sexta-feira, agosto 01, 2014

E a visão se foi... (miniconto) – por Rafael Belo





Ele via a cegueira em todos e se bobear até os cegos viam. O problema é que o escuro já o enchia de medo e fora isso ele estava vazio. Realmente vivia fora de si. Esbravejava a qualquer limiar de tensão. Chegava a ficar rouco e tossia, o que o deixava ainda mais raivoso. Como um cão acuado. Gean estava perdendo a visão.

Não havia médico capaz de encontrar a razão. Enquanto isso, seus olhos esbranquiçavam. Só vultos passavam por todo lado. Gean se assustava ainda mais. Naquele dia ele havia parado o carro em um lugar pouco movimentado. Não tinha planejado nada, muito menos ficar largado por ali até a noite chegar. Mas, ela chegou revelando a cegueira de todos e trazendo a dele.

Antes das luzes de seus olhos se juntarem a tantas pessoas escolhendo não ver. Ele chorou. Suas lágrimas pareciam se misturar com a chuva escorrendo na janela. Tudo ao alcance da visão de Gen eram faróis perdidos, vultos correndo e as cores fazendo de prismas toda aquela água doce por fora e salgada por dentro.


Poderia ser uma água salobra se realmente se misturassem, mas havia a janela entre elas. A luz do poste se multiplicava. Parecia criar uma lua própria para Gean enquanto as estrelas caiam naquele último céu visto por ele. Seu último desejo para seus olhos, era que quando fechassem e o levassem para a escuridão deixassem todos os detalhes à vista, até o resto do corpo ir a prazo. Que mesmo ele estando cego que o mundo parasse de ensaiar a cegueira. E a visão se foi...

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