quarta-feira, abril 16, 2014

Cláudia não era sem sal (miniconto)

por Rafael Belo

Acordou chorando como se tivesse nascido naquele momento. E de certa maneira aquele velho novo rebento ainda estava nascendo. Segurou tanto tempo seus prantos a ponto de, vez ou outra, sair aloprando. É! Estava enlouquecendo. Achou ter quebrado a ponte entre sua imagem e seu eu. Sua emoção e sua razão, ele acreditava, não se batiam e estavam distantes. Aliás, Cláudia, se dizia fria e vendia tal absurdo. Mas, não naquela hora. Ao acordar de madrugada ela chorava todo um oceano antes contido.

Amanheceu e o choro continuava. A manhã passou em lágrimas. À tarde ainda soluçava. Dormiu assim, mas ainda chorava. Este chorar durou uma semana. Cláudia ainda se sentia recém parida. A recém-nascida olhava o mundo com aqueles olhos de criança. Uma nova inocente transgressora. Com os olhos brilhando só sorria. Era outra sendo ela. Tanto era... Ninguém a reconhecia. Nem a mãe... Nem o pai. Até os irmãos estranharam. Acusaram-na de estar apaixonada. Estava amando. Cláudia não retrucava. Ficava sorrindo em silêncio brilhando.

Claro. Estava apaixonada. Amando bem certo. Seu Amor era ela. Agora se conhecia. Antes nem se gostava. Porque ninguém gosta do desconhecido... E apesar de diferente, Cláudia não era diferente. Mas ela sempre fingiu se amar. Porém, era sempre assim no minúsculo. Uma palavra sem substância, sem substantivo, sem verbo... E tudo saído dela também saia assim... Sem qualquer pontuação ou contexto. Um constante pretexto para ser o inexistente. Gente sem choro, sem vela.

Quando a pegaram chorando, ela ria. Respondia as infindáveis questões com lágrimas de ironia. Sempre haviam e haveriam situações a tocarem seu coração e ela desceria do muro... E ela tomaria partido e também derramaria o copo d’água. Perderia, aos poucos, as medidas, os pesos, as manias. Queria ser uma página em branco por dia, mas não deixaria esquecer (esquecerem) todas as referências. Depois sempre saia. Cláudia partia como quem acaba de sair do mar sem se banhar em água doce. Estava agora temperada, salgadinha. 

2 comentários:

José María Souza Costa disse...

Olá, tudo bem ?

Que os anjos do céu, contemple a sua quarta feira, com o sorriso reluzente da Paz e da Compreensão. Afinal, somos todos pecadores.
Abraços

Anônimo disse...

Lágrimas sempre. Fazem bem ao coração ....doces...salgadas....Bj no coração. Mamys