Por Rafael Belo
o
blecaute era global. Sem motivo algum. Estava tudo funcionando normalmente
quando aconteceu há exatos 30 dias. No ano anterior o sol mal apareceu. Foram
quase 300 dias chuvosos. Lógico. Os conspiradores e seus teóricos teciam fins
do mundo diários. Mendigos e histéricos levantavam placas hollywoodianas do
apocalipse, da segunda vinda de Cristo, da Terceira Guerra Mundial, saudações
aos extraterrestres e outras quase loucuras assim. Marilau Mires, estava
observando o mapa criado por ela. Lá
constava hora, local, situação no momento no qual se iniciou o apagar das
luzes. Sim. Não foi geral como o Governo quer impor à nossa sutil imbecilidade.
Demorou
cada um dos inteiros 30 dias para Lau conseguir
chegar ao ponto na qual a deixamos. Nada funcionava. Nada, nada e nada. Nem
wifis nem dados nem sequer ligavam os celulares. Lau ligava os pontos e quando
seu raciocínio estava prestes a acender, uma luz ofuscante veio cegar. Tão
forte estava a procura a ponto de Lau se sentir entrar em combustão. Algumas
coisas espontaneamente explodiam ou se consumiam. Foi como um concussão após estar correndo e bater de cabeça em um
multidão de cabeças duras. Claro! Cair depois e a queda não levou as habituais
mãos primeiro. Foi a cabeça a chegar lá antes de novo.
A
mente de Lau se iluminou como um farol. Tudo parecia se conectar e doía parecia
uma cirurgia sem anestesia nos olhos abertos incapazes de fechar. Sofrimento e
terror… Quase uma retomada de jogos mortais. Ela se lembrou de quando era
criança e viu um pássaro escondido entre as folhagens no chão. Ela quis ser
“invisível" daquele jeito. Lembrou quando brigava por política, quando
jogava futebol e era violenta com os inimigos - porque para ela nada era
amistoso. Lembrou de quanto julgava ser religiosa, mas acreditava um pouco em
cada religião… Foi quando estudou por si mesma e… Descobriu: ações são orações e não há em
nenhum lugar o decreto de fundar segmentações religiosas contraditórias
manipulando o Amor. Contudo, ela defendia: alienação não é religião é acreditar
em ideais partidários. Ela nem tinha 18 anos na época… Já andava na contramão.
Ela levantou da queda e olhou em volta. Não era
nada parecido com nenhuma Sexta-feira Santa ou Sexta-feira da Paixão. Lau
estava ali em pensamento e emoções observando tudo com tanta clareza mesmo com
a escuridão ali: viva e independente. Talvez ela realmente fosse a alienígena
tão acusada de ser... Mas, agora seu agora era mais intenso. Ela se sentia
sob o holofote mais forte do Twilight
Zone. A vida dela sempre tinha sido assim: um convite para olhar pela janela do
universo. Antes as pessoas ignoravam, porém desde o início do blecaute, este
apagar das luzes parece ter deixado apenas ela acesa. Neste instante ela ouve a
porta bater. Ela hesita em atender. Lau sabe! É mais um alguém querendo uma
explicação dela sobre si mesmo, sobre o apagar das luzes (assim a mídia vem chamando
o evento sem fim) e, impossivelmente, Lau nunca viu a pessoa, mas a conhece
como ninguém. Neste momento seu corpo sangra, principalmente, pulsos, canelas,
couro cabeludo e tórax.
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