Para
Pierro, seria o fim (miniconto)
por Rafael Belo
Ele vinha alterando o
humor como um tumor pressionando várias áreas do cérebro ao mesmo tempo. Um aneurisma
da cisma de diversas situações. Desde seu último traumatismo craniano, o sangue
parecia ter se alojado todo na cabeça. Além
da pressão da doença... Esta levou seus filhos e sua esposa e como todo deixado
para trás, ele pensava: Por que não eu?!
A autopiedade se transformou em raiva. Enquanto todos pulavam o Carnaval,
Pierro Cinzas se imaginava pulando em cima de cada carro e pessoa por ali. Passou
toda a folia registrando e planejando.
Pierro marcava rostos e
placas. Motoristas bêbados. Rostos alterados. Quando o Carnaval chegasse ao
fim, seria o fim. Ele adorava chamar as coisas e acontecimentos de estrume e as
pessoas e conversas de estrupícios. Mas Pierro achava muito limitado o
significado de estrume - pôxa só merda é pouco, pensava. A
explicação sobre estrupício para ele também era distante – Não pode ser só pessoa feia, desfavorecida esteticamente, esquisita...
Não! Vamos juntar. Então, surgiu o termo estrumício. Bem além da explicação de qualquer Google. Para Pierro tudo e todos
passaram a ser estrumício.
Seu amor foi embora.
Aliás, seus amores. Ninguém fez nada.
Mas ele não culpava coisa alguma nem ser nenhum. Porém, não queria deixar a
raiva morrer também. Alimentava-a. Engordava-a. Ah, e ela comia de tudo. Sua mais
nova cria. A própria criação da retaliação. Ele seria O Retaliador. Não deixaria seu sofrimento ser de mais ninguém. Queria...
- Ah, eles vão vasculhar minha história e
distorcer tudo. Estes sensacionalistas vão explodir tudo. Eles nem vão entender
os estrumícios no ventilador. Seria mais um terrorista. Esta é a incompreensão
da bomba. Boom ...
Assim, na manhã da
Quarta-feira de Cinzas. Era tudo silêncio no mundo da folia. Pierro saiu cedo. Dirigiu
quilômetro. Acabou sua gasolina no ponto exato. Tudo conforme o planejado, pensou. O tempo chuvoso tornava tudo um
só borrão. Desde o primeiro dia de Carnaval ele reuniu milhares de litros de
combustível. Tudo isto está agora espalhado. Jogou mais um pouco no carro, “embebeu”
um pano velho e o socou no tanque de combustível. O maior coquetel molotov do mundo, se divertia.
Ironia ou não, nem um
par de pedras havia levado para acender seu plano. Pensou no meio e no fim. Mas,
não no fundamental. Sua versão de Roma em
Chamas, literalmente virara piada e estava encharcada. Mas começou a chover
granizo. Misericordialmente (ou seria
misericordiamente?), enfim, uma pedra
de gelo, fina e longa, atravessou seu cérebro e para Pierro foi o fim. De
alguma forma, começou um incêndio debaixo de todo aquele aguaceiro, seguindo
toda a trilha deixada para trás por Pierro.
2 comentários:
Excelente!
Buen inicio de semana.
http://sombriabelleza.blogspot.com/
obrigado. Para ti também e que ela seja cheia de luz. Seja sempre bem-vinda
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