por Rafael Belo
Para cortar é
preciso estar afiado? Até papel corta e faz o sangue escorrer viscoso, faz
poças psicológicas coagulando em algum canto do cérebro e do corpo. É cortante
as reações das pessoas e da natureza em contraste as possibilidades contrárias,
algo sem fio, mas com ponta pode ser perfeitamente perfurante. Até uma coisa antiga
e enferrujada acaba por ser danosa e mais letal que a morte. Basta ser forte ou
fraco o suficiente. Objetos cortantes de Gillian Flynn é uma estreia feita do
metal mais mortal recortando a realidade.
Muitos mistérios
flutuam cegantes à vista com quinas machucando o tempo todos os personagens
profundos e demasiadamente humanos deste livro que lhe oferece uma tesoura para
picotar rasos papéis. Michelle, Adora, Amma e Marian são a família disfuncional
e voluntariosa desta surpreendente leitura. É como matar a vontade de nadar em
um desconhecido rio em um dia de vento gelado, mas com a temperatura acima de
40 graus.
Primeiro tocamos
a água com as mãos e recuamos, depois ingerimos coragem aos olhos desconfiados e
desafiantes dos outros nos impulsionando a ousar o pé. Água derretida das próprias
calotas polares... Sentamos e nervosos olhamos em volta para garantir não
sermos empurrados em sentir milhares de agulhas furando todas as partes do
nosso corpo simultaneamente. Saímos do raso junto com a autora e aprendemos a
nadar em sua obra.
Quando a água
já está na cintura queremos mergulhar. Está frio lá fora e a autora tornou
aquela estreia dela nossa estreia em sua leitura. Está confortável, bom e já não
há mais aquela vontade de sair. Na visão de Michelle descobrimos os crimes e
quem os praticou desta maneira mais chocante e pior, com crianças, estamos
imersos com a personagem até o fim, se bem que o fim poderia ser mais
elaborado, ou seria apenas mais uma forma de término ao qual não estamos acostumados?
As palavras são como
um mapa de estradas para o passado perturbado da jornalista Camille Preaker.
Acabada de vir de uma estadia breve num hospital psiquiátrico, o primeiro
artigo que o jornal de segunda categoria onde Camille trabalha lhe atribui
leva-a relutantemente de volta à sua cidade natal para cobrir o assassinato de
duas pré-adolescentes. Desde que saiu da cidade há doze anos, Camille raramente
falou com a sua neurótica e hipocondríaca mãe, nem com a meia-irmã que mal
conhece...
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