta angústia, esta dor, este peso sem fim de não sei o motivo, então me fragmento.

Não sei se aguento morrer aos poucos. Cometer suicídio é um jogo, um desafio me cortando, me fazendo matar outros, envenenando o mundo com a dúvida, a divergência, o poder sobre si mesmo... Suicídio deveria ser rápido. Uma dor só e pronto. Tchau! Mas carrego uma cruz de alguma parte de mim se matando por outro alguém. Este outrem nem sabe e, por isso, me mata de volta. Há tanta reviravolta e, finalmente, participo de algo. Faço parte de um grupo. Alguém me obriga a fazer alguma coisa, alguém me obriga a sentir na pele, alguém me castiga, alguém realmente manda em mim, este é o meu fim. Às vezes tudo me faz sentir magra demais, bonita demais, integrada demais, outras gorda demais, feia demais, excluída demais... Não me encaixo em nada. Clara: 16 anos e esquisita.

Talvez eu seja esta baleia azul e de alguma forma me desafie a finalmente chegar ao suicídio final. Olho no espelho e vejo um borrão. Escuto alucinações, vejo sons estranhos... Será possível alguém querer me escutar? Enxergar-me? Dedicar um tempo para saber quem sou? Meus pais só me cobram coisas e eu? Eu não sou uma pessoa? Não sou igual a eles? Será verdade: eles tiveram minha idade? Por que agem como se tivessem nascido adultos? O mundo mudou muito, mas o comportamento das pessoas ainda segue cruel, querendo impor, precisando expor a raiva acumulada, a humilhação passada, revidar de alguma forma... É possível aguentar sozinha? Não somos todos sós? Daqui vejo tudo. Sinto um poder antes nunca sentido. Sempre me senti diminuída, exposta, pequena e as curiosidade das pessoas é mórbida, além de vaidosa. Todas estão como eu: em uma gaiola sendo observadas, bebendo água suja e hipnotizadas pela correria de ter sempre de entregar produção. Temos noção?


Esta multidão lá embaixo se divide entre o coro de joga, joga, joga, àqueles me xingando tanto por demorar como àqueles por pensar em me matar e, finalmente, os desejosos de salvarem uma vida, de serem heróis ou simplesmente fazendo o trabalho a lhes caber... Não importa nada. Nenhum deles. Não os ouço, não me atingem e não estou enrolando, só estou esperando o sol se pôr e a lua cheia chegar. Veja está quase lá! O Sol se foi... Vem lua cheia, vem... Dia, noite e eu. Eles não vão chegar a tempo e já me matei há muitos dias... Sou sombra da sombra da desatenção. Agora vou correr para o outro lado. Nossa! Não achei ser tão rápida! Clara vai se apagar neste momento. Um breve rodapé fora do sistema.  

terça-feira, abril 25, 2017

Desmergulho



ironiza a baleia azul o comando do jato d’água na superfície respiração
no meio do oceano tudo tem o mesmo tom é um espaço de contenção do som
ninguém escuta a tentativa de atenção onde os cortes no mundo ficam mudos
há muita desproporção para lidar com a transição dos adultos eles nunca estão lá

nosso lar é uma casa engraçada bagunçada por sentimentos desordem danada
nada dá nas conversas desorientadas é uma constante primeira jornada distante
diante das estantes vazias a depressão submersa nos afoga no expressivo silêncio

tensos espaços exagerados gerados da confusão generalizada liberdade é prisão
dimensão paralela na própria realidade acesa na tela manipulando a substituição

a mesma janela nos pula de uma altura pedindo ajuda para conversar ignorar é saltar junto quem sabe empurrar não ver os sinais necessários para respirar.


+ às 23h50, Rafael Belo, segunda-feira, 24 de abril de 2017 +

segunda-feira, abril 24, 2017

Desencalhe a língua preta



por Rafael Belo

O mundo é tão vasto e vivemos presos por uma cerca fraca em um local minúsculo. Talvez até andássemos oferecendo o nosso melhor, mas sabemos qual é ele? Podemos até ter as melhores intenções, mas sabemos qual é o efeito delas? Vivemos jogando vários jogos de azar e nos desafiando em um jogo sem vencedor. Lá fora estão as possibilidades, mas estamos desconectados aqui dentro, por isso estamos agrilhoados com uma corrente inexistente a um local invisível. Gostamos do humor, mas não queremos limites até tudo nos atingir. Nas redes virtuais há um animal real. Uma baleia. Baleia azul. A esta altura você já deve saber sobre o assunto e o vê de qual maneira. Vejo não bastar à incitação ao suicídio vir agradável como desafio da baleia azul. Precisamos ironizar, encalhar a ideia sem nem ter contato com os envolvidos. O mundo está frio. Este calor aparente é isto: aparência. As pessoas estão sim distantes e se alguém pensa em tirar a própria vida: está só sim. É uma epidemia dos nossos tempos. Ao mesmo tempo estamos conectados com tanta gente, somos populares nas redes sociais e estamos em um isolamento social.

O sentimento do outro não vem estampado no rosto, não está nas ironias, indiretas, no cotidiano é um desencadear sorumbático de um banzo moderno feito do que não se teve, do que não se viveu. A minha geração já tinha pouca atenção dos pais. Eles queriam um mundo melhor para os filhos, filhos melhores para o mundo... Foi-lhes pregada uma nova forma de melhor ligada à necessidade inconstante de enriquecer, de dar comodidade, do bom e do melhor, de não querer que os filhos passem privações… Aí ao invés da infância surgiam os cursos intermináveis… Pressões antecipadas da constante capacitação para a sobrevivência dos adultos.

Hoje o acesso ao mundo virtual irrefreável fez os pais libertarem os filhos de quase tudo. Se antes sempre havia alguém para cuidar, ameaças veladas para obediência, até palmadas... Agora não há tempo de estar presente, só compensações. Mas quando se escolhe estar presente, quando não sufoca a cria, deixa ela livre para se fechar, fazer o que bem entender. Cada um oferece aquilo em do próprio conhecimento, do próprio poder...  Não vamos julgar. Vamos cuidar do próximo. Ouvir. A baleia é um ser gigante submerso cheio da necessidade de emergir às vezes para respirar. Azul pode ser confundido com o deslocamento das águas marítimas. Seu sangue quente e vive em águas frias. Ela consegue ficar de 20 minutos a 1 hora sem respirar, mas morre encalhada na praia.


Ela não sua. É o mesmo que sairmos de preto no deserto do Saara ao meio dia. Além disso, o peso extremo dela pressiona seus órgãos e, às vezes, mesmo resgatada pode ser que morra pelos danos. Estes antes aumentaram ainda mais a própria dor. Pré-adolescentes e adolescentes vivem o mesmo como um distúrbio direta ou indiretamente sofrem pressão em casa e do mundo. Quando não tem atenção necessária então… Nós já passamos pela fase ou nunca saímos dela? Tanto faz. Todos temos nossas responsabilidades maiores, menores só sabe medir quem as carrega. Precisamos de privacidade? Claro. Mas, não somos oniscientes, onipresentes e nem aprendemos a ser incondicionais. Precisamos conversar! Vamos conversar! Respeitamos todos, podemos dar espaços para todos, mas precisamos estar atentos e dar atenção para as pessoas. Não temos controle de nada, quem dirá dos outros. Seja parente próximo, distante ou amigos se não for dito nenhum sinal do mundo é o suficiente para termos quaisquer conhecimentos. É preciso de senha para entrar, ou seja, da autorização. Então, vamos nos conectar a vida.

sexta-feira, abril 21, 2017

A melhor de todos os tempos (miniconto)





por Rafael Belo

De repente estava toda bloqueada. Não via mais aquela pessoa com hora marcada. Nem virtualmente ela existia mais. Não sabia o motivo e nem queria saber. Era de olhar para frente e só. Elangela não carregava nada com ela. Sua bagagem era a alma e o coração livres. Quando amasse uma pessoa ainda assim seria livre, aliás seria mais livre. Assim pensava e assim agia. Por isso, mudou os rumos quando o encontro marcado se perdeu horas antes de acontecer. Foi um achado sair sozinha e encontrar uma oferta do Destino. Nunca bastou querer para dar certo, ela pensou. Mas insistir no seu acreditar e capacitar o mundo para te receber é o suficiente, sorriu sozinha.

Sou atriz e “de repente” descubro alguém influente assistindo minhas esquetes no Youtube. Trabalhar em filmes e séries? Será necessário mostrar espanto ou naturalidade? Sério?! Deixei de ser a ovelha negra escondida a discordar do mundo e das modas...? Não tenho reação, mas preciso responder rápido. – Nossa! Claro! Muito obrigada!, respondeu se atropelando. Eu nem imaginava... Uma oferta despertar... Despertar-me. Preciso respirar. Quanta libertação!!! Não imaginava isso ser um incômodo na minha vida. Quanto alívio. Estou leve. Sinto-me brilhante, iluminada.

É um Amor por mim. Isso é reconhecimento? Não! É pouco! Sou eu reconhecendo minha vontade de ser conhecida, de interpretar, de atingir as pessoas com um pouco delas mesmas. Isso é Beleza!!!  Sou um espelho de Luz. Quantos sorrisos contive, agora já não me contém. Preciso falar para os meus. São tantas pessoas passando na minha mente. Será mal interpretado meu silêncio? – Olha! Não imaginava mais isso na minha vida. Ainda mais ser revelado assim, em uma ambiente desse... Sei. Eu estava me sentindo sozinha, abandonada. Só um pouquinho e estava aqui silenciosamente ruminando a mim mesma, tudo aquilo responsável por meu eu agora. Volto a acreditar nas energias do Destino!, Você tem toda minha gratidão, disparava Elangela.

É assim... As pessoas desimpedidas e sonhadoras se sentem desta forma quando se realizam? Se não for deveriam. Ah, deveriam sim! Deveriam muito!! Poderia ser uma regra... Eita! Quanta euforia... Estou efusiva a ponto de me sentir ludibriada. É mais uma descoberta de mim? Preciso me distancia para enxergar este momento... Não! Para! Agora vou aproveitar e estar toda nisso! Agora já passou? Será possível passar? Incrível!  Sem se conter, Elangela, levanta e abraça a mulher dona das suas boas novas. Depois levanta e sai correndo. Todos olham para aquela explosão de sentimentos intensos misturados. Preciso gastar esta energia vou gravar uma nova esquete. Ah, vai ser a melhor de todos os tempos!

quinta-feira, abril 20, 2017

orvalhos



morremos nós todo o dia para ressuscitar na virada do ano
desatamos tantas desnecessidades a perder o tempo se formando
chovemos senões sermões inundações então até o entendimento brotando
somos sertões silenciosos temendo novas secas erosando

cerco a cerca caridosa com carinhosos espinhos disfarçados flores despetalando
o caminho é diferente para cada querer crente em si leviano
vi as nuvens nubladas negando se desenhando com céus chorando

veio a bonança no meio da tempestade sem tempo nem distância contudo contendo toda a esperança
temos vontades sendo a única verdade vista quando habitamos o coração do outro com o nosso habitado

há um estado elevado dentro de nós revelado quando percebemos sermos o orvalho de todas as manhã.


+Rafael Belo, às 20h02, quarta-feita, 19 de abril de 2017+

quarta-feira, abril 19, 2017

Ser infeliz em Paris (miniconto)



por Rafael Belo

Tudo havia mudado em um dado momento negado por ela até aquele questionamento. Darila sempre usou sua vontade de querer dar certo para o fazê-lo. Ela sempre acreditou ser assim. Mas, fora do mundo dela havia outras vontades incompatíveis, suscetíveis apenas a autoimolação, a autopiedade, a autoexaltação, a autopreservação, a apropriação, a própria querência… Foi mais uma falência institucional.

Nunca houve desilusão igual e jamais haveria. Cada um se desilude ao próprio jeito e gesto. Um dilúvio literalmente caiu sobre ela. Darila ignorou os sinais do tempo, o vento e se molhou sem nem ter percebido a saída para a chuva. Descabelada e encharcada chafurdava nas lembranças vendo só agora: só ela queria se ex só não queria começar tudo de novo. Estava cômodo e ela já vinha sentindo o incômodo há muito tempo. Ela já não queria o tal do dar certo basta ter vontade. Queria mesmo era liberdade e ser feliz.

Pegou seus documentos e foi. Não disse nada. Não queria nada muito menos ficar ouvindo monossílabas bovinas. Chega de hummm, hummm, hummmm… Não ia se justificar. Só devia a ela mesma. Não queria falir também. Não era mais ela mesma, mas ele era o mesmo… Resolveu aceitar o emprego em outro país. Aquele tão sonhado de tradutora. Foi ser infeliz em Paris. Deixou o bilhete considerado ingrato e covarde pelos donos dos “eu avisei” da família e amigos dele e digerido em silêncios pelos “como eu não percebi” dá família e amigos dela. Ela tinha vergonha de não ter dado certo. Foi passar um tempo redescobrindo ela mesma.

Darila simplesmente ignorou as ligações, mensagens e whatsapps… Depois de um tempo, gravou uma mensagem “explicando” e fez o impensável: jogou fora o celular. Rodou Paris, cada vez menos infeliz. Fez o que quis e o que não quis também para experimentar. Tatuou “basta ser você, não precisa dar sempre certo” e toda vez no momento da dúvida respirava fundo e olhava para o incentivo/lembrança. Nunca mais voltou para o Brasil. Há alguns dias voltou a usar o celular, sem nunca nem mandar um whats “internacional". Não queria um passado zumbi tentando devorar seu cérebro de novo. Estava em Paris cada vez menos infeliz. Seria feliz?, se perguntava. Até se autoirritar e falar exaltada, considerada louca só pelos brasileiros locais por erguer a voz: Vamos por partes como Jack… Depois rir pensando o quanto era sombrio pensar no estripador na terra dele. Nunca descobriram quem era o serial Killer… Espera! Foi em Londres. A terra dele era Inglaterra... Estou confusa agora ou ... Calma! Torre Eiffel? Não! É o Big Bang!!

terça-feira, abril 18, 2017

morremos nós




corre ao meu redor o suor do passado o odor do tempo
um esquecimento voluntário do autismo opcional
naquela moeda de um só lado a qual sou eu cedendo
fazendo o meu som solitário de árvore caída em floresta densa por igual

quem escuta a permuta entre o bem e o mal?
qual o tamanho da área cinzenta do certo e o errado se remoendo?
quanto mede a culpa da negação da aceitação do principal?

quantas perguntas ficam sem resposta acessível se fazendo
o controle se descontrola no inesperado desejo do impossível se desfazendo

não basta querer ignorar a gravidade dos livros e voar batendo só as asas rompendo os ares sendo vento
há uma liberdade arbitrária da vontade sedentária do outro sedento
sem respeito o próprio reconhecimento leva nossa voz  e morremos nós
o orvalho se forma nas folhas mornas nos sendo e nós nem chovemos.

+às 00h16, Rafael Belo, terça-feira, 18 de abril de 2017+

segunda-feira, abril 17, 2017

não depende só de nós



por Rafael Belo

Há um pássaro pousado lá fora em um tronco da cerca de arame farpado. Ele me olha nos olhos. Posso sentir. Ele pode voar, mas continua ali encarando. Não depende só de bater as asas. As milhares de penas leves, flexíveis, duras e resistentes são os principais motivos, mas a aerodinâmica do corpo, o esqueleto, a musculatura, o modo de vida e o habitat ajudam a ignorar a gravidade. Nós não somos tão diferentes. Estamos pousados dentro de nós voando engaiolados pelo detalhe do plural na frase: a gente pode fazer dar certo! Aprendi! Não bastam só palavras e vontades para dar certo. O tal do certo também pode ser errado.

Durante muito tempo eu fiquei voando em círculos em mim mesmo usando esta frase de efeito. É claro, eu posso fazer dar certo. Mas quem é este certo? O meu certo é o seu certo? Não são suficientes experiência e conhecimento. Não é mais agradável voar sem rumo voltando para onde é seguro. Há tantos fatores ajudando o voo acontecer, mas precisamos pousar, descansar, entender ao menos nós mesmo antes de voar novamente. Querer é um belo de um poder, porém se há outra pessoa envolvida dois quereres se bicam um bom tempo até perceberem não pagarem o preço da liberdade.

A gente faz dar certo não é nem meia verdade. É você ter vontade de tudo acontecer da melhor maneira possível (para você mesmo). É uma forma de controle ou negação porque se estamos falando de Amor se passaria em nós aquela liberdade, aquela vontade do melhor para o outro, independente do nosso querer. Por isso, é uma verdade por inteiro apenas quando depende só de nós. Eu já acreditei nesta frase. Já o disse. Podemos fazer dar certo se a gente quiser...  Era quase um mantra. No entanto, temos sempre algo quebrado em nós negligenciado, ignorado, deixado nas sombras como um hematoma maquiado no olho, disfarçados nos óculos escuros.


Se não estamos nos sentindo bem, a gente precisa voar e ser independente sem qualquer tipo de cobrança. Este é o motivo de termos total confiança em nós mesmos. Fazer acontecer começa quando nos fazemos acontecer. O primeiro relacionamento é no nosso interior. Não podemos ir à onda da obrigação ou somos constantemente afogados quando levados para o fundo do mar sem nem perceber a morte do nosso ser. O meu objetivo é ser o passarinho amante da liberdade querendo amar alguém igualmente livre sem nada prender. Só vontade não faz nenhuma asa bater.

sexta-feira, abril 14, 2017

O apagar das luzes (miniconto)





Por Rafael Belo

o blecaute era global. Sem motivo algum. Estava tudo funcionando normalmente quando aconteceu há exatos 30 dias. No ano anterior o sol mal apareceu. Foram quase 300 dias chuvosos. Lógico. Os conspiradores e seus teóricos teciam fins do mundo diários. Mendigos e histéricos levantavam placas hollywoodianas do apocalipse, da segunda vinda de Cristo, da Terceira Guerra Mundial, saudações aos extraterrestres e outras quase loucuras assim. Marilau Mires, estava observando o mapa  criado por ela. Lá constava hora, local, situação no momento no qual se iniciou o apagar das luzes. Sim. Não foi geral como o Governo quer impor à nossa sutil imbecilidade.

Demorou cada um dos inteiros 30 dias para Lau conseguir chegar ao ponto na qual a deixamos. Nada funcionava. Nada, nada e nada. Nem wifis nem dados nem sequer ligavam os celulares. Lau ligava os pontos e quando seu raciocínio estava prestes a acender, uma luz ofuscante veio cegar. Tão forte estava a procura a ponto de Lau se sentir entrar em combustão. Algumas coisas espontaneamente explodiam ou se consumiam. Foi como um concussão  após estar correndo e bater de cabeça em um multidão de cabeças duras. Claro! Cair depois e a queda não levou as habituais mãos primeiro. Foi a cabeça a chegar lá antes de novo.

A mente de Lau se iluminou como um farol. Tudo parecia se conectar e doía parecia uma cirurgia sem anestesia nos olhos abertos incapazes de fechar. Sofrimento e terror… Quase uma retomada de jogos mortais. Ela se lembrou de quando era criança e viu um pássaro escondido entre as folhagens no chão. Ela quis ser “invisível" daquele jeito. Lembrou quando brigava por política, quando jogava futebol e era violenta com os inimigos - porque para ela nada era amistoso. Lembrou de quanto julgava ser religiosa, mas acreditava um pouco em cada religião… Foi quando estudou por si mesma e…  Descobriu: ações são orações e não há em nenhum lugar o decreto de fundar segmentações religiosas contraditórias manipulando o Amor. Contudo, ela defendia: alienação não é religião é acreditar em ideais partidários. Ela nem tinha 18 anos na época… Já andava na contramão.

Ela levantou da queda e olhou em volta. Não era nada parecido com nenhuma Sexta-feira Santa ou Sexta-feira da Paixão. Lau estava ali em pensamento e emoções observando tudo com tanta clareza mesmo com a escuridão ali: viva e independente. Talvez ela realmente fosse a alienígena tão acusada de ser... Mas, agora seu agora era mais intenso. Ela se sentia sob o holofote mais forte do  Twilight Zone. A vida dela sempre tinha sido assim: um convite para olhar pela janela do universo. Antes as pessoas ignoravam, porém desde o início do blecaute, este apagar das luzes parece ter deixado apenas ela acesa. Neste instante ela ouve a porta bater. Ela hesita em atender. Lau sabe! É mais um alguém querendo uma explicação dela sobre si mesmo, sobre o apagar das luzes (assim a mídia vem chamando o evento sem fim) e, impossivelmente, Lau nunca viu a pessoa, mas a conhece como ninguém. Neste momento seu corpo sangra, principalmente, pulsos, canelas, couro cabeludo e tórax.

quinta-feira, abril 13, 2017

próprias mãos



o outro ouve ouro mas é mais um mantido na manada
não é outro é o mesmo corpo maltratado prata da casa ignorada
parte de degraus escada para o nada não é pedra é almofada
um amortecimento da anestesia vendida em cada esquina liberdade de fachada

valoriza a fogueira das vaidades chamuscando falsos donos por dentro
o orgulho oportuno dá um mergulho no escuro profundo da superficialidade
não há ninguém de verdade nestas covas rasas valas da exaltação do sou bom

pirataria é falsificação do dom quando o sono de outono vai cair sem chegar ao chão
estou a dormir mas não fecho os olhos não vou invadir a minha paixão
desistir da ilusão de seguir repetir o passo de quem está ao lado preso em tantos laços indo na mesma direção
pisando passos partidos pelo perdido passeio alheio da manada manifestação muito jogada está em observação a debandada do eu a ação da destruição da autenticidade da personalidade do outro em vão
mataram nossos irmãos com nossas próprias mãos.


+às 13h01, Rafael Belo, quinta-feira, 13 de abril de 2017+

quarta-feira, abril 12, 2017

Sensação sem nome (miniconto)




por Rafael Belo

Aquela lua cheia encheu o mundo, mas foi ela, e somente ela, a maré. Aquela realmente estava mudada. Quando a lua cheia chegou no meio da noite, Luarara transbordava. Todo o vestígio de pirataria naufragara e o restante do mundo sucumbiu. Toda a falsificação pôde emergir e tomar conta. Mas, Luarara esta autêntica, segue única. Ela perdeu o orgulho e a vaidade. Não precisaria se preocupar com a inveja mais. Só ela havia tomado a pílula azul. Apenas Luarara se desgarrada e deixara a manada. Ela percebia o fim chegando em todos os sentidos e pensava se iria ao encontro, de encontro ou seguia junto.

Havia silêncio. A respiração parecia um vendaval, mas Luarara estava tranquila. Aqueles passos pareciam cavalos trotando e ela sempre considerou caminhar como um anjo... Ela ouviu ecos assustadores parecendo estrondos. Tratratratrá, tratratratrá, tratratratrá... Cada vez mais próximos. Estava escuro demais até apara definir contornos, apesar da lua cheia. Alguma coisa estava completamente errada e ela lembrava as histórias contadas sobre os exércitos invasores. Precediam silêncios antes da gritaria. Antes do cerco total uma sombra parecia cair como um manto acústico isolando cada som como uma perturbação psicológica enlouquecedora.

Por uns instantes, Luarara, se perdeu, tremeu e quis gritar. Um horror tremendo a bolinava, arranhava sua garganta, apertava seu peito, sentava nos seus pulmões, saltava nas suas costas e se jogava no estômago como se fosse uma legião foragida rejeitada no inferno. Parecia uma possessão demoníaca em hordas consecutivas. O medo estava travando uma batalha com ela e o som daquele exército invisível se aproxima, se aproximando, se aproximou... Luarara suspirou, respirou fundo, fechou os olhos e tudo parecia escuridão igual, total, ela tremeu incontrolavelmente e sentiu todo aquele peso ter uma negatividade, algo péssimo, querendo juntamente o descontrole, o desespero...


Ela desejava parar de tremer, mas dentro de si havia uma força maior irrompendo, clareando, expulsando aquela invasão. Aquelas presenças a tocando simultaneamente pareciam nunca ter existido. Luarara ergueu a cabeça e desentrelaçou as mãos. Não havia percebido esta posição de oração. Será? Ela havia orado pela primeira vez? Para quem? Para o que? Estava sozinha, mas esta solidão consciente iria afetar a todos, eventualmente. Ela não enxergava mais ninguém, mesmo quem estava diante dela. Também não sentia o toque da manada. Parecia um fantasma assombrando àqueles na escuridão ainda a enxergando... Ela sorriu em ironia e aquilo pareceu dissolver de vez esta sensação sem nome. Agora precisava encontrar outros, não queria ver mais só a si mesma.

terça-feira, abril 11, 2017

falsa autêntica



corrói cada comportamento maquiado minimamente manada
disparada decididamente dolorida pela pista perdida
vai vaidosa vendo vento voltando velozmente esquecida
atrevida autoriza agressores a fazerem feridas a facadas

cansei dos banguelas do dente por dente da cegueira do olho por olho oferecidas
no extremo orgulho condescendente detalhes são abismos disfarçados de escadas
do topo da impunidade são todos punidos por pura loucura incitada

sinceramente a honestidade está aprisionada na preguiça permitida
pintada na anestesia da risada do nada destacada na fachada

a incerteza da dúvida é uma luxúria injuriada adorada pelo muro pichado
adultera a intensidade com palavras trocadas em balidos em mugidos embalados coagidos pela autenticidade falsificada.


+ às 01h15, Rafael Belo, terça-feira, 11 de abril de 2017 +

segunda-feira, abril 10, 2017

Sobre ainda ser manada



Por Rafael Belo

Demorou para eu enxergar o outro como outro. Mesmo sem saber, este sempre foi uma extensão de mim, de cada um de nós. Tantos os considerados positivo ao dito negativo eram reflexos dos meus pensamentos, dos meus ideais, das minhas expectativas, sabemos disso, mas superficialmente e preferimos ignorar. É fácil ler o discurso de aceitação geral e agir totalmente diferente. Fazemos isso. Não negue. Basta ler os posts, os comentários, o compartilhar por aí e depois conversar com as pessoas. Vivemos em negação.  Não perdoamos, não seguimos em frente. Guardamos para nós. Somos falsos cristãos, falsos moralistas, falsos crentes... Usamos nossas virtudes para julgar o outro. Seguimos corretos no trânsito e vamos crucificando o errado desejando a punição deste, mas não porque é lei, porque é justo, mas para exaltarmos nossa retidão.

Quanta petulância a nossa achar sermos o conserto do mundo se não nos descobrimos quebrados, apontando o dedo disfarçando como comparação. Falamos dos “defeitos” e para compensar enumeramos “qualidades”. Armazenamos a raiva e qualquer poeira pode ser a gota d’água. Divergências viram guerras e vivemos uma falsa liberdade... Escrevi tanto falso aqui... Mas é por aí. Nós falsificamos nossa realidade, pirateamos todo o nosso redor e somos tendenciosos aos nossos interesses. Só podemos ser menos invejosos, chegar a quase sabedoria, reduzir o orgulho, zerar a luxúria quando pararmos os joguinhos.

Vivemos jogando com nós mesmos partidas intermináveis onde todos perdem. Sustentar falsificações, piratarias e tendências causam exaustão, perda de memória, solidão... Tornamo-nos carentes e desconfiados colecionando um desperdício recorde de oportunidades, chances de recomeçar ou terminar o jogo. Estamos de patins correndo na esteira. Estamos mortos... Vivemos paranóicos ou em um estou nem aí forçado vazios nos relacionamentos e também quando em nenhum. Solteiros esbanjando o quanto é bom ser solteiro? Sério? Namorados exaltando a perfeição da vida a dois? Casados mostrando a superação diária em dupla dos desafios do mundo? Pode isso produção? Queremos um aval, uma comparação para dizer: há pessoas, há casais, há casados piores por aí...

Condescendentes ao extremo e orgulhosos nos detalhes vamos vaidosos vendo notícias – implícita ou explicitamente – nos incitar a cegueira do olho por olho, mas não pela informação em si, mas porque não podemos permitir ninguém impune. Onde está a sinceridade e a honestidade puras, distantes dessas buscando audiência, aceitação, seguidores, adoradores...? Cansei de quem não sai do muro, de quem fica na dúvida e de quem não arrisca... Ando com preguiça de quem não se entrega, de quem não está presente, de quem não demonstra interesse nem intensidade e de quem não respeita o outro. Vale à pena a aceitação e descoberta de si, a liberdade do outro e a autenticidade de cada um. Todo o resto é ainda ser manada.

sexta-feira, abril 07, 2017

Não vai sobrar ninguém (miniconto)




Por Rafael Belo

Atrás da grade invade aquilo onde traz capaz a voz algoz de estar a sós e nós aqui no jardim, presos assim um ao outro, obrigados a sentir diante de tanto mentir a resistir em mim. Este fingimento louco pra quem só não está além da frieza é pouco, torto, todo tristeza. A fraqueza de amar corpos e dar apenas golpes em si. Como dizer o meu penso sem ferir sem derrubar... Quando passei a me importar? Dispenso outras formas de amar. Estou chacoalhando a grade com o olhar enroscada nas folhagens, tentando disfarçar minha intensidade. Não há integridade a me juntar.

Quando fugi daquele lar onde nem sabem meu nome? Eu, lá, na multidão a gente se esconde porque sou muitos eu’s em debates, na fila do abate... Vejo este nome, vem e some... Não é meu: Girula Gariah. Sou uma legião de mulheres, uma falange de garotas... Demônio Anjo, não sou uma coisa só. Já prendi, mas nunca matei... Até me arrependi quando invadiram minha delegacia só para explodir. Consegui me preservar, descarregar minha arma... Mas, era tanta raiva... Quando as balas acabaram sangrei minhas mãos, aliviei minha dor, mas me acabei... Fui acusada de imprudência, exonerada... Não tive paciência.

Minha aparência julgada, meus atos expostos... Não era mais delegada. Tentaram me reduzir a nada... Fizeram jogos... Escrava do sistema, tema de Meme, meu sonho de PM acabou. Mas, aqui estou eu: tratada como Zé Dirceu. Executando uma missão. Detonando mais uma facção. Não sou ninguém, nada. Toda a mídia orquestrada para minha “delatação”... Fui deletada. Ou você acha ficção os filmes de ação com espião? Fui encontrada morta, enterrada, mas nunca viram meu corpo, meu rosto... Virei um estorvo e logo passei pela espiral do silêncio. Penso e não existo, mas desisto de fazer o tal do certo. Qual o critério? Se só parece sério quem quer a autopreservação.


Minha missão morreu. Não encontro a chave das algemas. Não posso voltar para o sistema, então me resta a prece e a pressa de tirar este peso morto do meu pulso. É muito barulho, mesmo escuro o som faz a direção apontar para você. Posso fazer tanta coisa, mas não é viável. Está tudo tão instável e ainda nem cheguei aos 30. Vou me virar. Talvez voltar para o lar de onde fugi. Não agredi ninguém. Amém. Fingia ser muda, surda e toda turma acreditava. Se fosse outra época, a seta não estaria certa sobre mim. Assim, eu não carregaria um homem morto todo dia, ainda mais um pai de família. Este seria o próximo tampão da nação, ou melhor, presidente tampão. Agora há só um vão para eu não me juntar a ele. Já estou morta, mas se ficar aqui, anota, é o fim. Não vai sobrar ninguém já conhecido por mim.

quinta-feira, abril 06, 2017

nos ser



procura beleza com os sentidos
os olhos são cegos o tato insensível
é o sentimento descontaminado a enxergar
um tocar Almas mentes corações só assim é possível

saborear o viver deixar de ler o roteiro do entreter
ver a emoção vazar sem noção pelo vão inacessível
cada indizível fato fica invisível sem ninguém de fato entender

quem somos nós nos nós nocivos vítimas do nosso vitimismo inadmissível
crível dos abusos nos usos manipulados lado a lado ao libertar sem convencer

vencer a si mesmo tecer sem medo o caminho sem enredo para fora de si até a própria Beleza incrível nos ser uma flor no deserto certo de primavera florescer.

+01h30, Rafael Belo, quinta-feira, 06 de abril de 2017+

quarta-feira, abril 05, 2017

Flor intermediária (miniconto)




por Rafael Belo

Lá estava ela na mesma cela. Não tinha vitória nem escapatória. A cela era ela. É ela foragida, escondida nas próprias folhagens... Presa em si mesma, flor intermediária. Nem brota nem morre. Ainda assim é bela. Flor de Liz Maria não resseca, mas é metade de si porque é completa sem saber. Soube ser corpo, outras flores, outros corpos e matérias. Agora é aquela com outras flores em si, outros brotos, mas todos ela. Estava toda empoderada, mas a sociedade canalha veio machista e abusou dela. Liz fechou portas e janelas: não aguentava. Desesperada pegou a arma, vestiu a mortalha quando a malha da escuridão enlutou seu coração e nublou sua mente.

Ela matou e matou e matou... Mais uma vez morreu! Sentiu a serpente drenar seu sangue e injetar a peçonha direto nas veias. Estava fria. Estava morta. Logo ela, na cela... Não era mais a mais nova juíza. A nova Dama de Ferro executora fora executada por um bando de gralhas, abusando dela fora dos tribunais. As famílias dos marginais, pais... Queriam olho por olho, ficaram cegos e no fim mataram a alma de Liz... Ela nunca quis fazer nada além da Justiça. De realizada a vazia. De exemplo de justiça a justiceira aprisionada, mas estava mesmo toda acorrentada em um abismo.

Hipócritas, consolavam com preciosismos, otimismos... Nada adiantava. Usaram da força física para a fazerem se sentir um nada. Abusada, violentada de todas as formas... Seus colegas de toga só chegavam até sua porta para atacá-la, arrombavam toda aquela força, mas fisicamente não adiantava... Ela atrapalhava os esquemas, cada novo estratagema era uma nova gema separada da clara. Um atrás do outro, nenhum escândalo parava. Mas, apesar da vaidade, sua qualidade reinava, imperava sua jornada paladina Deusa Thémis. O povo já idolatrava, colegas corrompidos e políticos a odiavam. Ela estava limpando o Brasil. Liz não imaginava como estava o fim do túnel.


Depois de óbvias palavras clichês focando as emoções de marginais e ladrões, a população se converteu. Quem antes abusava, roubava, agora era vítima e a deusa virou diaba. Mesmo assim, ela se sentia imaculada e seguia com a própria jornada, caminhava a estrada escolhida... Não esperava ser esfaqueada na surdina, ter sua cabeça prometida e pendurada e toda a opinião sobre si manipulada. Chegou a sua cela, apenas quando a ideia medieval de violação da alma, invasão da psiquê rompeu quem era ela. Ela matou e matou e matou... Depois morreu de novo. No fundo das suas folhagens ainda é possível ver a imagem misturada de quem foi, mas ela nem se pergunta isso. Ele pensa maior, não pensa só. Ela escreve por toda cela dela: quem somos nós?

terça-feira, abril 04, 2017

estilhaços



fatos fragmentados fogem do contexto
ficam no rodapé das fachadas dos textos emocionais
espalham virais em chuva de sais ornamentais
fakes formais tão reais quanto acreditam ser

reconhecer dos corpos materiais desejados achados presos nas redes sociais

abusados em amares rasos descasos normais em palavra
escrava de um pensar libertar intencionais no espaço
estilhaços de espelhos inchados ao amanhecer

parados diante de todas as formas oficiais estanca quem somos nós
intimamente lentos observando cada mente veloz acontecer sem nem existir.

+às 00h14, Rafael Belo, terça-feira, 04 de abril de 2017+