por
Rafael Belo
O cheiro sempre
chega certeiro, primeiro, antes de quaisquer outros sinais. A inquietação soma
consoantes e vogais para a emissão dos grunhidos sequenciais ... Advertências
demais. Uma gritaria em outra língua e nada mais. Vai mexendo a cabeça...
Talvez entorpeça e enlouqueça fingindo só comer e dormir, comer e dormir e
comer e dormir.
Focinho de
porco cheio de ouro e diamantes especiais para fora da cerca, para que não nos
perca. Mexe, remexe, chafurda e se joga na lama, cama da fama sonhada por poder
sem nos tirar do olfato. Mas, de fato quer nos ver. Enxergar quem está à
espreita, à torta e à direita quer nos afugentar. Apura as orelhas para ajudar o
olfato, quer o contato apenas para arrancar pedaços, meu e seu...
Uma máquina de
carne andando como um leão enjaulado, enfurecido por não nos tocar, ser objeto
para olhar e comer, mas devorando tudo e todos e alcançando no grito
desesperado cada ouvido em um arrepio demorado para explicar... Quem sabe um
presságio de algo a não ser explicado na ausência da necessidade de entender,
então se expressa sendo o próprio ser...
Porquinho se
sentindo javali com seus humanos olhos fora do alcance, mas ainda sim
grunhindo, bufando, se debatendo na madeira com seus anéis preciosos brilhando,
porém preso ali... Com a lavagem. Um falso selvagem sempre esperando o
alimentarem. Alimentação de restos, ostentado modesto... Sem nenhum protesto, ao
contrário, satisfação. Não se esquece,
mas invariavelmente não quer recordar. Acordado não pensa, devora de cor. Embriagado
pelas suas sobras curte ressaca, compartilha solidão.
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