por
Rafael Belo
A confiança jazia em
cacos como vidro de figuração em cena de quebradeira. Um desabafo sem fim de 15
anos de lixo acumulado por ele. Porém, este lixo era ele mesmo. Várias versões
vazadas balzaquianas canalizadas pelos detritos que consumia. Severino não
reciclava, reutilizava aqueles mesmos realities shows roteirizados anuais e não
havia maior aterro sanitário indevido... Bem quase todos os canais de televisão
abertos e fechados também era um disfarçado lixão à céu aberto.
Mas, Severino tinha
feito uma promessa de Quaresma e, claro, a havia quebrado com um jeitinho “não
quebrei não foi só...” bem brasileiro. Não desistia de manter as aparências nem
quando corpo da confiança já entrava em decomposição e exalava o odor da morte
misturado com as fragrâncias da vida deixando mais impossível respirar. Assim,
se equilibrava no limite entra a melhor visão da cidade e a pior, temia por si
mesmo.
Se o misturassem a um
bambuzal no meio do vendaval mais veloz e tenebroso, da mesma fora não se
aproximaria um milímetro sequer desta tremedeira no temor de Severino. Era o
contrário da abstinência. Seria uma overdose por falta de palavra mais forte. A
impressão não era de vida em Severino. Ele não aparentava uma forma de vida no
momento, mas uma intensa vibração até um som de zumbido vinha dele.
Mesmo não sendo
invisível parecia ser. Talvez vibrasse em uma emissão de frequência tão veloz
no momento que era difícil sintonizar. Centenas de pessoas só faltavam passar
por dentro dele sem o perceber, sem o notar de fato. Era uma intuição, um
obstáculo apenas. Tonturas o afetavam agora e ele agachado precisava encontrar
o verdadeiro chão. Mas nada assombrava a multidão dele. Se ele atirasse feito
um norte-americano no colegial seria outra história... Amanhecia
preguiçosamente. O sol não queria chegar deste lado. Fantasiado de nuvens e
noite bocejava seus raios e cores enquanto Severino pedia a volta da escuridão.
Como confiar
comatosamente em alguém? Se juntasse o esquartejado estilhaçado cadáver da
autoconfiança, ainda assim faltariam pedaços e a confiança jamais seria
completa. Severino olhava as pessoas que não o viam e elas eram extensão dele,
eram ele. Seus cacos despedaçados de confiança. Na verdade ali tudo o era. Ele estava
só no próprio mundo.
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