Ditadura e escravidão,
ou melhor, escravidão e ditadura. Ambas deixaram marcas e traços profundos no
mundo e mais ainda no Brasil pela durabilidade recorde, deixando de lado Coréia
do Norte, Cuba, China e os não comentados Argélia, Congo, Sudão, Zimbábue e de
uma forma mais velada Líbia e Venezuela. Estes ainda sofrem. Estes Tempos
Extremos são abordados no novo livro de Miriam Leitão.
A escravidão e a
ditadura hoje são outras. Nossa paralisia cerebral, nosso autismo opcional,
nossa negação cotidiana, nossa inação moral, nossa ocultação ética e nossas correntes
nos arrastam por aí com imagem e som em alta definição querendo parecer
totalmente ao contrário sob a lupa “disfórmica” das mídias digitais. Pensando bem,
só mudaram as formas deste podre conteúdo do nosso passado.
Miriam Leitão ainda
está chegando lá. Seu romance traz para o presente e nos leva ao passado ao
mesmo tempo estes conflitos tênues, mas segue mais a linha de um jornalismo
literário semiprofundo. Adjetiva as qualidades dos personagens extremos
principais circulando entre os irmãos Alice e Hélio e a filha sobrinha Larissa.
Sua pontuação jornalística, às vezes, impede nossa imersão nestes fatos
históricos ainda cicatrizando no Brasil.
Larissa parece muito
as pobres identidades montadas por nós nesta nossa era de edição de
personalidade, nesta era de distração imensa e conversas rasas. A narrativa
repetitiva também nos localiza no limbo de um 2014 onde a política ainda segue
a mesma linha agarrada ao passado tentando transformar as velhas estratégicas
em novas apenas as traduzindo. Talvez seja o mineirinho jeito do casarão
colonial dos Tempos Extremos com tantos séculos impregnados que me deixaram a
sensação de ficarmos na poeira prestes a sermos levados pelo vento.
Quantos mistérios uma
antiga fazenda perdida entre as serras das Minas Gerais pode guardar? Mistérios
que chegam de forma inesperada, revelando passados diversos a uma família
dividida por conflitos afetivos e políticos. É o que Larissa tentará descobrir,
em uma estranha jornada na qual perseguirá sombras e segredos para entender os
próprios sonhos.
Neste
primeiro romance de Míriam Leitão, o leitor não encontra espaço para respirar.
É uma história de paixões extremas, sobre tempos extremos. Uma viagem às vezes
em quase delírio pelos flagelos da escravidão, no século XIX, e pelos
subterrâneos do regime militar, no século XX.
A
narrativa se passa no século XXI, mas as linhas temporais são rompidas. No
entremeio, as relações tormentosas entre pais e filhos e entre irmãos tecem uma
trama densa e ousada que revisita passados que o Brasil tem preferido deixar
acobertados pelo silêncio.
Como
ficcionista, Míriam Leitão mantém aqui a mesma postura que marcou sua
trajetória de jornalista: não faz perguntas fáceis. Nem abre caminhos para
zonas de conforto.
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