Mais
uma salva de palmas, reverências e com o corpo curvado – mesmo assim – o nariz
seguia empinado. Os pensamentos, embora inebriados no momento, ainda eram egoístas,
prepotentes, arrogantes de quem sempre merecia mais. Os olhos fechados se espremendo
em cada respiração curta de momentânea satisfação. Mas, os olhos. Ah, aqueles
olhos seriam vermelhos se os sentimentos tivessem cor.
Foi
espetacular o espetáculo. Toda pompa e glória transmitida em mais um fim de
ano, a bebedeira e aqueles showzinhos
particulares que ninguém quer presenciar, mas acaba obrigado... Enfim, o único objetivo
para Pietra Nature eram os aplausos, o reconhecimento, as palavras floreadas,
recheadas de elogios, uma massagem diária no ego já inflado e alçador de voos. Qual
outro motivo de ser atriz?
Não.
Nesta noite já revirada, nesta transição marcada pela festa e pelo calendário o
tempo seria diferente. Ela será forçada a parar de atuar. Esta noite ela deve
revelar o desequilíbrio, a psicopatia... Nada de loucura... Ela planeja,
calcula, elabora e tem total consciência de cada detalhe... Nem se quisesse os
deixaria escapar. Ela é obcecada com a ideia de ser sempre ignorada por mais
elevada que seja pelo público e pela crítica.
Eu
a ouvi várias vezes para acreditar. Ah, como ela é boa, mas sei não saber quem
ela é nem você nem ninguém. Sozinha no banheiro, provavelmente de frente a
versão dela, ao reflexo no espelho de 2m por 2m, ela esbraveja coma inventora
da razão, a deusa para quem todos devem orações, pedidos, agradecimentos e
sacrifícios. Naquele banheiro os amigos dela não suportariam nem os pensamentos
que ela revela.
Quando
descobri queria acreditar ser mais um ensaio da minha mãe, mas raiva, o
sentimento de injustiçada, desrespeitada.... Estes nunca dirigidos a ela estavam
impregnados, envenenavam cada vogal, toda consoante daquela voz pontual que eu
não tinha como dizer ser de outra pessoa. Todo dia o banheiro se fechava no
mesmo horário com Pietra dentro, porém acaba agora.
Venham
comigo! Vamos revelar... Todos somos assim: pedras atiradas em nós por nós
mesmos. Espinhos e agulhas infiltrados delicadamente sob as nossas unhas
diariamente... Uma construção inacabada de máscaras declarando: Cada roupa que
vestia era uma fantasia. Ela mudava de comportamento, de sexo, de voz, de tom,
de aparência... Por mais que acreditasse ser sozinha era uma legião quando
projetava o olhar mortal sobre nossas costas frágeis, porém quando sorria era
uma falange e até coro celeste era possível ouvir, mas vivia em dúvida e acabava
multidão.
Todos
pensam ser uma ilha convidando quem quer para entrar e vivemos lidando com uma
contínua invasão esquecendo ser isto denominação de arquipélago com problemas
de identidade e localização como toda sociedade, mas como minha mãe somos
péssimos alunos quando se trata de nós mesmos.
Um comentário:
Muito bom! Parabéns!
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