por Rafael Belo
Nada passava na cabeça. Mentira! O
vento ecoava lá dentro. Ruídos de sopros de vidas aprisionados no estreito
corredor de uma casa abandonada. Os lábios se espremem parecendo um, os olhos
apertam, a mão côa a testa sem coceira, esfrega o couro cabeludo e é tudo. Arila
morde o interior das bochechas e dos lábios. Olha para os lados tentando não
enxergar ninguém. Ri de nervoso. Quase derrubou o garçom quando este tocou com
a mão fria o ombro esquerdo dela. Está ansiosa e assustada, mas não consegue
pensar em nada.
Não consigo assimilar tanta gente falando. Estou me irritando não com a
conversa, mas com a minha covardia de não falar. Este meu silêncio angustiado
parece um parto disfarçado, um aborto ao avesso... Sinto-me perdida e este
sorriso nervoso pintando no meu rosto, só atrapalha. Não é um não assimilar
nada... É mais uma entrada em um espaço capaz de ecos e repetecos, mas agora só
ouço forte minha respiração como uma ventilação exagerada nesta palestra
tumultuada.
Por que vim para esta palestra? Ah, lá vem. Gaguejei, mas perguntei. Qual
a profundidade desta discussão? Não era minha pergunta... Só foi tudo o
conseguido nos meus pensamentos embaralhados. Não consegui puxar lembranças
claras... Puxo as gavetas armazenadas nos corredores do meu cérebro como
antigos cleros de inquisições... Estão vazias ou só é assim o meu enxergar? Não
ligo um ponto ao outro e não faço mais passar pelo agora para chegar ao depois...
Estou com amnésia de futuro.
É! Não formo na minha mente o porvir. Não antecipo
mais nem planejo coisa nenhuma. Esqueci como será o será... Não durmo além de poucas
horas há um ano agora. Estou sem noção de tempo. Estou fugindo de mim. Não dormir
mata meus neurônios e deve desconectar as sinapses... Sinto-me estas operadoras
enganando a gente, deixando a conexão lenta e a derrubando de tempo em tempo...
Não consigo refletir... Preciso mesmo dormir... Preciso me reconectar com os
outros, mas por enquanto não me reconecto comigo... Por que chove na minha
mente em uma densa neblina mais branca que o próprio branco? Acho... Nunca usei
este palavra! Estou me apagando. Estou com amnésia de mim.
Um comentário:
Belo texto!tb não gosto da palavra ACHO!
Postar um comentário